Que me perdoem os ávidos telespectadores do Big Brother Brasil (BBB),
produzido e organizado pela nossa distinta Rede Globo, mas conseguimos
chegar ao fundo do poço. [...] Chega a ser difícil encontrar as palavras
adequadas para qualificar tamanho atentado à nossa modesta
inteligência.
[...] Pergunto-me, por exemplo, como um
jornalista, documentarista e escritor como Pedro Bial que, faça-se
justiça, cobriu a Queda do Muro de Berlim, se submete a ser apresentador
de um programa desse nível. Em um e-mail que recebi
há pouco tempo, Bial escreve maravilhosamente bem sobre a perda do
humorista Bussunda referindo-se à pena de se morrer tão cedo. Eu
gostaria de perguntar se ele não pensa que esse programa é a morte da
cultura, de valores e princípios, da moral, da ética e da dignidade.
Outro
dia, durante o intervalo de uma programação da Globo, um outro repórter
acéfalo do BBB disse que, para ganhar o prêmio de um milhão e meio de
reais, um Big Brother tem um caminho árduo pela frente, chamando-os de
heróis. Caminho árduo? Heróis? São esses nossos exemplos de heróis?
Caminho
árduo para mim é aquele percorrido por milhões de brasileiros,
profissionais da saúde, professores da rede pública (aliás, todos os
professores) , carteiros, lixeiros e tantos outros trabalhadores
incansáveis que, diariamente, passam horas exercendo suas funções com
dedicação, competência e amor e quase sempre são mal remunerados.
Heróis
são milhares de brasileiros que sequer tem um prato de comida por dia e
um colchão decente para dormir, e conseguem sobreviver a isso todo
santo dia.
Heróis são crianças e adultos que lutam contra
doenças complicadíssimas porque não tiveram chance de ter uma vida mais
saudável e digna.
Heróis são inúmeras pessoas, entidades sociais
e beneficentes, ONGs, voluntários, igrejas e hospitais que se dedicam
ao cuidado de carentes, doentes e necessitados (vamos lembrar de nossa
eterna heroína Zilda Arns).
Heróis são aqueles que, apesar de
ganharem um salário mínimo, pagam suas contas, restando apenas dezesseis
reais para alimentação, como mostrado em outra reportagem apresentada
meses atrás pela própria Rede Globo.
O Big Brother Brasil não é
um programa cultural, nem educativo, não acrescenta informações e
conhecimentos intelectuais aos telespectadores, nem aos participantes, e
não há qualquer outro estímulo como, por exemplo, o incentivo ao
esporte, à música, à criatividade ou ao ensino de conceitos como valor,
ética, trabalho e moral. São apenas pessoas que se prestam a comer,
beber, tomar sol, fofocar, dormir e agir estupidamente para que, ao
final do programa, o “escolhido” receba um milhão e meio de reais. E ai
vem algum psicólogo de vanguarda e me diz que o BBB ajuda a "entender o
comportamento humano". Ah, tenha dó!!!
Veja o que está por de
tra$$$ do BBB: José Neumani da Rádio Jovem Pan, fez um cálculo de que se
vinte e nove milhões de pessoas ligarem a cada paredão, com o custo da
ligação a trinta centavos, a Rede Globo e a Telefônica arrecadam oito
milhões e setecentos mil reais. Eu vou repetir: oito milhões e
setecentos mil reais a cada paredão.
Já imaginaram quanto
poderia ser feito com essa quantia se fosse dedicada a programas de
inclusão social, moradia, alimentação, ensino e saúde de muitos
brasileiros? (Poderia ser feito mais de 520 casas populares; ou comprar
mais de 5.000 computadores). Essas palavras não são de revolta ou
protesto, mas de vergonha e indignação, por ver tamanha aberração ter
milhões de telespectadores.
Em vez de assistir ao BBB, que tal
ler um livro, um poema de Mário Quintana ou de Neruda ou qualquer outra
coisa..., ir ao cinema..., estudar... , ouvir boa música..., cuidar das
flores e jardins... , telefonar para um amigo... , visitar os avós... ,
pescar..., brincar com as crianças... , namorar... ou simplesmente
dormir.
Assistir ao BBB é ajudar a Globo a ganhar rios de dinheiro e
destruir o que ainda resta dos valores sobre os quais foi construído
nossa sociedade.
Obs.: BBB* - Big Brother Brasil
( Luís Fernando Veríssimo )
Obs.: BBB* - Big Brother Brasil
( Luís Fernando Veríssimo )
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