terça-feira, 25 de junho de 2013
domingo, 23 de junho de 2013
sábado, 22 de junho de 2013
sexta-feira, 21 de junho de 2013
quinta-feira, 20 de junho de 2013
quarta-feira, 19 de junho de 2013
Quem tem medo dos partidos políticos?
Em alguns dos protestos nos últimos
dias, tem existido uma falsa polêmica dentro do movimento que toma conta
das ruas das principais cidades do país: deve-se ou não utilizar
bandeira de partidos?
Falo de falsa polêmica porque aqueles
que estimulam esse debate, e é inegável o quanto a grande mídia tem
apostado nesse tema, contribuem com a divisão do movimento. Se é
ilegítimo que os militantes e representantes de partidos se façam
presente nos atos, seria justo proibir aqueles que nunca participaram de
nenhum movimento ou passeata de se fazer presente? Não seria
“oportunismo” ir às ruas apenas quando milhares estão presentes, e não
quando se realizaram protestos por diversas outras questões importantes?
Ou seja, é preciso unir o movimento, e é
inegável o papel que as organizações políticas e partidos cumprem na
mobilização e construção da luta. Alguns participantes alegam que a
bandeira de um partido pode dar a impressão de que o ato está sendo
“aparelhado”, ou que as pessoas que venham a ver a imagem imaginem que
todos são membros daquele partido. Será?
Se um manifestante apresentar um cartaz
com uma palavra de ordem, e eu não me sentir representado naquela frase,
é justo que eu reivindique que ele abaixe o cartaz? Poderia alegar que
se algum meio de comunicação divulgar essa imagem que minha presença no
ato foi “aparelhada” por aquela reivindicação? A camisa ou bandeira de
uma torcida organizada, também deve ser retirada com vistas a nem todos
os presentes torcerem por aquele time, ou mesmo concordarem com a
existência da torcida?
A mesma liberdade que buscamos nas ruas,
passa pela liberdade de organização de cada um e de suas convicções, e
um partido nada mais é que essa expressão. Aqueles que compreendem a
existência de um partido apenas num período eleitoral, só reforçam a
falsa democracia representativa em que vivemos.
Nunca devemos esquecer que os ricos, os
que dominam e controlam a sociedade, nunca abriram mão de se organizar
em seus partidos e nem defendem isso. Para os explorados e aqueles que
buscam transformar a sociedade, esse discurso muda, e apresenta-se que a
reivindicação será mais “pura” ou “plena” se distante dos partidos. Na
verdade querem evitar a possibilidade de unir as reivindicações e
questionar o centro do sistema e a sua dinâmica.
Os “de cima” tem todos os motivos para
temer que os “de baixo” se organizem. A ditadura militar, para tentar
impedir a resistência e a organização do povo, proibiu a existência dos
partidos. Não adiantou. Os partidos, mesmo na clandestinidade,
mantiveram-se firmes e tiveram papel decisivo na mobilização popular
contra a ditadura.
O que ganhamos nós ao reprimir a
presença dos partidos? Seremos mais livres se impedirmos que as pessoas,
por sua livre iniciativa, optem por participar de partidos ou apenas
reforçamos os objetivos da grande mídia e da burguesia? O que está em
jogo é fortalecer a nossa luta, e portanto devemos unir todas as nossas
forças nessas mobilizações.
Rafael Pires é membro da Coordenação Nacional da UJR
terça-feira, 18 de junho de 2013
De norte a sul estudantes param o Brasil
Há alguns anos, as lutas contra o
aumento das passagens têm ganhado importante participação dos estudantes
em diversas cidades do país. Nada contudo, nas proporções que tomaram
as manifestações dos últimos dias, em especial hoje, 17 de junho de
2013.
Essas
manifestações, que chegaram a levar mais de 100 mil pessoas às ruas no
Rio de Janeiro e São Paulo, trazem a indignação da juventude que está
cansada não apenas dos altos valores das tarifas nos transportes
públicos, e sim frente a falta de educação, saúde e de uma vida digna. O
slogan nossa luta não é por centavos é por direitos, presente nos protestos é prova viva dessa afirmação.
Não é segredo para ninguém que a
juventude é o setor que mais sofre com os efeitos da crise, sobrando
para os jovens os piores postos de trabalho, com baixos salários e
excessiva jornada de trabalho, e a maior vítima da violência no país.
Essa verdadeira rebelião da juventude
brasileira, se deu às vésperas do início da Copa das Confederação,
evento organizado pela entidade mais corrupta do esporte mundial, a
FIFA, e que é realizada no país ao preço mais caro que poderia nos
custar: a soberania.
Para atender os interesses e garantir os
lucros dos patrocinadores, o governo chegou a alterar o Estatuto do
Torcedor, submetendo-se a todas as imposições da FIFA, desde a
construção de novos estádios, liberação da venda de bebidas alcoólicas
durante os jogos (apenas das marcas patrocinadoras, ao absurdo custo de
R$ 9,00 o copo), até assumindo a responsabilidade financeira diante de
qualquer catástrofe natural que prejudique a realização dos jogos.
O gasto de dinheiro público chegará, até
a realização da Copa do Mundo em 2014, em R$ 86 bilhões, enquanto isso
faltam recursos para a contração e o pagamento de professores nas
escolas públicas, hospitais superlotados que não atendem a população, e
para piorar o salário mínimo do Brasil é o menor de toda a América do
Sul.
São Paulo na luta contra o aumento das passagens
Na maior capital do país, São Paulo,
dezenas de milhares de manifestantes ocuparam as principais ruas da
cidade, incluindo a sua via mais importante, a Av. Paulista. Nos
protestos contra o aumento das passagens (subiram de 3,00 para 3,20) a
truculência da ação policial marcou os protestos.
Com balas de
borracha, gás de pimenta, bombas e muita violência, a PM de São Paulo,
que chegou a quebrar vidros de viatura para tentar criminalizar o
movimento, deu o tom de como o Estado pretende ouvir a voz do povo e
suas reivindicações, bem diferente de como os governantes tratam os
ricos e suas empresas quando buscam isenções e incentivos financeiros.
Coincidentemente, no dia de hoje, quanto
a ação policial foi reduzida, e não aconteceram ações truculentas,
nenhum problema de violência foi registrado, o que apenas confirma de
que a quebra de vidros, e quaisquer transtornos causados nada mais foram
do que reação as ações da PM paulista.
Da Copa eu abro mão
Se as manifestações em São Paulo já
contavam com a simpatia e solidariedade dos jovens e da população em
todo o país, a ação repressiva da PM, sem dúvidas, serviu de estopim
para as manifestações que se seguiram no dia de hoje.
Mas, desde o sábado, na cidade de Belo
Horizonte, milhares de pessoas se reuniram para dizer não aos gastos com
estádios e as remoções em decorrência das obras, lutando por mais
verbas e melhorias nos serviços públicos. Como prenúncio do que
aconteceria no dia de hoje, mais de 5 mil pessoas ocuparam o centro de
BH no sábado gritando “Da copa eu abro mão! Eu quero meu dinheiro pra
saúde e educação!”.
Nessa segunda, mais de 40 mil pessoas
nas ruas do centro de BH se dirigiram até o estádio Mineirão, onde cerca
de 19 mil pessoas assistam ao jogo Nigéria e Taiti, da Copa das
Confederações. Na Av. Antônio Carlos, a PM mineira passou a agredir os
manifestantes causando uma imensa confusão entre todos os presentes.
Na capital carioca, vários eram os
cartazes e faixas fazendo referência aos gastos da Copa das
Confederações e da privatização do Maracanã. Mais de 100 mil pessoas se
fizeram presente denunciando o descaso com a juventude e exigindo mais
verbas para saúde, educação e contra o aumento das passagens.
A seleção brasileira, que treinava no
estádio Presidente Vargas no centro de Fortaleza, capital do Ceará, viu
milhares de manifestantes se fazerem presentes na saída do treino,
terminando o protesto que percorreu diversas ruas da cidade, e serviu de
convocatória para o ato de quarta-feira, quando a seleção jogará na
Arena Castelão.
De Belém a Porto Alegre, estamos todos na luta
Belém, Recife, Maceió, Feira de Santana,
Salvador, Vitória, Curitiba e Porto Alegre também foram palco de
protestos. Apenas nessas cidades, mais de 50 mil pessoas nas ruas
lutando contra os aumentos de passagens, por passe livre e contra os
gastos da Copa.
