quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

E o Oscar vai para...a CIA

Por Antonio Pimenta, no jornal Hora do Povo:

Hollywood jamais escondeu seus vínculos de muitos anos com Washington, o Pentágono e o complexo industrial-militar, mas nunca uma primeira-dama chegara ao ponto de expô-los tão abertamente como Michelle Obama, ao anunciar direto da Casa Branca, atendendo ao melífluo Jack Nickolson, o vencedor do Oscar 2013, o filme “Argos”, a glamourização de uma operação da CIA no Irã em 1980 em que um filme fake é a fachada.

Outro filme, tido até três meses antes, pela Reuters, como “favorito ao Oscar”, também sobre uma operação da CIA, a que executou extra-judicialmente o desarmado Osama Bin Laden, “A Hora Mais Escura”, após enorme escândalo pelos 30 minutos de apologia da tortura, teve de se contentar com uma modesta estatueta, a de edição sonora, depois de estar concorrendo a cinco indicações, inclusive de melhor filme.

Assim, em 2013, o Oscar vai - como assinalou o articulista Pepe Escobar - para .... a CIA! A Academia estendeu seu tapete vermelho para esse antro de tortura, sabotagem e terror que infelicita os povos do mundo e inclusive o povo norte-americano, e dá aval à campanha midiática pela guerra ao Irã.

Não foi por falta de filme melhor. “Lincoln”, de Steven Spielberg, sobre um momento decisivo da história dos EUA, a mudança na constituição para abolir de vez a escravidão, em que pese ignorar o papel que os próprios negros jogaram – no campo de batalha e na retaguarda – para a vitória na guerra da Secessão, é muito superior. Flagra a luta obstinada de Lincoln, magnificamente interpretado por Daniel Day-Lewis, para obter a maioria de dois terços no Congresso, através do convencimento e do suborno, pois já era assim que funcionava na época a democracia nos EUA. Não houve como negar o Oscar de melhor ator a Day-Lewis, mas “Lincoln” teve de se contentar com apenas mais uma estatueta, depois de 12 indicações.

“Argos” é um filme fake sobre a realização de um filme fake. Como o próprio ex-presidente Jimmy Carter relatou à CNN, a operação foi essencialmente dos canadenses, graças ao então embaixador Ken Taylor.

Mas é principalmente uma falsificação da história, a exemplo do que “Rambo” buscou fazer com a derrota no Vietnã. Na realidade, a CIA foi amplamente derrotada pela irrupção da revolução no Irã, após ter derrubado o primeiro-ministro legítimo Mossadegh em 1953 e instaurado a ditadura do Xá. A indignação acumulada anos a fio e as tentativas dos EUA de deterem a revolução levaram ao episódio da tomada da embaixada em Teerã por centenas de estudantes em novembro de 1979, gerando a chamada crise dos reféns. Foi a ditadura do Xá que reverteu a nacionalização do petróleo proclamada por Mossadegh.

Nos anos do Xá, a embaixada se caracterizou pela mais extremada intervenção nos assuntos internos do país, no apoio à ditadura e como conduto das decisões de Washington. No final de 1979, se concentravam na embaixada todo tipo de agentes de que os EUA dispunham na tentativa de derrotar o levante popular. São esses os “americanos inocentes” retratados em Argos; como já havia sido registrado o “americano tranqüilo” de Graham Greene em Saigon.

Embora cite o golpe da CIA contra Mossadegh, “Argos” só o faz para dar credibilidade a tudo que quer passar depois: a demonização do povo iraniano e sua revolução, apresentados como extremistas e homicidas potenciais dos “americanos inocentes”.

Quando os EUA tentaram uma operação militar para liberar os reféns, a chamada Operação “Eagle Claw” (Garra da Águia), em abril de 1980, foi um fiasco total. Três dos oito helicópteros enviados foram derrubados, oito soldados dos EUA morreram, e nenhum agente foi liberado. Eles iriam permanecer retidos na embaixada por 444 dias ao todo, só sendo libertados minutos depois da posse de Ronald Reagan na presidência dos EUA.

O fracasso na “crise dos reféns” foi explorado pelos republicanos para derrotar Jimmy Carter nas eleições de 1980 e numerosos analistas consideram que a CIA, por baixo dos panos, negociou a permanência dos reféns até o pleito nos EUA, em troca de peças de reposição para o exército iraniano, que se preparava para a guerra contra o Iraque e necessitava desesperadamente desses suprimentos. Episódio até hoje conhecido como a “Surpresa de Outubro” – a carta na manga para mostrar a “fraqueza” de Carter e a necessidade do belicoso Reagan na véspera da eleição. Assim, os reféns – 52 - foram liberados no governo Reagan, e apenas seis lograram se safar antes, como dito, centralmente graças à interferência dos canadenses, fato desconsiderado agora em prol da exaltação da CIA.

História falsificada

Não há nada de inocente em querer reescrever a história, quando na ordem do dia está a guerra contra o Irã, acusado pelos EUA e Israel de suposto “programa nuclear militar”, a exemplo do que foi feito com a “ameaça das armas de destruição em massa” no Iraque que não existiam. Menos ainda a presença de uma primeira-dama, em tais circunstâncias, a menos de dois dias de uma reunião com o Irã que vem sendo apontada como “última chance”. Nem em querer aclamar a CIA, com seus vôos de rendição, suas prisões secretas, tortura em massa com memorando do governo de W. Bush e ataques de drones – só para citar os fatos dos tempos mais recentes -, além dos costumeiros golpes de estado e ações do gênero.

