segunda-feira, 30 de julho de 2012
quinta-feira, 26 de julho de 2012
Te doy una canción: viva o 59° aniversário de Moncada
Por Mauro Iasi na Boitempo
Silvio Rodríguez
Evidente que todos nos? preocupamos com a situação atual e sabemos que as experiências históricas, por mais valorosas que sejam, não dependem apenas da disposição moral e da decisão política de resistir. Mas falemos um pouco disso, da disposição de seguir em frente, da arte de resistir.
Dicen que me arrastarán por sobre rocas
cuando esta revolución se venga abajo,
que machacarán mis manos y mi boca,
que me arrancarán los ojos y el badajo.
Será que la necedad parió conmigo,
la necedad de lo que hoy resulta necio:
la necedad de asumir al enemigo,
la necedad de vivir sin tener précio.
Yo no sé lo que és el destino,
caminando fui lo que fui.
Allá Dios que será divino.
Yo me muero como vivi.
Ele mesmo, na epigrafe que segue a letra no encarte do disco, explica que se trata de uma canção de marketing, de preços e esclarece: “y para que nadie se imagine que soy santo, voy a poner el mio (précio, por ahora): El levantamiento Del bloqueo a Cuba y La entrega incondicional del território cubano que EEUU usa como base naval en Guantánamo”.
Há um fator, imponderável, que aqui se apresenta e que é inseparável da experiência da Revolução Cubana: a dignidade. Em tempos como os nossos, de desilusão, de indignação vazia, nada melhor que nos colocarmos diante de um exemplo de dignidade consciente, humanamente intransigente, politicamente convicta. Em outra musica que trata do mesmo tema, “El Baile”, Silvio nos fala das armadilhas daqueles que querem nos convencer a participar desta ordem injusta e sanguinária, nos oferecendo as benesses que cabem aos que se rendem – “rondándonos, cercándonos para inmovilizarnos” – e nos alerta:
No voy, no vas
al juego del disfraz,
corista tú y amor de este arlequín
romántico -al menos hasta el fin-,
imposmodernizable.
Que expressão mais precisa e feliz: “impósmodernizável”. O poeta arranca de seu peito as notas que fazem voar as palavras. Suas trovas nasceram quando ainda era soldado e por isso canta: “te doy una canción como un disparo”. Em um programa recente de televisão ao ser entrevistado recebe uma pergunta: você se considera um cantor oficialista? E Silvio responde:
Veja, se é da Revolução Cubana que estão falando, da Revolução que comandou Fidel e que deram continuidade tanta gente valiosa como foi Raul, Che, Camilo e toda esta gente, se é a isso que estão se referindo, digo: como muita honra, muitíssima honra ser oficialista desta Revolução. Do que eu não gostaria de ser “oficialista” é daqueles que lançam bombas em Iraque ou Afeganistão (…) que tentaram invadir Cuba (…), isso sim, para mim seria uma desonra e uma vergonha oficiar semelhantes idéias.
Neste mês de julho, por ocasião do VI Congresso da UJC, tive o prazer de participar de um seminário internacional com representantes de várias organizações de jovens de nossa America Latina. Entre eles estava Hanói Sanches Rodrigues da UJC de Cuba e Secretário geral da FMJD, uma federação mundial de jovens. Em seu depoimento no qual reafirmou a firme decisão da juventude cubana em seguir lutando pela construção do socialismo mesmo diante dos grandes problemas e desafios que se apresentam diante deles, lembrou de tempos difíceis em Cuba, quando estudava e havia grandes cortes de luz e ele e dezoito companheiros seguiam estudando à luz de uma pequena lamparina.