Essa luta se tornou nacional, e com a
manifestação em Brasília que cercou o Congresso Nacional, sem dúvidas, a
juventude ocupou um papel de destaque na conjuntura política no país.
Esse protagonismo que tem chamado a atenção de todo o mundo, sem
dúvidas, será decisivo na luta pela transformação social em nosso país.
UJR convoca a juventude brasileira: dia 20 será maior!
Nacionalizar essa luta permite a
juventude brasileira encarar de frente o seu maior desafio: lutar por
seus direitos. Não cairão dos céus os dias melhores que todos esperam,
muito menos conseguiremos transporte barato e de qualidade, ou mais
investimentos e melhorias nos serviços públicos sem nos mobilizarmos e
ocuparmos às ruas do país.
Estamos vivendo um momento histórico.
Desde o Fora Collor, em 1992, esse é o maior protesto popular realizado
no país. Fazemos parte dessa história, e precisamos e no próximo dia 20,
quinta-feira é hora da juventude ir às ruas e fazer valer a nossa voz!
Dia 20 será maior!
Coordenação Nacional da UJR
domingo, 16 de junho de 2013
Elevação da taxa de juros vai aumentar a inflação e prejudicar trabalhador
retirado do Jornal A Verdade
O Banco Central decidiu no dia 30 de maio aumentar a taxa de juros de 7,5% para 8%. Foi o segundo aumento consecutivo este ano. A taxa Selic é usada pelo governo para negociar os títulos da dívida pública e é referência para as demais taxas de juros da economia. Portanto, também vão subir os juros do cheque especial, do crediário, do cartão de crédito e dos empréstimos.
O Banco Central decidiu no dia 30 de maio aumentar a taxa de juros de 7,5% para 8%. Foi o segundo aumento consecutivo este ano. A taxa Selic é usada pelo governo para negociar os títulos da dívida pública e é referência para as demais taxas de juros da economia. Portanto, também vão subir os juros do cheque especial, do crediário, do cartão de crédito e dos empréstimos.
A consequência imediata da elevação da
Selic é que o governo vai gastar mais com os banqueiros e especuladores
que possuem títulos da chamada dívida pública e menos com a saúde e a
educação do povo brasileiro. De fato, segundo a Auditoria Cidadã da
Dívida, em 2012, com uma taxa de juros de 7,25%, o Governo Federal,
gastou R$ 752 bilhões com juros e amortizações da dívida. Com o aumento
da Selic para 8%, o gasto com a dívida pode ultrapassar R$ 900 bilhões.
A justificativa apresentada pelo Banco
Central para aumentar os juros é de que “a decisão contribuirá para
colocar a inflação em declínio”. Porém, em abril, quando elevou a Selic
de 7,25% para 7,5%, a alegação foi a mesma, mas a inflação cresceu em
vez de diminuir. Aliás, taxa de juros baixa em lugar nenhum do mundo é
responsável pela inflação. Nos Estados Unidos, por exemplo, a taxa de
juros é de 0,25% e a inflação é 1,06% ao ano. Na Alemanha, a taxa de
juros é menos de 1% e a inflação não passa de 1,15%.
Na verdade, o objetivo da decisão do
Banco Central não é diminuir a inflação e sim favorecer o capital
financeiro, o chamado “rentismo”, um reduzido número de famílias que não
trabalham e vivem de renda, particularmente das aplicações financeiras
nos títulos da divida pública. São cerca de 52 mil bilionários que
possuem 527 bilhões investidos em títulos da dívida num país que tem
quase 200 milhões de habitantes.
Esses agiotas, desde o ano passado vêm
usando seus meios de comunicação para exigir a elevação da taxa de
juros. Com efeito, desde 2011, quando os juros pagos pelo Governo caíram
de 12% para 7,25%, algumas asaplicações financeiras chegaram a perder
para a inflação e muitos milionários viram suas riquezas estacionarem.
Como na época do imperialismo capitalista, existe uma completa fusão
entre o capital financeiro e o capital industrial e comercial, a
burguesia (a classe que é dona dos bancos, mas também das fábricas, da
terra e dos supermercados), ajudada pelos bancos internacionais e pelos
fundos de investimentos que transformaram os alimentos em ativos
financeiros (commodities), decidiu elevar os preços das mercadorias para
reaver lucros provocando o aumento da inflação. Para esconder seus
objetivos, culparam o tomate.
Ora, aumentar juros não diminui a
inflação, mas a eleva. Com efeito, com o aumento dos juros, os custos
para produzir também crescem e os preços dos produtos sobem. Com os
preços mais altos, o trabalhador passa a gastar mais para se alimentar,
para comprar roupa, sapato, eletrodomésticos, e sua dívida aumenta. Com o
crédito mais caro e os preços dos produtos mais elevados,
principalmente quando comprados a prazo, meio usado pela esmagadora
maioria do povo, a tendência é de o consumo cair, o que levaria aos
preços diminuírem e, consequentemente, cair a inflação. Porém, antes de a
inflação cair (o que é pouco provável), o povo vai pagar mais caro por
cada produto que comprar, as empresas vão deixar de investir na produção
para aplicar no mercado financeiro e muitas vão demitir porque o
consumo foi reduzido. Em outras palavras, a decisão do BC beneficia os
especuladores, mas prejudica o trabalhador.
Trata-se, portanto, de um crime contra a
economia popular, pois os brasileiros já consomem muito pouco e milhões
de pessoas fazem apenas uma refeição por dia. Do outro lado,com a alta
dos juros, os ricos ganharão rios de dinheiro.
A alta dos juros também vai piorar a
situação de crise na economia, pois os investimentos produtivos vão
diminuir. Como o que move os capitalistas é o lucro máximo, e com os
juros subindo, as aplicações no mercado financeiro vão gerar ganhos
maiores, a classe dos ricos vai aplicar seu capital onde obtiver maior
lucro, mesmo que ele seja fictício. Prova disso é a declaração dada no
ano passado pelo dono de um dos maiores conglomerados industriais do
país, Antônio Ermírio de Morais. Disse ele: “Em menos de 10 anos, o
Banco Votorantim lucrou mais do que todo o grupo em toda a sua
história!”.
Logo, a decisão do BC não vai estimular o
investimento produtivo e sim o “investimento” no mercado financeiro.
Aliás, o Brasil ocupa agora o 4º lugar entre os países que têm taxas de
juros mais altas do mundo, tornando-se ainda mais atrativo para os
especuladores mundiais.
O que causa realmente a inflação?
Excetuando os fenômenos climáticos como
secas ou excesso de chuvas, que ao dificultarem a produção e a colheita
de determinados alimentos provocam aumento dos preços, na moderna
economia capitalista a principal causa da inflação é o domínio dos
monopólios industriais, financeiros e comerciais sobre a economia.
De fato, um número muito restrito de
empresas controla da produção até a venda dos produtos. Essa situação é
muito evidente no caso do tomate, tratado como vilão da alta dos preços
no início do ano. A Cargill, grande multinacional norte-americana, é
dona das marcas de molho de tomate Pomarola e Tarantella, das de extrato
de tomate Elefante e Extratomato e de polpa de tomate Pomodoro. A
Unilever, anglo-holandesa, é dona da marca Arisco, e a Bunge é dona da
Etti e da Salsaretti. Essas três empresas, além de produzirem, compram a
maior parte da produção do tomate no país, e assim ficam em condições
de determinar o preço pelo qual o produto deve ser vendido no mercado.
Não bastasse, segundo a Companhia
Nacional de Abastecimento (Conab), apenas três grandes grupos
estrangeiros são donos da maioria dos supermercados e controlam 50% dos
alimentos comercializados no país. São eles: Pão de Açúcar
(França-Brasil), Carrefour (França) e Walmart (EUA).
A telefonia celular está nas mãos de
quatro empresas: Oi, Telefônica/Vivo, Tim e Claro (NET/Embratel), que
cobram em nosso país uma das maiores tarifas do planeta.
A Coca Cola tem mais de 50% do mercado
de refrigerantes no país e a AB Imbev, com várias marcas de cervejas
(Brahma, Antartica, Bohemia, Skol,etc.), possui 70,1% do mercado de
cervejas no Brasil.