Nem dá para esquecer que seu marido aproveitou uma aparição na viagem ao Brasil para anunciar o bombardeio da Líbia. Na operação que assassinou Bin Laden – foco do filme “A Hora Mais Escura” - o presidente Obama teve participação direta e ao vivo, desde a Casa Branca, e depois de ter autorizado tanto terrorismo com drones. Ganhador do Prêmio Nobel, quem sabe não seria merecedor também de um Oscar? Como sempre que dá uma boa bilheteria Hollywood providencia um repeteco, já estamos visualizando os próximos filmes da CIA: “190 horas de Waterboarding (Afogamento)” e “Drones da Liberdade”, este, estrelado por John Brennan.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

By Latuff


Bento XVI: uma renúncia estratégica

Dermi Azevedo

A renúncia inesperada do Papa Bento XVI, em pleno Carnaval, assume, cada vez mais, as características de uma retirada estratégica. Ao ver o barco da Igreja Católica Romana quase à deriva, principalmente nos campos da ética pública e da ética privada, Joseph Ratzinger preferiu optar por viver semi-isolado a sua condição de octogenário.

Não é de agora a intenção de Ratzinger, afirmam fontes vaticanas. Um dos seus maiores amigos, o ex-arcebispo de São Paulo, cardeal Cláudio Hummes, preparou, a pedido do Papa, há cinco anos, um relatório secreto sobre a situação geral da Igreja e suas perspectivas. O documento foi lido na abertura do Sínodo Mundial dos Bispos, no Vaticano e continua mantido sob rigoroso sigilo.

Com base em ampla documentação, o relatório Hummes aponta graves desafios para a atuação do Catolicismo. O principal deles é o avanço do indiferentismo religioso; o segundo é a migração, diante de expectativas não respondidas pela Igreja, de legiões cada vez mais numerosas de católicos para outras confissões cristãs, de matriz pentecostal, em sua maioria, e para outras religiões, como é o caso do Islamismo; o terceiro desafio refere-se à atuação pouco eficaz dos bispos que integram a cúpula eclesiástica para coibir a prática da pedofilia por parte de clérigos; o quarto diz respeito à situação do clero quanto às questões do celibato obrigatório, da impossibilidade da admissão de mulheres ao sacerdócio e das restrições que o Vaticano faz ao controle da natalidade.

No seu relatório, Hummes chama a atenção da cúpula eclesiástica para o avanço de uma espécie de "sentimento de vazio" na sociedade global, caracterizado por uma nouvelle vague decorrente da hegemonia capitalista e da crise das utopias, no pós-queda do Muro de Berlim.

Detalhando um pouco mais esse panorama, os argumentos do cardeal Hummes são reforçados por dados da realidade: na França, o Islamismo já se tornou a religião hegemônica; enquanto velhos templos católicos se deterioram ou são alugados para famílias sem casa de baixa renda (ou são transformados em museus). A República laicista francesa é obrigada a lidar não mais com a disputa de poder com os bispos, mas com questões que (se tivessem acontecido naquela época) deixariam perplexo o rei Luís, como é o caso do uso de burkas pelas mulheres islâmicas, da permissão para a construção de mesquitas e na adoção das normas do Alcorão sobre a família, entre outras.

A preocupação do papa Ratzinger quanto ao pentecostalismo refere-se ao crescimento de um novo modelo de Igreja que adota a chamada "teologia da prosperidade" como referencial teológico e pastoral. Esse modelo baseia-se em um "toma lá dá cá" entre os seus adeptos e Deus, tendo como objetivo o enriquecimento pessoal dos crentes e a cura das doenças, numa perspectiva que desconhece os fatores sócio-econômicos entre as causas da persistência e do avanço dos males sociais (como o desemprego, a violência, as drogas entre outros).

Trunfo jogado fora
A renúncia do Papa coloca em xeque a principal vitória das correntes conservadoras do Catolicismo nos séculos XX e XXI: o enquadramento da Teologia da Libertação quando Ratzinger entrou no consistório para disputar a eleição pontifícia, já contava com pelo menos 50 votos de cardeais contrários à Teologia da Libertação. Essa leitura teológica ainda representa a primeira interpretação não européia da Teologia tradicional com base na realidade dos oprimidos do Terceiro Mundo. Foi trazida, paradoxalmente, da Europa pelo peruano Gustavo Gutierrez e por toda uma legião de bispos e teólogos, com base na Teologia Crítica alemã e nos documentos do Concílio Vaticano II.

Um dos adeptos mais destacados dessa corrente foi o colombiano padre Camilo Torres, que ingressou na guerrilha do ELN (Exército de Libertação Nacional), depois de voltar a seu país, como sociólogo, com doutorado na Universidade de Louvain, na Bélgica. Durante pelo menos 30 anos a Teologia da Libertação alimentou a esperança de milhões de cristãos, que vislumbravam, após mais de 500 anos de colonialismo e de esmagamento dos pobres.

Eleito Papa, Bento XVI tratou de concretizar em nível global a ofensiva conservadora. Seu laboratório anterior havia sido a Congregação para a Doutrina da Fé (antiga Santa Inquisição) onde havia comandado os processos de expurgo de teólogos como Leonardo Boff e Jon Sobrino. De um momento para outro, a Igreja deixou de ser uma das principais referências para a produção de sentido na sociedade. Entrou em descompasso, mesmo que fosse para polemizar, com a pós-modernidade. Retomou antigos costumes que lhe foram úteis na época da Cristandade, mas que se revelaram incompatíveis com a dinâmica de um mundo em rápida mutação de valores e em plena revolução tecnológica. A linha política adotada pelo Papa afastou da cúpula da Igreja os seus quadros progressistas e a distanciou das massas empobrecidas no mundo.