Nosso comandante, Che Guevara, nos dizia em suas reflexões sobre a economia e a construção do socialismo o seguinte:
“O socialismo econômico sem a moral comunista não me interessa, dizia Che. Lutamos contra a miséria, mas ao mesmo tempo lutamos contra a alienação. Um dos objetivos fundamentais do marxismo é fazer desaparecer o “interesse individual e também, das motivações psicológicas. Marx se preocupava tanto com os fatos econômico como sua tradução na mente. Ele chamava isto de “fatos de consciência”. Se o comunismo descuida dos fatos de consciência pode até se tornar um método de distribuição, mas deixa de ser uma moral revolucionária.” (Entrevista com Jean Daniel, sob o título “La profecia del Che”, in Carlos Tablada Perez – Ernesto Che Guevara, hombre y pensamiento: el pensamiento econômico del Che. Buenos Aires, Antarca: 1987, p. 45.)
Para nós esta concepção é que fundamenta o poema de Silvio Rodriguez que utilizamos como epígrafe e que diz que “Martí nos hablo de la amistad e creo nel en cada dia, aunque la crud economia ha parido otra verdad”. O próprio Che é que conclui que:
Não se trata de quantas gramas de carne se come ou quantas vezes por ano alguém pode ir à praia, nem de quantas belezas que vem do exterior possam ser compradas com os salários atuais. Trata-se, precisamente, que o indivíduo se sinta mais pleno, com muito mais riqueza interior e com muito mais responsabilidade.
Talvez isso explique, talvez não, este elemento de humanidade que encontramos na revolução cubana, esta firme e digna decisão de resistir. Não sabemos o que virá – “Yo no sé lo que és el destino”- , mas saudamos o aniversário do assalto ao quartel Moncada, abraçamos aos nossos camaradas cubanos e lhes agradecemos por ter mantido vivo nosso sonho por todo este tempo.
Nós somos como aqueles estudantes entorno de uma lamparina. Lá fora muitos são os que estão aceitando o convite para o baile em que a corte nos espera para derramar nosso sangue no altar do capital e depois festejar os índices de crescimento econômico. Eu, por meu lado, trocaria de bom grado a pujança do crescimento capitalista brasileiro pela dignidade de apenas um daqueles jovens cubanos.
Por isso cantamos com Silvio:
Que tiemble la injusticia cuando lloran
los que no tienen nada que perder.
Que tiemble la injusticia cuando llora
el aguerrido pueblo de Fidel
que tiemble la injusticia cuando llora
el aguerrido pueblo de Fidel.
Mauro Iasi é professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, presidente da ADUFRJ, pesquisador do NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e membro do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser da consciência (Boitempo, 2002).
Martí me habló de la amistad
y creo en él cada día,
aunque la cruda economía
ha dado luz a otra verdad.
y creo en él cada día,
aunque la cruda economía
ha dado luz a otra verdad.
Silvio Rodríguez
No
dia 26 de julho de 1953 acontecia o Assalto ao Quartel Moncada que dava
início à Revolução Cubana. Muito já se falou desta incrível experiência
e muitas são as preocupações que cercam o atual momento e as
perspectivas desta Ilha revolucionária (ver, por exemplo o artigo Três originalidades e um velho caminho, na revista eletrônica Múltiplas Leituras, v. 2, n.2, 2009). Hoje quero tratá-la de uma maneira diferente.
Evidente que todos nos? preocupamos com a situação atual e sabemos que as experiências históricas, por mais valorosas que sejam, não dependem apenas da disposição moral e da decisão política de resistir. Mas falemos um pouco disso, da disposição de seguir em frente, da arte de resistir.
Silvio
Rodriguez, compositor cubano e um dos protagonistas do movimento chamado
“Nova Trova”, tem sido uma voz poética e lúcida desta resistência. Em
uma musica chamada “El Necio”, Silvio diz:
Dicen que me arrastarán por sobre rocas
cuando esta revolución se venga abajo,
que machacarán mis manos y mi boca,
que me arrancarán los ojos y el badajo.
Será que la necedad parió conmigo,
la necedad de lo que hoy resulta necio:
la necedad de asumir al enemigo,
la necedad de vivir sin tener précio.
Yo no sé lo que és el destino,
caminando fui lo que fui.
Allá Dios que será divino.
Yo me muero como vivi.