Essas grandes empresas, além de
dominarem setores inteiros da economia, unem e formam cartel para impor
preços ao consumidor. O Conselho Administrativo de Defesa Econômica
(Cade) investiga a formação de um cartel para fixar o preço da farinha
de trigo em toda a região Nordeste. As empresas de moagem e distribuição
de farinha de trigo, produto essencial para a fabricação de pães,
massas, doces e biscoitos, articuladas pelo grupo M. Dias Branco, estão
estabelecendo preços, condições de venda e divisão do mercado.
Outro exemplo: o governo reduziu os
impostos da Cesta Básica, mas não se verificou nenhuma redução dos
preços desses alimentos, embora, a presidenta tenha até apelado
publicamente para os empresários diminuírem os preços.
Outra causa recente da inflação são os
abusivos aumentos das passagens de ônibus decretados pelos governos para
beneficiar algumas dezenas de famílias que são donas das empresas de
ônibus no Brasil. Somente este ano, 11 capitais já aumentaram os preços
das passagens no transporte coletivo e nada repassaram para os
motoristas e cobradores ou para melhoria do transporte. Os ônibus andam
cheios, são velhos e os motoristas recebem baixos salários.
Desse modo, a monopolização da economia,
a ganância da classe capitalista e a submissão do governo a esta classe
são as verdadeiras causas da inflação e não o tomate ou uma taxa de
juros baixa.
Lula Falcão *
* Membro do comitê central do PCR e diretor de A Verdade
* Membro do comitê central do PCR e diretor de A Verdade
sexta-feira, 14 de junho de 2013
Prender alguém por portar vinagre não é só ilegal. É ridículo
José Nabuco Filho, retirado do Diário do Centro do Mundo
A detenção de manifestantes que portavam vinagre e a prisão em
flagrante de outros por crime de quadrilha são atos ilegais e uma clara
tentativa de criminalizar os movimentos sociais.
É difícil um autoritário praticar um ato de opressão e não resvalar
no ridículo. Na ditadura militar, por exemplo, a par da violência,
agentes da repressão, não raro, expunham-se ao ridículo com sua ação
estúpida. Basta lembrar a proibição pela censura da música “Torturas de
amor”, de Waldick Soriano. Talvez esse seja o ponto em comum dos
reacionários: eles perdem o senso do ridículo.
Ontem, a nota ridícula foi a detenção de manifestantes que portavam
vinagre. Fosse apenas uma ação ridícula, e estaríamos todos a nos
deliciar com as piadas e quadrinhos nas redes sociais. O problema é que o
ridículo não exclui a ilegalidade e o abuso de poder.
É uma coisa elementar, diria até primária, que a Constituição
consagra como direito fundamental a regra de que a pessoa só pode ser
impedida de fazer algo se houver proibição em lei. Esse direito é
essencial em toda democracia e só desagrada pessoas de espírito
autoritário.
Convenhamos, é um direito de uma simplicidade desconcertante. Há
alguma lei que me proíba de portar vinagre? Portar vinagre se encaixa em
alguma proibição genérica? Claro que não. É abuso de autoridade.
Acrescente-se a isso o absurdo jurídico que é a prisão por crime de
quadrilha de manifestantes que foram flagrados em algum ato de
vandalismo ou violência contra policiais. Não há dúvida que a finalidade
de protestar não justifica ações criminosas, como dano ou lesão
corporal. É uma visão maniqueísta supor que qualquer ato praticado com o
fim de protesto é legal. Isso não significa, porém, que se pode usar
todo o poderio do Estado para incriminar alguém além de sua
responsabilidade.
Se um manifestante quebra uma vitrine, há dano; se atira pedra em um
policial e o fere, há lesão corporal. Ocorre que tais crimes, fora das
hipóteses qualificadas, não permitem a prisão em flagrante, por serem
crimes que se enquadram na lei dos juizados especiais criminais. Ah, mas
nesse caso não se satisfaz a sanha opressiva das autoridades, e por
isso se inventa o crime de quadrilha. Reuniões efêmeras e ocasionais
como essas, ainda que se tenha a prática de crimes de dano ou de lesão
corporal, não configuram quadrilha.
Os atos de abuso não param aí. Houve caso de fixação de R$ 20 mil
para a fiança, o que é evidentemente um valor extorsivo, e a violência
policial foi a tônica dos confrontos de ontem. Todo esse quadro deixa
claro que os agentes do estado não fazem outra coisa, senão manipular a
lei penal, para que seus interesses políticos prevaleçam.
O que se tem visto é um esforço monumental dos agentes do estado para
criminalizar os movimentos sociais, o que não é democrático e nem
legal. É apenas patético.
Milhares já escolheram sapatos que não vão apertar
De Luís Felipe dos Santos, retirado do Impedimento.org
O dia 13 de junho de 2013 está na história do Brasil – e certamente, na história da mídia brasileira. Algumas cenas marcam essa data.
- Datena, apresentador da Band, abre o seu programa pregando a ordem pública contra a baderna. Faz até uma enquete: “você é a favor de protesto com baderna?”. Seu programa começa no final da tarde; quando ele abre, 40 pessoas já forma detidas, entre elas o fotógrafo do Terra Fernando Borges e o repórter da Carta Capital Piero Locatelli, por portar vinagre (instrumento contra o gás lacrimogêneo). O resultado da enquete é surpreendente: a maior parte dos espectadores é A FAVOR do protesto com baderna. Cenas de helicóptero permeiam o programa; milhares de manifestantes mobilizados, nada de violência. PM acompanhando. A enquete sai do ar. Datena muda de opinião e encerra dizendo: “se eu sou o governador, baixo a passagem hoje mesmo”.
- Globo News faz gigante cobertura do protesto. Três repórteres escalados, mais helicópteros filmando. Uma das repórteres (não identifiquei seu nome) presencia, de um lugar seguro, o início da ação violenta da PM. Para tentar bloquear uma rua, PMs fazem formação de defesa e atiram bombas de gás a esmo, atingindo inclusive a imprensa. A repórter descreve a cena da seguinte forma: “Polícia reagiu à violência dos manifestantes. E é bom lembrar que perto dessa área, existem hospitais, trabalhadores voltando para a casa”. Entra a outra repórter, que está muito perto do local: Rosana Cerqueira, acredito. Quando a linha telefônica abre, sai a sua voz: “Vou ter que desligar, estou correndo da polícia”. Ela não desligou.
- Em editoriais, Folha de S. Paulo e Estadão afinam o discurso. A Folha afirma que é preciso “Retomar a Paulista“, cobra ação enérgica da PM e diz que para os vândalos, é preciso dar a lei. O Estadão vai além: afirma que o governador teve uma postura moderada e precisa ser enérgico ao restabelecer a ordem. Como não brigam com a notícia, os jornalistas desses veículos vão ao protesto. Por volta das 20h30, surge no Estadão a foto de uma menina da Folha com o olho inchado: ela levou uma bala de borracha no olho. Da PM. Saldo divulgado pela Folha: dois jornalistas levaram balas de borracha, sete saíram feridos.
***
O jornalista vai ao protesto para trabalhar; o policial militar, também. Nenhum deles mobiliza o protesto. Ambos portam armas de grosso calibre; as do jornalista, a princípio, não-letais. Quando os jornalistas, que estão trabalhando como os policiais, são agredidos, isso vira notícia. O manifestante pode ser mal-interpretado, pode ser tratado como vagabundo, canalha, covarde, filho da puta. O jornalista, não; ele sempre está ali para trabalhar.
Isso não quer dizer que o jornalista é melhor que ninguém. Se o ativista pacífico, que leva flores, apanha, isso também é notícia, e importante. A diferença é que o ativista que leva flores pode ser confundido com o ativista que resolve quebrar vidros e apedrejar lojas, por aqueles que desconhecem a genealogia do protesto. O jornalista, não: ele certamente não estava ali para quebrar nada.
O que me motiva a escrever esse texto é, especialmente, o sangue nas veias de quem conhece pessoas como Marina Novaes, Vágner Magalhães e Fernando Borges (todos do Terra, todos agredidos) e sabe que é muito triste o fato dessas pessoas voltarem para casa com marcas de cassetete. Eu já apanhei da polícia. Eu já fui ameaçado de prisão. Já fui colocado contra a parede. Eu já vi pessoas inocentes levarem balas de borracha. Foi revoltante – seria em dobro se eu estivesse a trabalho.