Corrupção
Por outra parte, Bento XVI tentou impedir, mas não conseguiu, a crescente corrupção nas instituições financeiras do Vaticano. O próprio Instituto de Obras da Religião (como é chamado o Banco Central da Santa Sé) foi apontado publicamente como um paraíso da lavagem de dinheiro oriundo de fontes desconhecidas ou escusas. O papa teve que intervir várias vezes nos órgãos financeiros do Vaticano diante de denúncias de corrupção apresentadas pelos jornais e pelas autoridades italianas. Paralelamente, Bento XVI teve que pagar a conta política dos prejuízos causados à Igreja por causa de indenizações determinadas pela justiça nos casos de pedofilia envolvendo clérigos. A Arquidiocese de Boston, nos EUA, é recordista nesse tipo de despesa.

E o futuro?
O Vaticano e o Papa dispõem de todas as informações sobre a crise que levou Bento XVI à renuncia. A eleição do novo Papa, em março próximo, revelará se a Igreja está mesmo disposta a enfrentar a sua maior crise em dois séculos (XX e XXI) ou se continuará voltada para o seu próprio umbigo.



Dermi Azevedo é jornalista e cientista político

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

sábado, 23 de fevereiro de 2013

O tamanho do órgão

Na delegacia de polícia da cidadezinha do interior, o delegado, arrimado no jargão policial, pergunta à vítima de estupro:
– E então, minha senhora, o elemento chegou a consumar o ato?
– Consumá o que, dotô?
– Eu quis dizer se o elemento chegou a introduzir o órgão na senhora?
– O qui é intruduzi, dotô?!?...
– Eu perguntei se o meliante meteu o órgão na senhora.
– Ah, dotô, metê ele meteu. Mas aquilo num paricia um órgo: era mais iguá um crarinete...

(Do livro “O Estuprador de Melancias – histórias sacanas do caboclo paraense - Antônio Juraci Siqueira)

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

Saudades de 1964

Eduardo Fortes - retirado da Carta Capital

Em 1º de março de 2010, uma reunião de milionários em luxuoso hotel de São Paulo foi festejada pela mídia nacional como o início de uma nova etapa na luta da civilização ocidental contra o ateísmo comunista e a subversão dos valores cristãos. Autodenominado 1º Fórum Democracia e Liberdade de Expressão, o evento teve como anfitriões três dos maiores grupos de mídia nacional: Roberto Civita, dono da Editora Abril, Otávio Frias Filho, da Folha de S.Paulo, e Roberto Irineu Marinho, da Globo.

O evento, que cobrou dos participantes uma taxa de 500 reais, foi uma das primeiras manifestações do Instituto Millenium, organização muito semelhante ao Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (Ipes), um dos fomentadores do golpe de 1964 (quadro à pág. 28). Como o Ipes de quase 50 anos atrás, o Millenium funda seus princípios na liberdade dos mercados e no medo do “avanço do comunismo”, hoje personificado nos movimentos bolivarianos de Hugo Chávez, Rafael Correa e Evo Morales. Muitos de seus integrantes atuais engrossaram as marchas da família nos anos 60 e sustentaram a ditadura. Outros tantos, mais jovens, construíram carreiras, principalmente na mídia, e ganharam dinheiro com um discurso tosco de criminalização da esquerda, dos movimentos sociais, de minorias e contra qualquer política social, do Bolsa Família às cotas nas universidades.
Madureira, o principal jornalista da turma

Há muitos comediantes no grupo. No seminário de 2010, o “democrata” Arnaldo Jabor arrancou aplausos da plateia ao bradar: “A questão é como impedir politicamente o pensamento de uma velha esquerda que não deveria mais existir no mundo?” Isso, como? A resposta é tão clara como a pergunta: com um golpe. No mesmo evento brilhou Marcelo Madureira, do Casseta & Planeta. Como se verá ao longo deste texto, há um traço comum entre vários “especialistas” do Millenium: muitos se declaram ex-comunistas, ex-esquerdistas, em uma tentativa de provar que suas afirmações são fruto de uma experiência real e não da mais tacanha origem conservadora. Madureira não foge à regra: “Sou forjado no pior partido político que o Brasil já teve”, anunciou o “arrependido”, em referência ao Partido Comunista Brasileiro (PCB), o velho Partidão. Após a autoimolação, o piadista atacou, ao se referir ao governo do PT de então: “Eu conheço todos esses caras que estão no poder, eram os caras que não estudavam”. Eis o nível.

O símbolo do Millenium é um círculo de sigmas, a letra grega da bandeira integralista, aquela turma no Brasil que apoiou os nazistas. Jabor e Madureira estão perfilados em uma extensa lista de colaboradores no site da entidade, quase todos assíduos frequentadores das páginas de opinião dos principais jornais e de programas na tevê e no rádio. Montado sob a tutela do suprassumo do pensamento conservador nacional e financiado por grandes empresas, o instituto vende a imagem de um refinado clube do pensamento liberal, uma cidadela contra a barbárie. Mas a crítica primária e o discurso em uníssono de seus integrantes têm pouco a oferecer além de uma narrativa obscura da política, da economia e da cultura nacional. Replica, às vezes com contornos acadêmicos, as mesmas ideias que emanam do carcomido auditório do Clube Militar, espaço de recreação dos oficiais de pijama.

