Um novo relatório da Oxfam,
divulgado nesta segunda-feira (16), revela que a distância entre o 1% e os 99%
da humanidade, respectivamente, o topo e a base da pirâmide da riqueza mundial,
torna-se cada vez maior, com consequências desastrosas para a humanidade.
Baseado no Credit Suisse
Wealth Report 2016 e na lista de milionários da Forbes, o relatório alerta que
apenas oito homens concentram a mesma riqueza do que as 3,6 bilhões de pessoas
que fazem parte da metade mais pobre da humanidade. Na última camada, uma em
cada 9 pessoas vive abaixo da linha da pobreza, buscando sobreviver com menos
de U$ 2 por dia.
Intitulado “Uma economia
humana para os 99%”, o relatório foi apresentado na véspera da abertura do
Fórum Econômico Mundial, que tem início no dia de hoje, na cidade suíça de
Davos, que reúne os representantes das empresas mais ricas do mundo.
Os oito primeiros colocados
na lista da Forbes são o criador da Microsoft, Bill Gates (75 bilhões de
dólares), Amancio Ortega (67 bilhões), da grife espanhola Zara; Warren Buffet
(60,8 bilhões), da Berkshire Hathaway, Carlos Slim (50 bilhões), das
telecomunicações e Jeff Bezos (45,2 bilhões), da Amazon. Figuram ainda o
fundador do Facebook, Mark Zuckerberg (44, 6 bilhões), Larry Ellison (43,6
bilhões), da Oracle, e, por fim, Michael Bloomberg (Bloomberg LP), com 40
bilhões.
A Oxfam também analisou a
riqueza de 1.810 bilionários incluídos na lista Forbes 2016, 89% dos quais são
homens. Em seu conjunto, eles possuem 6,5 trilhões de dólares, a mesma riqueza
que 70% da população mais pobre da humanidade. Um terço desse patrimônio tem
origem na riqueza herdada, enquanto 43% está ligado a relações clientelísticas.
Essa riqueza cresce a uma média de 11% ao ano desde 2009, taxa muito superior à
de um poupador médio. “Os super-ricos não são apenas receptores passivos da
crescente concentração de riqueza, mas contribuem ativamente para perpetuá-la”,
diz o relatório, por exemplo, por meio de seus investimentos. Os mais poderosos
da sociedade controlam a maioria das ações, o que os torna os principais
beneficiários do atual modelo empresarial, gerando um efeito multiplicador de
riqueza para os já super-ricos.
Nas próximas duas décadas,
500 indivíduos passarão mais de 2,1 trilhões de dólares para seus herdeiros,
uma soma maior do que o PIB de um país como a Índia, que tem 1,2 bilhão de
habitantes.
Esse quadro sombrio é
visível em todas as partes do mundo. No Vietnã, por exemplo, o homem mais rico
do país ganha em um dia mais do que a pessoa mais pobre em 10 anos. Nos Estados
Unidos, de acordo com um estudo realizado pelo economista Thomas Piketty, a
renda dos 50% mais pobres da população foi congelada nos últimos 30 anos,
enquanto a do 1% mais rico aumentou em 300%. A soma dos salários anuais de
10.000 trabalhadores das fábricas têxteis de Bangladesh equivale ao salário do
CEO de qualquer empresa incluída no FTSE 100, índice da Bolsa de Valores de
Londres, de acordo com estimativas da Ergon Associates.
No Brasil, a realidade não é
diferente. Os 6 maiores bilionários concentram a mesma riqueza que mais de 50%
da população – um total de mais de 100 milhões de pessoas.
A Oxfam aponta especialmente
as grandes empresas, acusadas de estarem “a serviço dos mais ricos” e de se
guiarem por um único objetivo: maximizar a rentabilidade de acionistas e
investidores. Em 2015, as dez maiores empresas do mundo obtiveram um
faturamento superior à receita total dos Governos de 180 países. No entanto,
esse crescimento não foi distribuído entre todas as camadas da sociedade.