***
Eu calço é 37
Meu pai me dá 36
Dói, mas no dia seguinte
Aperto meu pé outra vez
Eu aperto meu pé outra vez
É impossível, para a mídia grande e para a mídia pequena, cobrir todos os focos de repressão e violência policial. O que aconteceu em São Paulo ontem, em outros dias da semana, em Porto Alegre no mês passado, não é nada perto do que muitos jovens da periferia sofrem diariamente. Alguns vão inclusive presos por coisas fúteis – porte de maconha para consumo próprio, p.ex – e outros são totalmente inocentes, e passam dias, meses, submetidos às sevícias de depósitos humanos como o Presídio Central. As agruras dessas pessoas raramente são retratadas. Quando são, o esquecimento vem rápido.
A dor da repressão policial chegou, ontem, ao centro do Brasil: a Avenida Paulista. A indignação das vítimas chegou no mesmo lugar, ao mesmo tempo, e veio em forma de revolta.
Sempre acreditei que uma grande mobilização social no Brasil demoraria bastante para ocorrer. Ainda mais nos tempos atuais: a moeda é valorizada, o desemprego bate em 4%, o consumo é alto, a economia, mesmo que esteja mal, é a melhor que temos em muitos anos. Só que nada disso veio com uma melhora significativa no bem-estar social.
O aumento da passagem é um pretexto para o padrão do Brasil como país emergente: o serviço encarece, mas não melhora. O ônibus ficou mais caro, mas não justificou esse aumento – continua lotando, continua matando os passageiros (como no Rio), continua atrasando. Como os ônibus, os imóveis também ficaram mais caros e não melhoraram. A saúde ficou mais cara e não melhorou. A educação ficou mais cara e não melhorou. Os preços dos ingressos de estádios de futebol encareceram e não melhoraram. A telefonia encareceu e até melhorou, mas funciona muito abaixo do que deveria.
Diante de tudo isso, a chegada de uma Copa das Confederações amplifica a indignação. Os estádios são caríssimos, pagos pelo Estado, e os hospitais, pagos pelo Estado, matam gente por falta de atendimento. O torcedor é convidado a fazer festa, mas não pode beber, gritar nem levar instrumentos musicais. A sociedade é democrática mas o governo impõe padrões de comportamento, padrões Fifa, que são alienígenas à nossa cultura. E isso em um evento que é feito para celebrar o Brasil. Para mostrar notoriedade. Para mostrar quão interessante é o nosso país para o mundo.
A indignação está bem longe de ser sobre o aumento da passagem de ônibus em São Paulo. Em Porto Alegre a passagem não aumentou e milhares foram à rua na mesma quinta-feira. Em Fortaleza, 6 mil saíram para criticar o governador. No Rio de Janeiro, milhares foram protestar contra os ônibus – lá, teve gente MORTA por ônibus este ano e não houve repressão policial. Há também relatos de atos em Goiânia e Maceió, só nessa quinta-feira.
Os manifestantes do Gezi Park, em Istambul, começaram seu ato indignados pelo fim da área verde para a construção de um shopping. Terminaram protestando contra tudo.
O que essa juventude toda que foi à rua realmente quer é mostrar que o espaço público é como um time de futebol: grande por sua gente. Se São Paulo é a locomotiva do Brasil, foi porque as pessoas fizeram assim. Se o Brasil é referência para o mundo, foi porque o povo trabalhador brasileiro, da jornada de 44 horas, do transporte público deficiente, da educação capenga, passa por cima de todas as dificuldades para produzir diariamente.
O resgate do espaço público é o resgate de uma consciência coletiva de que é o povo que faz o país, e não o país que amestra o povo.
***
Por que cargas d’água
Você acha que tem o direito
De afogar tudo aquilo que eu
Sinto em meu peito
Você só vai ter o respeito que quer
Na realidade
No dia em que você souber respeitar
A minha vontade
Diante dessa visão, fica clara a enorme dificuldade de diálogo com esse povo. E essa dificuldade de diálogo é exatamente o que motiva protestos ainda mais fortes.
O belicismo dos editoriais de Folha e Estadão conversa com o assinante conservador que sustenta sua folha de pagamento, mas não conversa com a reputação atingida por esses veículos na sociedade brasileira. O que conversa com a imagem desses veículos é a repórter, que vai ao local para dar a importância que o protesto merece.
Da mesma forma, a postura legalista de Alckmin, Haddad e José Eduardo Cardozo dialoga com as bases, as militâncias, mas não com os eleitores. Quando Alckmin pede energia para combater o vandalismo e diz que baderneiros devem ser reprimidos, ele claramente não percebe o que está acontecendo na sua cidade desde o início. Quando Haddad não acha relevante voltar para as ruas e conversar com os milhares que querem passe livre, ele minimiza a força das ruas em prol da tênue legitimidade do voto. Quando José Eduardo Cardozo diz que pode mandar a Polícia Federal e a Força Nacional para ajudar na repressão, ele conversa com o Jarbas Passarinho que assinou o AI-5: manda às favas seus escrúpulos de consciência em prol de um discurso oficialesco e que já sai da boca mumificado.
E quando a presidente Dilma Rousseff se manifesta sobre a inflação e não sobre as ruas, ela não conversa com Estela, Luísa, Maria Lúcia, Marina, Patrícia e Wanda, que deixaram a oposição consentida para lutar pela VAR-Palmares na ditadura.
A genialidade histórica desses protestos é que, embora eles tenham sido motivados por pessoas à esquerda do governo, nenhum deles carrega seus vícios. O PT catapultou o Fora Collor em 1992, mas não encheu o saco dos caras pintadas com discursos fechados sobre arrocho salarial. Muitos dos que estavam vestidos de preto em 1992 nem sabiam o que era arrocho salarial – eu era um deles, tinha 7 anos, e aos 28 ainda tenho que procurar no google. Isso está longe de ser um protesto “não-político”; é apenas um ato que, por seu momento, consegue ultrapassar a politicagem.
Aqueles que vão para a frente do computador defender a repressão e carimbar, com seu carimbo interminável de rótulos, os manifestantes, não merecem preocupação: estão apenas perdendo o trem da história.
Pai já tô indo-me embora
Quero partir sem brigar
Pois eu já escolhi meu sapato
Que não vai mais me apertar
O dia 13 de junho de 2013 está na história do Brasil – e certamente, na história da mídia brasileira. Algumas cenas marcam essa data.
- Datena, apresentador da Band, abre o seu programa pregando a ordem pública contra a baderna. Faz até uma enquete: “você é a favor de protesto com baderna?”. Seu programa começa no final da tarde; quando ele abre, 40 pessoas já forma detidas, entre elas o fotógrafo do Terra Fernando Borges e o repórter da Carta Capital Piero Locatelli, por portar vinagre (instrumento contra o gás lacrimogêneo). O resultado da enquete é surpreendente: a maior parte dos espectadores é A FAVOR do protesto com baderna. Cenas de helicóptero permeiam o programa; milhares de manifestantes mobilizados, nada de violência. PM acompanhando. A enquete sai do ar. Datena muda de opinião e encerra dizendo: “se eu sou o governador, baixo a passagem hoje mesmo”.
- Globo News faz gigante cobertura do protesto. Três repórteres escalados, mais helicópteros filmando. Uma das repórteres (não identifiquei seu nome) presencia, de um lugar seguro, o início da ação violenta da PM. Para tentar bloquear uma rua, PMs fazem formação de defesa e atiram bombas de gás a esmo, atingindo inclusive a imprensa. A repórter descreve a cena da seguinte forma: “Polícia reagiu à violência dos manifestantes. E é bom lembrar que perto dessa área, existem hospitais, trabalhadores voltando para a casa”. Entra a outra repórter, que está muito perto do local: Rosana Cerqueira, acredito. Quando a linha telefônica abre, sai a sua voz: “Vou ter que desligar, estou correndo da polícia”. Ela não desligou.
- Em editoriais, Folha de S. Paulo e Estadão afinam o discurso. A Folha afirma que é preciso “Retomar a Paulista“, cobra ação enérgica da PM e diz que para os vândalos, é preciso dar a lei. O Estadão vai além: afirma que o governador teve uma postura moderada e precisa ser enérgico ao restabelecer a ordem. Como não brigam com a notícia, os jornalistas desses veículos vão ao protesto. Por volta das 20h30, surge no Estadão a foto de uma menina da Folha com o olho inchado: ela levou uma bala de borracha no olho. Da PM. Saldo divulgado pela Folha: dois jornalistas levaram balas de borracha, sete saíram feridos.