Meio empresa, meio quartel, o Millenium funciona sob uma impressionante estrutura hierárquica comandada e financiada por medalhões da indústria. Baseia-se na disseminação massiva de uma ideia central, o liberalismo econômico ortodoxo, e os conceitos de livre-mercado e propriedade privada. Tudo bem se fosse só isso. No fundo, o discurso liberal esconde um frequente flerte com o moralismo udenista, o discurso golpista e a desqualificação do debate público. Criado em 2005 com o curioso nome de “Instituto da Realidade”, transformou-se em Millenium em dezembro de 2009 após ser qualificado como Organização Social de Interesse Público (Oscip) pelo Ministério da Justiça. Bem a tempo de se integrar de corpo e alma à campanha de José Serra, do PSDB, nas eleições presidenciais de 2010. Em pouco tempo, aparelhado por um batalhão de “especialistas”, virou um bunker antiesquerda e principal irradiador do ódio de classe e do ressentimento eleitoral dedicado até hoje ao ex-presidente Lula.
Lamounier – O figurino dos anos 1960 no século XXI

O batalhão de “especialistas” conta com 180 profissionais de diversas áreas, entre eles, o jornalista José Nêumanne Pinto, o historiador Roberto DaMatta e o economista Rodrigo Constantino, autor do recém-lançado Privatize Já. A obra é um libelo privatizante feito sob encomenda para se contrapor ao livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr., sobre as privatizações nos governos de Fernando Henrique Cardoso que beneficiaram Serra e seus familiares. E não há um único dos senhores envolvidos com as privatizações dos anos 1990 que hoje não nade em dinheiro.

Os “especialistas” são todos, curiosamente, brancos. Talvez por conta da adesão furiosa da agremiação aos manifestantes anticotas raciais. A tropa é comandada pelo jornalista Eurípedes Alcântara, diretor de redação da revista Veja, publicação onde, semanalmente, o Millenium vê seus evangelhos e autos de fé renovados. Alcântara é um dos dois titulares do Conselho Editorial da entidade. O outro é Antonio Carlos Pereira, editorialista de O Estado de S. Paulo.

Alcântara e Pereira não são presenças aleatórias, tampouco foram nomeados por filtros da meritocracia, conceito caríssimo ao instituto. A dupla de jornalistas representa dois dos quatro conglomerados de mídia que formam a bússola ideológica da entidade, a Editora Abril e o Grupo Estado. Os demais são as Organizações Globo e a Rede Brasil Sul (RBS).

O Millenium possui uma direção administrativa formada por dez integrantes, entre os quais destaca-se a diretora-executiva Priscila Barbosa Pereira Pinto. Embora seja a principal executiva de um instituto que tem entre suas maiores bandeiras a defesa da liberdade de imprensa e de expressão – e à livre circulação de ideias –, Priscila Pinto não se mostrou muito disposta a fornecer informações a CartaCapital. A executiva recusou-se a explicar o formidável organograma que inclui uma enorme gama de empresas e empresários.

Entre os “mantenedores e parceiros”, responsáveis pelo suporte financeiro do instituto, estão empresas como a Gerdau, a Localiza (maior locadora de veículos do País) e a Statoil, companhia norueguesa de petróleo. No “grupo máster” aparece a Suzano, gigante nacional de produção de papel e celulose. No chamado “grupo de apoio” estão a RBS, o Estadão e o Grupo Meio & Mensagem.

Há ainda uma lista de 25 doadores permanentes, entre os quais, se incluem o vice-presidente das Organizações Globo, João Roberto Marinho, o ex-presidente do Banco Central Arminio Fraga e o presidente da Coteminas, Josué Gomes da Silva, filho do falecido empresário José Alencar da Silva, vice-presidente da República nos dois mandatos de Lula. O organograma do clube da reação possui também uma “câmara de fundadores e curadores” (22 integrantes, entre eles o ex-presidente do Banco Central Gustavo Franco e o jornalista Pedro Bial), uma “câmara de mantenedores” (14 pessoas) e uma “câmara de instituições” com nove membros. Gente demais para uma simples instituição sem fins lucrativos.

Uma das atividades fundamentais é a cooptação, via concessão de bolsas de estudo no exterior, de jovens jornalistas brasileiros. Esse trabalho não é feito diretamente pelo instituto, mas por um de seus agregados, o Instituto Ling, mantido pelo empresário William Ling, dono da Petropar, gigante do setor de petroquímicos. Endereçado a profissionais com idades entre 24 e 30 anos, o programa “Jornalista de Visão” concede bolsas de mestrado ou especialização em universidades dos Estados Unidos e da Europa a funcionários dos grupos de mídia ligados ao Millenium.

Em 2010, quando o programa se iniciou, cinco jornalistas foram escolhidos, um de cada representante da mídia vincula-da ao Millenium: Época (Globo), Veja (Abril), O Estado de S. Paulo, Folha de S.Paulo e Zero Hora (RBS). Em 2011, à exceção de um repórter do jornal A Tarde, da Bahia, o critério de escolha se manteve. Os agraciados foram da Época (2), Estadão (1), Folha (2), Zero Hora (1) e revista Galileu (1), da Editora Globo. Neste ano foram contemplados três jornalistas do Estadão, dois da Folha, um da rádio CBN (Globo), um da Veja, um do jornal O Globo e um da revista Capital Aberto, especializada em mercado de capitais.

Para ser escolhido, segundo as diretrizes apresentadas pelo Instituto Ling, o interessado não deve ser filiado a partidos políticos e demonstrar “capacidade de liderança, independência e espírito crítico”. Os aprovados são apresentados durante um café da manhã na entidade, na primeira semana de agosto, e são obrigados a fazer uma espécie de juramento: prometer trabalhar “pelo fortalecimento da imprensa no Brasil, defendendo os valores de independência, democracia, economia de mercado, Estado de Direito e liberdade”.

O Millenium investe ainda em palestras, lançamentos de livros e debates abertos ao público, quase sempre voltados para assuntos econômicos e para a discussão tão obsessiva quanto inútil sobre liberdade de imprensa e liberdade de expressão. Todo ano, por exemplo, o Millenium promove o “Dia da Liberdade de Impostos” e organiza os debates “Democracia e Liberdade de Expressão”. Entre os astros especialmente convidados para esses eventos estão Marcelo Tas, da Band, e Diogo Mainardi e Reinaldo Azevedo, ambos de Veja. Humoristas jornalistas. Ou vice-versa.