A renda de altos executivos,
frequentemente engordada pelas ações de suas empresas, tem aumentado
vertiginosamente, ao passo que os salários de trabalhadores comuns têm
diminuído.
O estudo aponta que,
atualmente, o diretor executivo da maior empresa de informática da Índia, o
CEO, ganha 416 vezes mais que um funcionário médio da mesma empresa.
Para diminuir custos,
algumas empresas recorrem ao trabalho forçado ou em condições de escravidão. As
mulheres e as meninas são exploradas nas condições mais precárias e são a
categoria pior remunerada. A Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima
que 21 milhões de trabalhadores forçados geram cerca de US$ 150 bilhões em
lucros para empresas, todos os anos.
Além disso, os altos lucros
das empresas são maximizados pela estratégia de pagar o mínimo possível em
impostos, utilizando para este fim paraísos fiscais ou promovendo a
concorrência entre países na oferta de incentivos e tributos mais baixos.
“As alíquotas fiscais
aplicadas a pessoas jurídicas estão caindo em todo o mundo e esse fato – aliado
a uma sonegação fiscal generalizada – permite que muitas empresas paguem o
menos possível em impostos”, afirma o documento.
Estima-se em 14 bilhões de
dólares por ano os prejuízos na África resultantes da utilização de paraísos
fiscais pelos bilionários. A Oxfam calcula que esse montante seria suficiente
para garantir cuidados de saúde e salvar a vida de quatro milhões de crianças
por ano, ou para permitir a escolarização em todo o continente. O uso de
paraísos fiscais provoca prejuízos anuais de ao menos 100 bilhões de dólares
para os países em desenvolvimento.
Além disso, há a obsessão em
manter no mais alto patamar os retornos financeiros para os acionistas das
empresas. Na década de 1970 no Reino Unido, por exemplo, 10% dos lucros eram
distribuídos aos acionistas. Hoje, o percentual é de 70%.
Pesquisas citadas pelo
relatório da Oxfam também revelam como o 1% beneficia-se da distribuição
desigual da riqueza e utilizam-se de sua influência material e política para
continuar a gozar de tal benefício.
Entre os artifícios
utilizados estão o financiamento de candidaturas políticas, da atividade de
lobby e, indiretamente, o custeamento de centros de estudos e universidades que
visam produzir “narrativas políticas e econômicas” compatíveis com as premissas
que favorecem os ricos.
“Os bilionários do Brasil
fazem lobby para reduzir impostos e, em São Paulo, preferem usar helicópteros
para ir ao trabalho, evitando os engarrafamentos e problemas de infraestrutura
enfrentados nas ruas e avenidas da cidade”, diz o documento.
A Oxfam alerta que a
crescente desigualdade produz efeitos catastróficos nas sociedades, aumentando
a criminalidade, a insegurança e, ao mesmo tempo, minando iniciativas de
combate à pobreza. “Ela (a desigualdade) gera mais pessoas vivendo com medo do
que com esperança”, conclui a organização.
Ao longo dos últimos 25 anos
estudos realizados pela Oxfam revelam que “Se o crescimento econômico entre
1990 e 2010 tivesse beneficiado os mais vulneráveis, hoje teríamos 700 milhões
a menos de pessoas, a maioria mulheres, na pobreza”, salienta o relatório.
Esse modelo econômico,
aponta o relatório, é baseado numa série de falsas premissas, entre as quais
está a ideia de que a riqueza individual extrema não é prejudicial, mas um
sintoma de sucesso, ou que o crescimento do PIB deve ser o principal objetivo
da elaboração das políticas. As premissas equivocadas incluem acreditar que os
recursos do planeta são ilimitados ou que o atual modelo econômico é neutro do
ponto de vista do gênero.
Emerson
Lira - matéria publicada no site do Jornal A Verdade
Nenhum comentário:
Postar um comentário