***
O jornalista vai ao protesto para trabalhar; o policial militar, também. Nenhum deles mobiliza o protesto. Ambos portam armas de grosso calibre; as do jornalista, a princípio, não-letais. Quando os jornalistas, que estão trabalhando como os policiais, são agredidos, isso vira notícia. O manifestante pode ser mal-interpretado, pode ser tratado como vagabundo, canalha, covarde, filho da puta. O jornalista, não; ele sempre está ali para trabalhar.
Isso não quer dizer que o jornalista é melhor que ninguém. Se o ativista pacífico, que leva flores, apanha, isso também é notícia, e importante. A diferença é que o ativista que leva flores pode ser confundido com o ativista que resolve quebrar vidros e apedrejar lojas, por aqueles que desconhecem a genealogia do protesto. O jornalista, não: ele certamente não estava ali para quebrar nada.
O que me motiva a escrever esse texto é, especialmente, o sangue nas veias de quem conhece pessoas como Marina Novaes, Vágner Magalhães e Fernando Borges (todos do Terra, todos agredidos) e sabe que é muito triste o fato dessas pessoas voltarem para casa com marcas de cassetete. Eu já apanhei da polícia. Eu já fui ameaçado de prisão. Já fui colocado contra a parede. Eu já vi pessoas inocentes levarem balas de borracha. Foi revoltante – seria em dobro se eu estivesse a trabalho.
***
Eu calço é 37
Meu pai me dá 36
Dói, mas no dia seguinte
Aperto meu pé outra vez
Eu aperto meu pé outra vez
É impossível, para a mídia grande e para a mídia pequena, cobrir todos os focos de repressão e violência policial. O que aconteceu em São Paulo ontem, em outros dias da semana, em Porto Alegre no mês passado, não é nada perto do que muitos jovens da periferia sofrem diariamente. Alguns vão inclusive presos por coisas fúteis – porte de maconha para consumo próprio, p.ex – e outros são totalmente inocentes, e passam dias, meses, submetidos às sevícias de depósitos humanos como o Presídio Central. As agruras dessas pessoas raramente são retratadas. Quando são, o esquecimento vem rápido.
A dor da repressão policial chegou, ontem, ao centro do Brasil: a Avenida Paulista. A indignação das vítimas chegou no mesmo lugar, ao mesmo tempo, e veio em forma de revolta.
Sempre acreditei que uma grande mobilização social no Brasil demoraria bastante para ocorrer. Ainda mais nos tempos atuais: a moeda é valorizada, o desemprego bate em 4%, o consumo é alto, a economia, mesmo que esteja mal, é a melhor que temos em muitos anos. Só que nada disso veio com uma melhora significativa no bem-estar social.
O aumento da passagem é um pretexto para o padrão do Brasil como país emergente: o serviço encarece, mas não melhora. O ônibus ficou mais caro, mas não justificou esse aumento – continua lotando, continua matando os passageiros (como no Rio), continua atrasando. Como os ônibus, os imóveis também ficaram mais caros e não melhoraram. A saúde ficou mais cara e não melhorou. A educação ficou mais cara e não melhorou. Os preços dos ingressos de estádios de futebol encareceram e não melhoraram. A telefonia encareceu e até melhorou, mas funciona muito abaixo do que deveria.
Diante de tudo isso, a chegada de uma Copa das Confederações amplifica a indignação. Os estádios são caríssimos, pagos pelo Estado, e os hospitais, pagos pelo Estado, matam gente por falta de atendimento. O torcedor é convidado a fazer festa, mas não pode beber, gritar nem levar instrumentos musicais. A sociedade é democrática mas o governo impõe padrões de comportamento, padrões Fifa, que são alienígenas à nossa cultura. E isso em um evento que é feito para celebrar o Brasil. Para mostrar notoriedade. Para mostrar quão interessante é o nosso país para o mundo.
A indignação está bem longe de ser sobre o aumento da passagem de ônibus em São Paulo. Em Porto Alegre a passagem não aumentou e milhares foram à rua na mesma quinta-feira. Em Fortaleza, 6 mil saíram para criticar o governador. No Rio de Janeiro, milhares foram protestar contra os ônibus – lá, teve gente MORTA por ônibus este ano e não houve repressão policial. Há também relatos de atos em Goiânia e Maceió, só nessa quinta-feira.
Os manifestantes do Gezi Park, em Istambul, começaram seu ato indignados pelo fim da área verde para a construção de um shopping. Terminaram protestando contra tudo.
O que essa juventude toda que foi à rua realmente quer é mostrar que o espaço público é como um time de futebol: grande por sua gente. Se São Paulo é a locomotiva do Brasil, foi porque as pessoas fizeram assim. Se o Brasil é referência para o mundo, foi porque o povo trabalhador brasileiro, da jornada de 44 horas, do transporte público deficiente, da educação capenga, passa por cima de todas as dificuldades para produzir diariamente.
O resgate do espaço público é o resgate de uma consciência coletiva de que é o povo que faz o país, e não o país que amestra o povo.
***
Por que cargas d’água
Você acha que tem o direito
De afogar tudo aquilo que eu
Sinto em meu peito
Você só vai ter o respeito que quer
Na realidade
No dia em que você souber respeitar
A minha vontade
Diante dessa visão, fica clara a enorme dificuldade de diálogo com esse povo. E essa dificuldade de diálogo é exatamente o que motiva protestos ainda mais fortes.
O belicismo dos editoriais de Folha e Estadão conversa com o assinante conservador que sustenta sua folha de pagamento, mas não conversa com a reputação atingida por esses veículos na sociedade brasileira. O que conversa com a imagem desses veículos é a repórter, que vai ao local para dar a importância que o protesto merece.
Da mesma forma, a postura legalista de Alckmin, Haddad e José Eduardo Cardozo dialoga com as bases, as militâncias, mas não com os eleitores. Quando Alckmin pede energia para combater o vandalismo e diz que baderneiros devem ser reprimidos, ele claramente não percebe o que está acontecendo na sua cidade desde o início. Quando Haddad não acha relevante voltar para as ruas e conversar com os milhares que querem passe livre, ele minimiza a força das ruas em prol da tênue legitimidade do voto. Quando José Eduardo Cardozo diz que pode mandar a Polícia Federal e a Força Nacional para ajudar na repressão, ele conversa com o Jarbas Passarinho que assinou o AI-5: manda às favas seus escrúpulos de consciência em prol de um discurso oficialesco e que já sai da boca mumificado.
E quando a presidente Dilma Rousseff se manifesta sobre a inflação e não sobre as ruas, ela não conversa com Estela, Luísa, Maria Lúcia, Marina, Patrícia e Wanda, que deixaram a oposição consentida para lutar pela VAR-Palmares na ditadura.
A genialidade histórica desses protestos é que, embora eles tenham sido motivados por pessoas à esquerda do governo, nenhum deles carrega seus vícios. O PT catapultou o Fora Collor em 1992, mas não encheu o saco dos caras pintadas com discursos fechados sobre arrocho salarial. Muitos dos que estavam vestidos de preto em 1992 nem sabiam o que era arrocho salarial – eu era um deles, tinha 7 anos, e aos 28 ainda tenho que procurar no google. Isso está longe de ser um protesto “não-político”; é apenas um ato que, por seu momento, consegue ultrapassar a politicagem.
Aqueles que vão para a frente do computador defender a repressão e carimbar, com seu carimbo interminável de rótulos, os manifestantes, não merecem preocupação: estão apenas perdendo o trem da história.
Pai já tô indo-me embora
Quero partir sem brigar
Pois eu já escolhi meu sapato
Que não vai mais me apertar
quinta-feira, 13 de junho de 2013
terça-feira, 11 de junho de 2013
Os cyber-talibãs dos EUA
Por Fernando Brito, no blog Tijolaço:
Com a revelação, pelo Wall Street Journal, de que o monitoramento pela Agência Nacional de Segurança das ligações telefônicas atingia todos os aparelhos das três maiores operadoras de telefonia dos EUA e as empresas de cartão de crédito, além do Facebook e do Google, haverá uma mudança na forma da opinião pública americana encarar a espionagem e a violação de privacidade em nome do combate ao terrorismo.