O que toda essa gente faz e quanto cada um doa individualmente é mantido em segredo. Apesar da insistência de CartaCapital, a diretora-executiva Priscila Pinto mandou informar, via assessoria de imprensa, que não iria fornecer as informações requisitadas pela reportagem. Limitou-se a enviar nota oficial com um resumo da longa apresentação reproduzida na página eletrônica do Millenium sobre a missão do instituto. Entre eles, listado na rubrica “código de valores”, consta a premissa da transparência, voltada para “possibilidade de fiscalização pela sociedade civil e imprensa”. Valores, como se vê, bem flexíveis.

Josué Gomes e Gerdau também não atenderam aos pedidos de entrevista. O silêncio impede, no caso do primeiro, que se entenda o motivo de ele contribuir com um instituto cuja maioria dos integrantes sistematicamente atacou o governo do qual seu pai não só participou como foi um dos mais firmes defensores. E se ele é contra, por exemplo, a redução dos juros brasileiros a níveis civilizados. O industrial José Alencar passou os oito anos no governo a reclamar das taxas cobradas no Brasil. A turma do Millenium, ao contrário, brada contra o “intervencionismo estatal” na queda de braço entre o Palácio do Planalto e os bancos pela queda nos spreads cobrados dos consumidores finais.

No caso de Gerdau, seria interessante saber se o empresário, integrante da câmara de gestão federal, concorda com a tese de que a tentativa de redução no preço de energia é uma “intervenção descabida” do Estado, tese defendida pelo instituto que ele financia. Gerdau e Josué se perfilam, de forma consciente ou não, ao Movimento Endireita Brasil, defensor de teses esdrúxulas como a de que os militares golpistas de 1964 eram todos de esquerda.

O que há de transparência no Millenium não vem do espírito democrático de seus diretores, mas de uma obrigação legal comum a todas as ONGs certificadas pelo Ministério da Justiça. Essas entidades são obrigadas a disponibilizar ao público os dados administrativos e informações contábeis atualizadas. A direção do instituto se negou a informar à revista os valores pagos individualmente pelos doadores, assim como não quis discriminar o tamanho dos aportes financeiros feitos pelas empresas associadas.
A contabilidade disponível no Ministério da Justiça, contudo, revela a pujança da receita da entidade, uma média de 1 milhão de reais nos últimos dois anos. Em três anos de funcionamento auditados pelo governo (2009, 2010 e 2011), o Millenium deu prejuízos em dois deles.

Em 2009, quando foi certificado pelo Ministério da Justiça, o instituto conseguiu arrecadar 595,2 mil reais, 51% dos quais oriundos de doadores pessoas físicas e os demais 49% de recursos vindos de empresas privadas. Havia então quatro funcionários remunerados, embora a direção do Millenium não revele quem sejam, nem muito menos quanto recebem do instituto. Naquele ano, a entidade fechou as contas com prejuízo de 8,9 mil reais.

Em 2010, graças à adesão maciça de empresários e doadores antipetistas em geral, a arrecadação do Millenium praticamente dobrou. A receita no ano eleitoral foi de 1 milhão de reais, dos quais 65% vieram de doações de empresas privadas. O número de funcionários remunerados quase dobrou, de quatro para sete, e as contas fecharam no azul, com superávit de 153,9 mil reais.

Segundo as informações referentes ao exercício de 2011, a arrecadação do Millenium caiu pouco (951,9 mil reais) e se manteve na mesma relação porcentual de doadores (65% de empresas privadas, 35% de doações de pessoas físicas). O problema foi fechar as contas. No ano passado, a entidade amargou um prejuízo de 76,6 mil reais, mixaria para o volume de recursos reunidos em torno dos patrocinadores e mantenedores. Apenas com verbas publicitárias repassadas pelo governo federal, a turma midiática do Millenium faturou no ano passado 112,7 milhões de reais.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Ditadura faz mais uma vítima



A ditadura militar, embora tenha “terminado” há quase 30 anos, vitimou fatalmente mais uma pessoa na madrugada deste sábado para o domingo. Trata-se de Carlos Alexandre Azevedo, iria completar 40 anos este ano. Carlos cometeu suicídio com uma overdose de medicamentos. 

Carlos Alexandre foi usado pelos agentes da repressão para pressionar os pais que estavam presos. Assim descreveu o seu pai, *Dermi Azevedo, em seu mural no facebook neste domingo acerca do que se passou com seu filho: “Com apenas um ano e oito meses de vida, ele foi preso e torturado, em 14 de janeiro de 1974, no DEOPS paulista, pela "equipe" do delegado Sérgio Fleury, onde se encontrava preso com sua mãe. Na mesma data, eu já estava preso no mesmo local. Cacá, como carinhosamente o chamávamos, foi levado depois a São Bernardo do Campo, onde, em plena madrugada, os policiais derrubaram a porta e o jogaram no chão, tendo machucado a cabeça. Nunca mais se recuperou. (...) O suicídio é o limite de sua angústia”.

Dermi e sua companheira na época, Darcy Andozia, foram presos acusados de tentar difamar o Estado brasileiro por conta de um livro intitulado “Educação Moral e Cívica & Escalada Fascista no Brasil” achado no apartamento onde moravam em São Paulo. Dermi permaneceu preso por 4 meses recebendo torturas físicas como choques elétricos e pau de arara e Darcy, foi torturada psicologicamente vendo seu filho ser torturado na sua frente como forma de pressioná-la nos interrogatórios.

Carlos Alexandre sofria de um transtorno chamado de fobia social, consequência direta das torturas que sofreu. Transtorno que o fazia ser uma pessoa bastante retraída. “Para mim a ditadura não acabou. Até hoje sofro os seus efeitos. Tomo antidepressivo e antipsicótico”, relatou Carlos a Istoé Independente publicada há 3 anos atrás.

