Violência explode nos protestos “mais do mesmo” na Argentina
Aí no Brasil – escrevo em viagem de trabalho ao exterior –, os
protestos contra o governo de Cristina Kirchner que eclodiram na
Argentina na quinta-feira (8.9) foram apresentados sem que fossem
informados detalhes que desautorizam o tom de “revolta popular”
apocalíptica adotado pela imprensa corporativa brasileira, pelo que este
Blog trata de oferecê-los.
Explico que a iniciativa de escrever este post se deveu a que estou
no Peru, no âmbito de uma incursão comercial que já chega ao 11º dia
após passar por Bolívia e Equador e que, neste sábado, retornará à
Bolívia e lá permanecerá até meados da semana que entra, quando retorno
ao Brasil.
O fato é que, na noite de quinta-feira, assistindo tevê a cabo no
quarto de hotel, sintonizei a televisão argentina Telefé e deparei com
uma cena impressionante que, inclusive, é o que dá título a este post – e
sobre a qual discorrerei mais adiante.
Antes, porém, devo contextualizar o que aconteceu na Argentina, o que
farei graças a ligações que fiz para fontes que tenho naquele país.
Em primeiro lugar, é bom que saibam que o tão propalado “8 N” (8 de
novembro, dia do protesto) ocorreu pouco menos de dois meses após o “13
S” (13 de setembro), o protesto anterior que levou argentinos à rua com a
mesma finalidade de atacar o governo pelos mais distintos motivos, que
não se resumem só à tal “re-re”, a suposta intenção da presidente do
país vizinho de se candidatar à re-reeleição, o que a lei argentina
proíbe.
Muito menos, tais protestos ocorreram em favor do grupo de mídia
Clarín, em razão de fato que ocorrerá em breve e que se representa por
outra sigla oriunda do calendário, o “7 D” (7 de dezembro), data em que
vence a liminar que permitiu à “Globo” argentina descumprir a lei que
proíbe oligopólios na comunicação, apesar de que certa mídia brasileira
tenta fazer crer o contrário.
Outra conversa fiada é a de que não havia políticos nas
manifestações. Havia, sim, e muitos. Só que estavam disfarçados. Ou
seja: os partidos de oposição que ajudaram a insuflar as marchas em todo
país apenas deixaram as suas bandeiras em casa, de forma a ajudarem a
conferir “espontaneidade” a elas.
Nos arredores do Obelisco da Avenida 9 de julho, onde a manifestação
foi mais massiva, havia uma variedade de políticos insuflando a massa,
quase todos pertencentes ao “macrismo” e ao grupo Gapu, movimentos de
direita que se opõem a Cristina Kirchner e que se inspiram no prefeito
de Buenos Aires, Mauricio Macri.
Foram vistos nos protestos vários integrantes da coalizão PRO
(Proposta Repúblicana), integrada pelo CPC (Compromisso Pela Mudança),
partido de Macri.
Alguns políticos identificados foram Federico Pinedo, Paula Bertol,
Sergio Bergman, Patricia Bullrich, Eduardo Amadeo. Havia, também, vários
funcionários do PRO como Néstor Grindetti e Daniel Chain, ruralistas
como Mario Llambías e Luciano Miguens, o ativista de oposição Raúl
Castells e o ultradireitista Alejandro Biondini.
Outro fato que a mídia brasileira sonega é que a manifestação foi
maciçamente composta pelas classes alta e média alta. Prova disso é que
os manifestantes marcharam desde bairros como Santa Fé rumo à avenida
Corrientes, que desemboca na 9 de Julho, onde fica o Obelisco. No Sul da
cidade, região mais pobre, as manifestações foram escassas ou
inexistentes.
Mais uma informação sonegada: durante as marchas, registraram-se
simultâneos “apagões” em várias regiões, coisa que não costuma
acontecer. Há relatos continuados de sabotagem das redes elétricas. Ou
terá sido coincidência que esses apagões ocorreram justo no dia das
manifestações?
Ainda que pareça espantosa a massa humana que foi às ruas – e para
oferecer essa informação não precisei de fontes porque conheço muito bem
a Argentina e, sobretudo, Buenos Aires, por conta de meu trabalho –, na
Argentina e em vários outros países latino-americanos as manifestações
de rua são comuns e para todos os gostos.
Este ano mesmo, durante viagem que fiz a Buenos Aires, a mesma
avenida 9 de Julho fervilhava de apoiadores do governo – sindicatos,
movimentos sociais etc. A Argentina é muito parecida com a Venezuela,
nesse aspecto. Portanto, não se surpreendam se, em poucos dias, eclodir
uma marcha de apoiadores do governo para se contrapor à de opositores.
Só haverá uma diferença: a mídia brasileira não irá cobrir como fez com a marcha antigovernista.
Por conta disso, as manifestações que se pretenderam apocalípticas
para o governo de Cristina Kirchner – e que assim foram apresentadas
pela mídia brasileira – não passam de mais do mesmo, de protestos que
ocorrem naquele país contra o governo há bastante tempo, inclusive antes
da última eleição presidencial, que a presidente venceu com folga. Eis
porque ela não está nem dando bola.
O que surpreendeu, em alguma medida, foram atos de violência um tanto
incomuns nessas manifestações. Atos que ocorreram sobretudo contra a
imprensa.
Então você deve estar se perguntando como é possível que uma marcha
contra o governo ataque a imprensa, pois deve estar supondo que, como no
Brasil, ela também é contra o governo. Não é bem assim. Com a
democratização das comunicações em curso na Argentina já há um bom
tempo, o país tem hoje imprensa para todos os gostos.
As imagens que você verá abaixo, em matéria da rede argentina C5N,
portanto, mostram o viés truculento desses setores elitistas que saíram
às ruas para protestar contra o governo. E note que, em nenhum momento, a
matéria acusa kirchneristas pelos ataques. Os que agrediram o repórter
dessa rede e de outras julgaram-nos como sendo da “imprensa governista”.
Retirado do Blog da Cidadania
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