Até agora, admitia-se tudo, porque os atingidos eram estrangeiros ou mesmo nacionais “fanáticos” ou “fundamentalistas religiosos”.
Agora, cada norte-americano sabe que está sob uma possível vigilância em sua vida particular e econômica. A espionagem não é sobre o outro, nem sobre o próximo. É sobre ele mesmo.
Seus telefonemas, seus e-mails, suas mensagens em redes sociais, tudo
Não se espera, claro, que isso vá provocar uma indignação geral num país acostumado à ideia de que a “segurança nacional” está intimamente ligada à ideia de dominação e poder inseparável da “alma americana”.
Mas vai despertar, sobretudo entre os mais jovens, a certeza de que o sistema político americano está falido, porque mesmo os que se opunham à “Doutrina Bush”, como os democratas, são capazes de praticar os mesmos atos de violação.
Quanto a nós, que operamos boa parte de nossas vidas pela telefonia ou pelos computadores, resta começar a exigir supervisão pública das operações destas empresas no Brasil, diante da nova revelação, feita na edição de hoje do The Guardian, de que há uma ordem presidencial dos EUA para ”Offensive Cyber Effects Operations ”, ou Operações Ofensivas de Efeitos Cibernéticos.
A diretriz de Obama, além de determinar que se elabore “uma lista de potenciais alvos no exterior para os ciber-ataques norte-americanos”, orienta a identificar “capacidades únicas e não-convencionais para avançar os objetivos nacionais dos EUA ao redor do mundo, com pouco ou nenhum aviso ao adversário ou alvo, e com efeitos potenciais que vão desde sutis até os severamente prejudiciais “.
Ou seja, uma guerra cibernética não declarada.
Ou algo como um “terrorismo cibernético internacional”, uma versão high-tech do que acusa os grupos terroristas que diz combater.
Com a revelação, pelo Wall Street Journal, de que o monitoramento pela Agência Nacional de Segurança das ligações telefônicas atingia todos os aparelhos das três maiores operadoras de telefonia dos EUA e as empresas de cartão de crédito, além do Facebook e do Google, haverá uma mudança na forma da opinião pública americana encarar a espionagem e a violação de privacidade em nome do combate ao terrorismo.
Até agora, admitia-se tudo, porque os atingidos eram estrangeiros ou mesmo nacionais “fanáticos” ou “fundamentalistas religiosos”.
Agora, cada norte-americano sabe que está sob uma possível vigilância em sua vida particular e econômica. A espionagem não é sobre o outro, nem sobre o próximo. É sobre ele mesmo.
Seus telefonemas, seus e-mails, suas mensagens em redes sociais, tudo
Não se espera, claro, que isso vá provocar uma indignação geral num país acostumado à ideia de que a “segurança nacional” está intimamente ligada à ideia de dominação e poder inseparável da “alma americana”.
Mas vai despertar, sobretudo entre os mais jovens, a certeza de que o sistema político americano está falido, porque mesmo os que se opunham à “Doutrina Bush”, como os democratas, são capazes de praticar os mesmos atos de violação.
Quanto a nós, que operamos boa parte de nossas vidas pela telefonia ou pelos computadores, resta começar a exigir supervisão pública das operações destas empresas no Brasil, diante da nova revelação, feita na edição de hoje do The Guardian, de que há uma ordem presidencial dos EUA para ”Offensive Cyber Effects Operations ”, ou Operações Ofensivas de Efeitos Cibernéticos.
A diretriz de Obama, além de determinar que se elabore “uma lista de potenciais alvos no exterior para os ciber-ataques norte-americanos”, orienta a identificar “capacidades únicas e não-convencionais para avançar os objetivos nacionais dos EUA ao redor do mundo, com pouco ou nenhum aviso ao adversário ou alvo, e com efeitos potenciais que vão desde sutis até os severamente prejudiciais “.
Ou seja, uma guerra cibernética não declarada.
Ou algo como um “terrorismo cibernético internacional”, uma versão high-tech do que acusa os grupos terroristas que diz combater.
segunda-feira, 10 de junho de 2013
domingo, 9 de junho de 2013
sábado, 8 de junho de 2013
sexta-feira, 7 de junho de 2013
Paranoia da inflação e hipocrisia da burguesia
A
imprensa burguesa tem propagandeado que a inflação está fora do
controle com a divulgação de noticias, artigos e comentários de
políticos de oposição ao governo federal.
Com
isso, colocam o tema dos preços como um fantasma atrás da porta de cada
família brasileira, prestes a assaltá-la e tomar o seu dinheiro.
A
construção dessa paranoia começou com a divulgação de matérias
sensacionalistas sobre o aumento do preço do tomate, como se a
valorização desse alimento tivesse de forma isolada incidência real na
inflação dos gastos da maioria da população.
Qualquer
estudante do primeiro ano de economia já sabe que os estudos do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Fundação
Getúlio Vargas têm diversos itens do orçamento doméstico médio dos
brasileiros, sobre o qual se calcula o aumento da inflação real para as
famílias.
Depois
da criação da “crise do tomate”, a mídia burguesa tem apelado a cada
dia para outros produtos, tentando criar novos factoides.
Essa manipulação grosseira se baseia em duas táticas complementares.
A
primeira delas é criar na população paranoias e preocupações
desnecessárias que resultem em ações de massa que desgastem o governo.
Essa tática deu resultado, por exemplo, com o boato de que a Bolsa Família iria acabar.
Com
isso, 900 mil representantes das famílias mais pobres, desinformados ou
mal informadas, correram para as agências da Caixa, provocando um
verdadeiro tumulto, sobretudo nas cidades do Nordeste.
Hipocrisia descarada
A
segunda tática da burguesia é jogar uma cortina de fumaça sobre os
verdadeiros problemas do país, lançando mão da hipocrisia descarada.
Em
primeiro lugar, a burguesia e seus meios de comunicação sabem que
existe uma tendência geral de aumento dos preços de todas as mercadorias
que estão na sociedade, independente do preço de um único produto.
Ora, se há uma tendência de aumento de preços em todas as mercadorias, quem são os atores econômicos que aumentam os preços?
São exatamente os capitalistas proprietários das fábricas, supermercados ou lojas do comércio.
Portanto, é a base social tucana que opera o aumento dos preços, beneficiando-se com o aumento dos seus lucros.
Assim, o discurso por trás da inflação esconde interesses de classes.
Em
segundo lugar, ao mesmo tempo em que exageram nas notícias sobre um
“descontrole inflacionário”, fazem pressão pelo aumento das taxas de
juros.
Nós, brasileiros, já pagamos os juros mais altos do mundo.
A taxa média de juros paga na economia pelos comerciantes e pelos consumidores é de 58% ao ano.
Os bancos que financiam esses empréstimos ganham 52% de lucro líquido, com a inflação em torno de 6% ao ano.
Não existe paralelo no mundo para a lucratividade dos bancos com crédito no Brasil.
Com
isso, os brasileiros ficam endividados no cartão de crédito ou no
cheque especial, que têm taxas que ultrapassam em média 100% ao ano…
Ou seja, é um verdadeiro assalto.
Para
efeito de comparação, a taxa média de lucro nas economias centrais é de
13% ao ano. Essa taxa já faz brilhar os olhos dos capitalistas nesses
países…
Nenhum
porta-voz da burguesia brasileira protesta nos jornais, revistas e nas
TVs contra esse assalto aos brasileiros que o capital financeiro pratica
todos os dias.
Ao contrário.
Esses
ideólogos defendem aumentos das taxas de juros como uma pretensa medida
para controlar o consumo das massas e impedir o tal descontrole da
inflação.
A terceira hipocrisia da burguesia é omitir que a taxa de câmbio da nossa moeda em relação ao dólar é irreal.
A
comparação dos preços das mercadorias em dólar nos Estados Unidos e em
real no Brasil indica uma taxa de câmbio necessária ao redor de U$S1,00
por R$3,00.
Essa posição é defendida por diversos especialistas da área.
A
atual taxa de câmbio próxima a U$S 1,00 por R$2,00 está provocando um
processo de desindustrialização da economia brasileira e reprimarização
das exportações.
A produção das manufaturas, que geram emprego e valor agregado, não consegue mais competir no mercado internacional.
Essa
taxa de cambio é provocada pela emissão descontrolada do papel dólar
pelo governo dos Estados Unidos e pela avalanche de capital financeiro
especulativo em nosso país, que vem para cá se proteger da crise.