O anúncio de sua morte pelo seu pai através do mural no Facebook causou bastante comoção aos amigos da família e a pessoas ligadas aos Direitos Humanos em todo o país. “Meu coração sangra de dor” diz Dermi no início do texto.

Hildegard Angel, irmã de Stuart Angel, assassinado sob torturas pela ditadura, assim expressou em seu site como recebeu a notícia: “Não o conhecia, mas para mim a notícia deste suicídio é como uma facada no peito”. (...) “Agora, acabo de ser surpreendida por essa terrível notícia: o suicídio de um jovem que, quando bebê foi torturado pela mesma classe de algozes que assassinou meu irmão, minha cunhada, minha mãe e até hoje mortifica minhas lembranças”.

*Dermi Azevedo é jornalista e ex-preso político. Foi um dos fundadores do Movimento Nacional de Direitos Humanos. Dermi é portador da Síndrome de Parkison, que provavelmente adquiriu por conta das fortes pancadas recebidas na cabeça enquanto esteve preso na década de 70. É dele o livro “Travessias torturadas – Direitos Humanos e ditadura no Brasil” lançado no último dia 6 em Belém.

domingo, 17 de fevereiro de 2013

Coisas do Pará

Uma vizinha fala pra outra toda contente:

-Vizinha, nem choveu hoje!

a outra então responde:

-Pior vizinha! (num tom de felicidade também)

...

Pior? cá pergunto eu... não foi bom que não choveu hoje?! e ela disse isso mesmo: "Pior!" na maior felicidade!

Vai entender!? É assim mesmo, coisas da variação linguística!

A história secreta da renúncia de Bento XVI

Eduardo Febbro - retirado da Carta Maior

Paris - Os especialistas em assuntos do Vaticano afirmam que o Papa Bento XVI decidiu renunciar em março passado, depois de regressar de sua viagem ao México e a Cuba. Naquele momento, o papa, que encarna o que o diretor da École Pratique des Hautes Études de Paris (Sorbonne), Philippe Portier, chama “uma continuidade pesada” de seu predecessor, João Paulo II, descobriu em um informe elaborado por um grupo de cardeais os abismos nada espirituais nos quais a igreja havia caído: corrupção, finanças obscuras, guerras fratricidas pelo poder, roubo massivo de documentos secretos, luta entre facções, lavagem de dinheiro. O Vaticano era um ninho de hienas enlouquecidas, um pugilato sem limites nem moral alguma onde a cúria faminta de poder fomentava delações, traições, artimanhas e operações de inteligência para manter suas prerrogativas e privilégios a frente das instituições religiosas.

Muito longe do céu e muito perto dos pecados terrestres, sob o mandato de Bento XVI o Vaticano foi um dos Estados mais obscuros do planeta. Joseph Ratzinger teve o mérito de expor o imenso buraco negro dos padres pedófilos, mas não o de modernizar a igreja ou as práticas vaticanas. Bento XVI foi, como assinala Philippe Portier, um continuador da obra de João Paulo II: “desde 1981 seguiu o reino de seu predecessor acompanhando vários textos importantes que redigiu: a condenação das teologias da libertação dos anos 1984-1986; o Evangelium vitae de 1995 a propósito da doutrina da igreja sobre os temas da vida; o Splendor veritas, um texto fundamental redigido a quatro mãos com Wojtyla”. Esses dois textos citados pelo especialista francês são um compêndio prático da visão reacionária da igreja sobre as questões políticas, sociais e científicas do mundo moderno.

O Monsenhor Georg Gänsweins, fiel secretário pessoal do papa desde 2003, tem em sua página web um lema muito paradoxal: junto ao escudo de um dragão que simboliza a lealdade o lema diz “dar testemunho da verdade”. Mas a verdade, no Vaticano, não é uma moeda corrente. Depois do escândalo provocado pelo vazamento da correspondência secreta do papa e das obscuras finanças do Vaticano, a cúria romana agiu como faria qualquer Estado. Buscou mudar sua imagem com métodos modernos. Para isso contratou o jornalista estadunidense Greg Burke, membro da Opus Dei e ex-integrante da agência Reuters, da revista Time e da cadeia Fox. Burke tinha por missão melhorar a deteriorada imagem da igreja. “Minha ideia é trazer luz”, disse Burke ao assumir o posto. Muito tarde. Não há nada de claro na cúpula da igreja católica.

A divulgação dos documentos secretos do Vaticano orquestrada pelo mordomo do papa, Paolo Gabriele, e muitas outras mãos invisíveis, foi uma operação sabiamente montada cujos detalhes seguem sendo misteriosos: operação contra o poderoso secretário de Estado, Tarcisio Bertone, conspiração para empurrar Bento XVI à renúncia e colocar em seu lugar um italiano na tentativa de frear a luta interna em curso e a avalanche de segredos, os vatileaks fizeram afundar a tarefa de limpeza confiada a Greg Burke. Um inferno de paredes pintadas com anjos não é fácil de redesenhar.

Bento XVI acabou enrolado pelas contradições que ele mesmo suscitou. Estas são tais que, uma vez tornada pública sua renúncia, os tradicionalistas da Fraternidade de São Pio X, fundada pelo Monsenhor Lefebvre, saudaram a figura do Papa. Não é para menos: uma das primeiras missões que Ratzinger empreendeu consistiu em suprimir as sanções canônicas adotadas contra os partidários fascistóides e ultrarreacionários do Mosenhor Levebvre e, por conseguinte, legitimar no seio da igreja essa corrente retrógada que, de Pinochet a Videla, apoiou quase todas as ditaduras de ultradireita do mundo.

Bento XVI não foi o sumo pontífice da luz que seus retratistas se empenham em pintar, mas sim o contrário. Philippe Portier assinala a respeito que o papa “se deixou engolir pela opacidade que se instalou sob seu reinado”. E a primeira delas não é doutrinária, mas sim financeira. O Vaticano é um tenebroso gestor de dinheiro e muitas das querelas que surgiram no último ano têm a ver com as finanças, as contas maquiadas e o dinheiro dissimulado. Esta é a herança financeira deixada por João Paulo II, que, para muitos especialistas, explica a crise atual.

Em setembro de 2009, Ratzinger nomeou o banqueiro Ettore Gotti Tedeschi para o posto de presidente do Instituto para as Obras de Religião (IOR), o banco do Vaticano. Próximo à Opus Deis, representante do Banco Santander na Itália desde 1992, Gotti Tedeschi participou da preparação da encíclica social e econômica Caritas in veritate, publicada pelo papa Bento XVI em julho passado. A encíclica exige mais justiça social e propõe regras mais transparentes para o sistema financeiro mundial. Tedeschi teve como objetivo ordenar as turvas águas das finanças do Vaticano. As contas da Santa Sé são um labirinto de corrupção e lavagem de dinheiro cujas origens mais conhecidas remontam ao final dos anos 80, quando a justiça italiana emitiu uma ordem de prisão contra o arcebispo norteamericano Paul Marcinkus, o chamado “banqueiro de Deus”, presidente do IOR e máximo responsável pelos investimentos do Vaticano na época.

João Paulo II usou o argumento da soberania territorial do Vaticano para evitar a prisão e salvá-lo da cadeia. Não é de se estranhar, pois devia muito a ele. Nos anos 70, Marcinkus havia passado dinheiro “não contabilizado” do IOR para as contas do sindicato polonês Solidariedade, algo que Karol Wojtyla não esqueceu jamais. Marcinkus terminou seus dias jogando golfe em Phoenix, em meio a um gigantesco buraco negro de perdas e investimentos mafiosos, além de vários cadáveres. No dia 18 de junho de 1982 apareceu um cadáver enforcado na ponte de Blackfriars, em Londres. O corpo era de Roberto Calvi, presidente do Banco Ambrosiano. Seu aparente suicídio expôs uma imensa trama de corrupção que incluía, além do Banco Ambrosiano, a loja maçônica Propaganda 2 (mais conhecida como P-2), dirigida por Licio Gelli e o próprio IOR de Marcinkus.

Ettore Gotti Tedeschi recebeu uma missão quase impossível e só permaneceu três anos a frente do IOR. Ele foi demitido de forma fulminante em 2012 por supostas “irregularidades” em sua gestão. Tedeschi saiu do banco poucas horas depois da detenção do mordomo do Papa, justamente no momento em que o Vaticano estava sendo investigado por suposta violação das normas contra a lavagem de dinheiro. Na verdade, a expulsão de Tedeschi constitui outro episódio da guerra entre facções no Vaticano. Quando assumiu seu posto, Tedeschi começou a elaborar um informe secreto onde registrou o que foi descobrindo: contas secretas onde se escondia dinheiro sujo de “políticos, intermediários, construtores e altos funcionários do Estado”. Até Matteo Messina Dernaro, o novo chefe da Cosa Nostra, tinha seu dinheiro depositado no IOR por meio de laranjas.

Aí começou o infortúnio de Tedeschi. Quem conhece bem o Vaticano diz que o banqueiro amigo do papa foi vítima de um complô armado por conselheiros do banco com o respaldo do secretário de Estado, Monsenhor Bertone, um inimigo pessoal de Tedeschi e responsável pela comissão de cardeais que fiscaliza o funcionamento do banco. Sua destituição veio acompanhada pela difusão de um “documento” que o vinculava ao vazamento de documentos roubados do papa.

Mais do que querelas teológicas, são o dinheiro e as contas sujas do banco do Vaticano os elementos que parecem compor a trama da inédita renúncia do papa. Um ninho de corvos pedófilos, articuladores de complôs reacionários e ladrões sedentos de poder, imunes e capazes de tudo para defender sua facção. A hierarquia católica deixou uma imagem terrível de seu processo de decomposição moral. Nada muito diferente do mundo no qual vivemos: corrupção, capitalismo suicida, proteção de privilegiados, circuitos de poder que se autoalimentam, o Vaticano não é mais do que um reflexo pontual e decadente da própria decadência do sistema.


Tradução: Katarina Peixoto

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Suspeito de assassinato é ligado a "interesses criminosos"


O suspeito de ter mandado matar Cícero Guedes dos Santos, dirigente do MST em Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, foi preso.

José Renato Gomes de Abreu foi apresentado na Delegacia do Centro de Campos na manhã da última sexta-feira.

"O acusado não possui nem nunca possuiu nenhum tipo de vínculo com o MST. Não participa de nenhuma de nossas instâncias. O acusado, ao contrário, representava interesses criminosos que pela força tentaram dominar o acampamento", diz a direção do Movimento no Rio de Janeiro em nota.

De acordo com a polícia, o suspeito é "aliado de traficantes da comunidade Tira Gosto".

"A irresponsabilidade do Estado Brasileiro nesses 14 anos em acabar com um dos símbolos da violência do latifúndio é a principal causa do assassinato de Cícero e por toda vulnerabilidade que se encontram as famílias sem terra do acampamento Luiz Maranhão", afirma a nota.

A polícia suspeita ainda que o mandante do crime é um fazendeiro da região.

Abaixo, leia a versão integral da nota:

O MST-RJ vem a público reconhecer o empenho e a celeridade da Polícia Civil em apurar os responsáveis pelo assassinato do militante Cícero Guedes dos Santos. A eficiência da Polícia nesse caso vem aliviar um pouco a tensão permanente em que vivem os acampados, assentados, militantes e apoiadores do MST.