Nenhuma palavra dos porta-vozes da burguesia sobre o “descontrole” da taxa de câmbio.
Ou seja, a mídia da classe dominante sequer protege sua fração industrial.
Controle dos alimentos
A
quarta hipocrisia é esconder que grande parte dos produtos agrícolas
que se transformam em alimentos no mercado interno é controlado por um
oligopólio formado por empresas transnacionais.
Depois
da crise de 2008, houve uma corrida do capital financeiro internacional
e das empresas transnacionais sobre as chamadas commodities para se
proteger da perda de dinheiro.
Assim,
fizeram um brusco movimento especulativo, que fez com que os preços das
commodities aumentassem em três anos, em todo mundo, nada menos do que
200%.
Esse aumento de preço foi repassado para os consumidores de alimentos.
Portanto,
o aumento de certos produtos alimentícios tem como responsáveis os que
multiplicaram os seus ganhos: as grandes empresas do agronegócio, como
Bunge, Monsanto, Unilever, Cargill, Nestlé, Danone, entre outras.
A
quinta hipocrisia da mídia burguesa é ignorar que o Brasil é um dos
maiores produtores mundiais de milho, enquanto a falta de alimentos
dizima 18 milhões de cabeças de bois, vacas, porcos e bodes no Nordeste.
Foram colhidas 60 milhões de toneladas de milho na última safra.
No entanto, diante da pior seca no Nordeste, morrem os animais criados por camponeses da região.
A
morte desses animais será uma perda irreparável para a população
nordestina, que pode demorar uma geração para repor o rebanho dizimado.
As
famílias se salvaram da fome graças a saques, aos benefícios do Fundo
de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural) e ao programa Bolsa
Família, que garantiram renda para fazer a feira e se alimentar.
Diante dessa situação, a presidenta Dilma Rousseff mandou seus ministérios tomarem providências.
O
Ministério do Desenvolvimento Agrário resolveu doar tratores produzidos
no Sul para as prefeituras do Nordeste. Foi só um negócio que não
alterou questões estruturais.
Independente
da situação, o Ministério da Integração Nacional continuou com a
distribuição de lotes de perímetros irrigados para empresários do Sul,
em vez de beneficiar os camponeses da região que padecem com a falta de
água.
A Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) foi autorizada a comprar milho para levar para o Nordeste e salvar o rebanho.
No entanto, a companhia fez vários editais e não encontrou quem vendesse milho suficiente para a demanda. Por quê?
A safra de milho é controlada por empresas transnacionais.
A Cargill e a Bunge exportaram nada menos que 18 milhões de toneladas de milho para os Estados Unidos no último ano.
Esse milho voltou ao país como etanol, importado por esses mesmas empresas.
Com isso, o preço do etanol se mantém bem acima do seu valor real.
Se
o governo quisesse resolver o problema, poderia requisitar a produção
de milho, proibir as exportações e salvar o rebanho no Nordeste,
enfrentando o problema das mortes dos animais causado pela seca.
Nenhuma palavra na imprensa burguesa sobre a falta de milho no país campeão de produção agrícola.
Na verdade, foram escondidas as raízes da perda do rebanho no Nordeste.
Dessa forma, a mídia burguesa demonstra seu compromisso com o interesses do grande capital financeiro internacional.
Os
meios de comunicação da classe dominante, “preocupados” com a inflação,
omitem questões centrais relacionadas à formação dos preços no país.
Assim,
os verdadeiros problemas que a sociedade brasileira enfrenta ficam
submersos diante da manipulação e da hipocrisia dos donos de jornais,
revistas e redes de televisão.
quinta-feira, 6 de junho de 2013
Qual a diferença entre o tratamento dado aos índios hoje em relação aos tempos da ditadura militar?
As semelhanças, por incrível que pareça, são enormes.
O artigo abaixo foi publicado no site da Unisinos. Seu autor, Ivo Lesbaupin, é professor na Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ.
”O índio: aquele que deve morrer.”
Este é o título do “documento de urgência” assinado por um grupo de bispos e missionários divulgado em 1973.
Estávamos no quarto ano do governo Médici, o pior período da ditadura
civil-militar de 1964. O documento era uma denúncia da política
indigenista do regime que, imbuído de uma concepção desenvolvimentista,
de “Brasil Grande”, queria a todo custo construir o conjunto de estradas
que atravessaria a Amazônia, a Transamazônica.
Várias destas estradas cortavam terras indígenas. O governo lidou com
este empecilho passando por cima dos povos indígenas que ousaram se
contrapor a tais obras.
Os autores do documento afirmam: “Essa calamidade, porém, se
justifica dentro da visão do sistema “pois o Parque Nacional do
Xingu não pode impedir o progresso do país”, como afirmou o presidente
da FUNAI, general Bandeira de Mello”.
E mais adiante: “Referindo-se às diretrizes da FUNAI para 1972, (o
general) voltou a ressaltar que o índio não pode deter o
desenvolvimento”.
A história parece estar se repetindo.
Em primeiro lugar, contrariando a posição que tinha enquanto
candidato, o governo Lula ressuscitou um projeto do tempo da ditadura,
a usina hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu.
Este projeto, iniciado em 1975, foi interrompido em 1989, em razão da
resistência dos povos indígenas. O Banco Mundial, que financiaria a
construção, desistiu da obra. Somente se voltou a ouvir falar neste
projeto quase vinte anos depois, no primeiro mandato do governo Lula.
O projeto foi remodelado para reduzir a obra de cinco usinas para
apenas uma, de modo a torná-lo palatável. Mesmo no novo formato, a usina
afetará seriamente o rio Xingu, deixando o trecho conhecido como “Volta
Grande” – cerca de cem quilômetros – reduzido a um riacho. O habitat
dos povos indígenas e dos ribeirinhos será gravemente atingido.
Houve inúmeras tentativas de povos indígenas, de movimentos sociais,
de setores da Igreja católica de demover o governo deste projeto. O
Ministério Público Federal do Pará por várias vezes determinou a
suspensão da obra. A cada medida judicial contrária ao projeto, o
governo interpôs outras medidas para mantê-lo.
O IBAMA considerou que havia razões ambientais suficientes para não
liberar a obra. Para afastar o IBAMA do caminho, o governo dividiu a
instituição em duas. Não foi o bastante: foi preciso afastar também
alguns técnicos que insistiam em ver problemas na realização da obra.
A licença para construir incluiu uma série de condicionantes: a
empresa responsável deveria oferecer à população local melhorias em
infraestrutura, em saúde, em educação, assim como garantir condições
dignas de trabalho para os operários.
A empresa cumpriu menos de 20% dos condicionantes, porém a obra continua e os empréstimos do BNDES são regularmente concedidos.
Embora ciente do descumprimento desta parte do contrato (os
condicionantes), o governo não interfere. Mas toda vez que os operários
interromperam o trabalho ou os indígenas protestaram, a intervenção foi
imediata.
Não contente com a usina de Belo Monte, o governo incluiu no PAC a
construção de 28 usinas hidrelétricas nos rios da Amazônia:
desde Jirau e Santo Antônio, no rio Madeira, até cinco usinas projetadas
no Tapajós. Em cada um destes lugares, enfrentou-se com a resistência
dos povos indígenas.
Mas o governo não recuou. Para garantir a realização de seus projetos
e dos estudos ambientais que os precedem, o governo instituiu a
possibilidade de uso de tropas – a Força Nacional – para obrigar os
indígenas à submissão. A justificativa é a mesma: o índio não pode
atrapalhar o progresso do país.
O que está em questão tanto na época da ditadura quanto hoje é a
concepção de desenvolvimento. Para a política dominante, desenvolvimento
é crescimento econômico: produzir cada vez mais, o que supõe aumento da
demanda de energia. Portanto, o Brasil tem de produzir mais energia
elétrica.
No entanto, frente à gravidade da situação ambiental no planeta, dos
riscos que corremos se continuarmos este sistema de expansão da produção
e do consumo, a própria concepção de desenvolvimento deve ser
repensada. O modelo produtivista-consumista tem de ser superado.
Outro forte argumento dos que se opõem à construção das hidrelétricas
na Amazônia é que não temos mais necessidade deste tipo de fonte de
energia. As hidrelétricas existentes, se forem reformadas, já terão como
resultado um aumento significativo da energia produzida.