O assassinato do Cícero foi um crime contra os que lutam pela terra. Em que os principais responsáveis são o latifúndio e a morosidade do Estado Brasileiro em realizar a Reforma Agrária. Cícero, militante histórico do MST, assentado desde 1997 no assentamento Zumbi dos Palmares, foi assassinado por defender a Reforma Agrária e os princípios do MST.

Gostaríamos de afirmar que o acusado não possui nem nunca possuiu nenhum tipo de vínculo com o MST. Não participa de nenhuma de nossas instâncias. O acusado, ao contrário, representava interesses criminosos que pela força tentaram dominar o acampamento. 

Histórico

A Usina Cambahyba, palco do conflito que culminou com o assassinato do Cícero, tem um histórico de 14 anos de luta pela terra. Em 1998 a área recebeu Decreto de Desapropriação para fins de Reforma Agrária, da Presidência da República.

Como o processo de desapropriação não avançou após o decreto, 470 famílias organizadas no MST ocuparam as terras da Usina no dia 17 de abril de 2000, como forma de pressionar o Estado. Desapropriação que até hoje não ocorreu. 

Os primeiros meses da ocupação foram marcados pelas ameaças dos seguranças da Usina às famílias sem terra, que precisaram da intervenção do Ministério Público e da Polícia Militar para garantia de sua segurança.

No ano de 2005 a Justiça Federal de Campos, que aceitou todos os recursos dos proprietários da Usina contra o processo de desapropriação desde 1998, concedeu a liminar que resultou no despejo mais violento que o MST sofreu no Estado do Rio de Janeiro. 

Dia 2 de novembro de 2012, após a divulgação nos grandes veículos de comunicação de que a Usina 
Cambahyba, serviu para incineração de corpos dos militantes no período da ditadura militar, o MST reocupou as terras da usina cobrando do Estado a conclusão do processo de desapropriação passados 14 anos do decreto.  

A irresponsabilidade do Estado Brasileiro nesses 14 anos em acabar com um dos símbolos da violência do latifúndio é a principal causa do assassinato de Cícero e por toda vulnerabilidade que se encontram as famílias sem terra do acampamento Luiz Maranhão.

Esperamos que esse seja o primeiro passo das investigações contra as ameaças sofridas por essas famílias e que outras mortes sejam evitadas.

Exigimos que o Estado Brasileiro de um fim a história de violência da Usina Cambahyba!

A balada do coração

De Laís Correia

coração surdo: se faz
coração mudo: ficou assim de tanto gritar
coração de cachorro-quente: carne moída
coração de pedra: de tanto bater uma hora parou
coração suicida: virou pedra


Retirado do blog Alquimia Criativa

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

sábado, 2 de fevereiro de 2013

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

“Vai, gostosa!”


Fora todos os problemas, as ciclistas ainda têm que enfrentar o machismo primitivo de motoristas.


Mulher + bicicleta no Google Mulher + bicicleta no Google

O texto abaixo, de autoria da designer paulistana Marina Chevrand, foi publicado originalmente no site Pedalinas, que congrega mulheres que andam de bicicleta.

Assédio no trânsito não é assunto novo por aqui. Agressões verbais todas nós, mulheres que pedalam, provavelmente já sofremos.

Mas vem cá, ja imaginou estar subindo uma avenida (a Sumaré, no caso), em pleno domingo, feliz e contente por ter poucos carros na rua, e perceber que um carro reduz a velocidade e sentir uma palmada bem dada na bunda seguido de um “vaaaaai coisa gostooooosa” e várias risadas de um bando de playboys?

Nunca imaginou? Nem eu. Mas isso aconteceu comigo, mas o carro preto de placa 2416 e a cara do mauricinho orgulhoso de seu ato machão-ogro de camisa amarela olhando e rindo de mim no retrovisor, eu nunca vou esquecer.

Pra mim, um cara que faz algo desse tipo é o mesmo que estupra e bate na mãe. O caráter (zero) e a certeza de que o mundo gira em volta do seu pinto são características comuns a esses seres desprezíveis.

Poderia fazer uma lista do que senti ao tomar o tapa: ódio, vergonha, humilhação, revolta, raiva, etc, etc, etc.
E todos esses sentimentos juntos me deram forças nas pernas para pedalar na velocidade maior que eu pude com o intuito de alcançar o 2416, 2416, 2416 – repetia para mim mesma.

Rá! Lá estavam eles, distraídos e cantando esperando o sinal verde. Cheguei devagarzinho sem ser percebida pela direita. Com muita vontade, cuspi e vomitei na cara do de amarelo, arremesei-o para fora do carro, chutei bem no meio do seu saco. Não tive pena da sua cara de pavor, me pedindo peloamordedeus para parar. Não parei. Seus amigos-super-machões, se envergonharam do amigão que dá tapas em bundas de mulheres estar apanhando de uma de suas vítimas, e fugiram, deixando-o para trás.

Obviamente esse é o final que minha criatividade alimentada de ódio e revolta produziu.

O final real é bem diferente disso: infelizmente (ou felizmente) todos os sinais estavam abertos, não tinha congestionamento e os perdi de vista. Me recolhi no meu suor e humilhação e engoli seco para conseguir terminar o dia sem matar um.

Postei essa foto no início do meu post, que é o resultado de uma busca no google das palavras “mulher + bicicleta”. E isso resume muito bem tudo o que escrevi. Tirem suas próprias conclusões.

Desculpem o relato meio pesado para uma segunda feira. E sorte pra todas nós, que vamos pedalar muito ainda durante toda a semana. Que pessoas como essas não cruzem nosso caminho e não estraguem nosso dia (e muito menos nossa dignidade).