Em segundo lugar, o Brasil dispõe de fontes renováveis de energia, tais como o sol, os ventos, as ondas do mar.
Nós não precisamos nem de novas usinas hidrelétricas nem de energia nuclear, como o demonstram estudos de especialistas.
Na Alemanha, durante anos os governos defenderam que a energia nuclear era imprescindível como fonte de eletricidade.
Depois da tragédia de Fukushima, o governo alemão cedeu e desistiu
deste caminho: não construirá mais usinas nucleares e vai pouco a pouco
desativar as usinas existentes. Está investindo seriamente em energia
solar e eólica.
O desprezo em relação aos povos indígenas não se limita ao caso das hidrelétricas, por si só extremamente grave.
Soma-se a isso a tragédia vivida pelo povo guarani-kaiowá, de Mato
Grosso do Sul, obrigado a viver em locais exíguos ou na beira da
estrada, constantemente submetidos a investidas armadas de jagunços ou
da polícia local a serviço dos fazendeiros.
Aí o conflito é motivado pela ganância dos fazendeiros, do agronegócio, desejosos de se apropriar das terras indígenas.
Como diz o jornalista Washington Novaes: “Parece iminente a ameaça de
conflito armado entre 45 mil índios caiovás-guaranis e fazendeiros que
disputam suas terras em MS. É tema sobre o qual o autor destas linhas
escreve há décadas. Centenas deles já morreram nos conflitos. E um jovem
guarani suicidou-se no dia seguinte ao de seu casamento; enforcou-se
numa árvore e deixou escrito na terra, sob seus pés: “Eu não tenho
lugar”.
Estas linhas já estavam escritas quando mais um índio foi assassinado
no mesmo estado, desta vez da etnia Terena, numa ação de reintegração
de posse em favor de fazendeiros de que participaram a polícia federal e
a polícia militar do Mato Grosso do Sul.
Hidrelétricas, mineradoras, agronegócio, desenvolvimentismo,
neodesenvolvimentismo versus direitos dos povos indígenas: qual a
diferença entre a política indigenista do atual governo e aquela da
ditadura de 1964?
quarta-feira, 5 de junho de 2013
Nota do Cimi: O Governo Dilma, o agronegócio e os Povos Indígenas
O
Governo Federal dá mostras cada vez mais evidentes que não entende e
que não está disposto a entender os povos indígenas brasileiros. As
medidas anunciadas pelo governo com o intuito de superar os conflitos em
torno das questões indígenas no Brasil parte do pressuposto equivocado
segundo o qual os povos indígenas estariam causando os conflitos e
agindo sob o comando de organizações não indígenas, de modo especial o
Cimi. Além de preconceituosa e racista, uma vez que considera os povos
seres inferiores e incapazes de decisões próprias, o pressuposto é
sociologicamente falho. Julgamos que algumas informações acerca da
realidade que envolve a temática são importantes e suficientes para entendermos a situação. Vejamos.
O governo Dilma aprofundou o processo de retração de demarcações das terras indígenas. É o governo que menos demarca terras indígenas desde a ditadura militar. O governo também tomou medidas administrativas lesivas aos direitos dos povos, tais como a Portaria 419/11, a Portaria 303/12 e o Decreto 7957/13. A presidente Dilma ainda não recebeu os povos indígenas para qualquer conversa ao longo destes mais de dois anos de mandato. No entanto, somente no mês de maio, a presidenta reservou tempo em sua agenda para ao menos cinco encontros com representantes dos ruralistas, inimigos históricos dos povos indígenas. Somente em maio, Dilma esteve, oficialmente, duas vezes reunida com a senadora Kátia Abreu (PSD/TO), presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA). Os povos indígenas sabem que a CNA representa o ruralismo anti-indígena, responsável pelo ataque à legislação ambiental, que resultou na aprovação do novo Código Florestal em 2012, e pelo atual ataque aos seus direitos no Congresso Nacional.
A bancada ruralista ataca os direitos dos povos por meio de diferentes instrumentos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Há mais de uma centena de proposições legislativas contrárias aos direitos dos povos em tramitação nas duas casas do Congresso. Dentre elas destacam-se as Propostas de Emendas Constitucionais 215/2000, 038/1999 e 237/2013. Os povos indígenas sabem que os ruralistas querem fazer com a PEC 215/2000, hoje, o mesmo que fizeram com o Código Florestal em 2012. Flexibilizar os direitos dos povos e ter nas próprias mãos o poder para não demarcar as terras indígenas no país.
Os povos indígenas, acampados em beiras de estradas ou confinados em reservas diminutas, tem demonstrado uma resistência e uma paciência históricas diante das violências do agronegócio e da parcimônia do Governo Federal. No entanto, certamente não estão dispostos a continuar sobrevivendo em condições sub-humanas, morrendo vítimas de desassistência, de assassinatos, de suicídios e de atropelamentos, exilados de suas terras até o fim de sua existência enquanto pessoas e povos.
Demarcações paralisadas pelo Governo Federal e ruralistas no ataque para impedir novas demarcações, rever as demarcações já realizadas e explorar as terras demarcadas. É isso que os povos indígenas enxergam na conjuntura político indigenista do Brasil. É contra este ataque sincronizado do Governo Federal e do agronegócio que os povos reagem na perspectiva de que seus direitos sejam preservados e efetivados. Uma reação, portanto, em legítima defesa de suas existências enquanto indivíduos e povos.
Será tão difícil para Dilma e seu governo entender isso? Sem falar com os povos e falando a todo o momento com o agronegócio, Dilma e seu governo continuarão sem entender os 305 povos indígenas existentes em nosso país.
Assim,
partindo de um pressuposto equivocado, o governo adota e anuncia
medidas equivocadas para tentar resolver os conflitos por ele criados.
Protelar reintegrações de posse não irá resolver o conflito. Os povos já foram expulsos pelos fazendeiros de suas terras e nem por isso deixaram de lutar pelo retorno às mesmas. Não será a expulsão pelas forças do Estado, com dois ou três dias de protelação, que mudará a relação dos povos com suas terras tradicionais.
Mudar o processo de demarcação das terras indígenas não irá resolver o conflito. Essa medida irá aprofundar ainda mais a retração nas demarcações, uma das causas centrais destes conflitos. Os povos indígenas sabem que a protelação das demarcações é parte da estratégia dos ruralistas, que querem “ganhar tempo” enquanto eles atuam para ter o poder acerca das não demarcações das terras, que se daria com a aprovação da PEC 215/2000.
Por fim, amordaçar o Cimi não irá resolver o conflito. Primeiro porque os povos são autônomos, cientes e senhores de suas decisões e do que é necessário para defender seus direitos. Segundo porque o Cimi não deixará de denunciar os ataques desferidos pelo governo e pelos ruralistas contra os povos indígenas no Brasil. O Cimi faz isso desde 1972 quando foi criado, em plena ditadura militar, e o fará até o último suspiro de sua existência. O compromisso do Cimi é com a vida dos povos indígenas.
Para resolver efetivamente os conflitos que envolvem o tema, o Cimi entende que o governo deve organizar uma força tarefa para, dentre outras medidas urgentes e estruturantes: a) destravar os processos de demarcação, tanto no campo administrativo, quanto no campo judicial; b) ouvir os povos indígenas; c) revogar os próprios instrumentos de ataque aos povos, tais como, as portarias 419/2011 e 303/2012 e o Decreto 7957/2013; d) mobilizar sua ampla base de apoio no Congresso a fim de que se evite os retrocessos almejados pelos ruralistas quanto aos direitos dos povos.
Brasília, DF, 03 de junho de 2013.
Conselho Indigenista Missionário – Cimi
POP CONCLUSIVO
cada instante é o
infinito
somado ao infinito de cada
instante
entre um e outro movimento
na cadeia produtiva
da imaginação
a sensualidade das luas
que mudam em cada quarto
o amanhecer que suspende
o brilho das estrelas
... e a vida é tão veloz
que qualquer instante pode
ser eterno
e que tudo mais vá pro inferno
somado ao infinito de cada
instante
entre um e outro movimento
na cadeia produtiva
da imaginação
a sensualidade das luas
que mudam em cada quarto
o amanhecer que suspende
o brilho das estrelas
... e a vida é tão veloz
que qualquer instante pode
ser eterno
e que tudo mais vá pro inferno
(Lau Siqueira)
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