Néscio, como vocês sabem, é alguém
estúpido, ignorante. Seremos, então, estúpidos por acreditar naquilo que
acreditamos? Logo no começo da mesma canção, Silvio nos conta do
assédio daqueles que nos prometem fazer-nos “únicos”, nos garantir um
“lugarzinho em seus altares” e para isso nos convidam ao arrependimento,
tentam nos convencer a que não percamos a oportunidade, diz o poeta
cubano, “me vienen a convidar a que no pierda, me vienen a convidar a
indefinirme, me vienen a convidar tanta mierda”.
Ele mesmo, na epigrafe que segue a letra no encarte do disco, explica que se trata de uma canção de marketing, de preços e esclarece: “y para que nadie se imagine que soy santo, voy a poner el mio (précio, por ahora): El levantamiento Del bloqueo a Cuba y La entrega incondicional del território cubano que EEUU usa como base naval en Guantánamo”.
Há um fator, imponderável, que aqui se apresenta e que é inseparável da experiência da Revolução Cubana: a dignidade. Em tempos como os nossos, de desilusão, de indignação vazia, nada melhor que nos colocarmos diante de um exemplo de dignidade consciente, humanamente intransigente, politicamente convicta. Em outra musica que trata do mesmo tema, “El Baile”, Silvio nos fala das armadilhas daqueles que querem nos convencer a participar desta ordem injusta e sanguinária, nos oferecendo as benesses que cabem aos que se rendem – “rondándonos, cercándonos para inmovilizarnos” – e nos alerta:
No voy, no vas
al juego del disfraz,
corista tú y amor de este arlequín
romántico -al menos hasta el fin-,
imposmodernizable.
Que expressão mais precisa e feliz: “impósmodernizável”. O poeta arranca de seu peito as notas que fazem voar as palavras. Suas trovas nasceram quando ainda era soldado e por isso canta: “te doy una canción como un disparo”. Em um programa recente de televisão ao ser entrevistado recebe uma pergunta: você se considera um cantor oficialista? E Silvio responde:
Veja, se é da Revolução Cubana que estão falando, da Revolução que comandou Fidel e que deram continuidade tanta gente valiosa como foi Raul, Che, Camilo e toda esta gente, se é a isso que estão se referindo, digo: como muita honra, muitíssima honra ser oficialista desta Revolução. Do que eu não gostaria de ser “oficialista” é daqueles que lançam bombas em Iraque ou Afeganistão (…) que tentaram invadir Cuba (…), isso sim, para mim seria uma desonra e uma vergonha oficiar semelhantes idéias.
Neste mês de julho, por ocasião do VI Congresso da UJC, tive o prazer de participar de um seminário internacional com representantes de várias organizações de jovens de nossa America Latina. Entre eles estava Hanói Sanches Rodrigues da UJC de Cuba e Secretário geral da FMJD, uma federação mundial de jovens. Em seu depoimento no qual reafirmou a firme decisão da juventude cubana em seguir lutando pela construção do socialismo mesmo diante dos grandes problemas e desafios que se apresentam diante deles, lembrou de tempos difíceis em Cuba, quando estudava e havia grandes cortes de luz e ele e dezoito companheiros seguiam estudando à luz de uma pequena lamparina.
Nosso comandante, Che Guevara, nos dizia em suas reflexões sobre a economia e a construção do socialismo o seguinte:
“O socialismo econômico sem a moral comunista não me interessa, dizia Che. Lutamos contra a miséria, mas ao mesmo tempo lutamos contra a alienação. Um dos objetivos fundamentais do marxismo é fazer desaparecer o “interesse individual e também, das motivações psicológicas. Marx se preocupava tanto com os fatos econômico como sua tradução na mente. Ele chamava isto de “fatos de consciência”. Se o comunismo descuida dos fatos de consciência pode até se tornar um método de distribuição, mas deixa de ser uma moral revolucionária.” (Entrevista com Jean Daniel, sob o título “La profecia del Che”, in Carlos Tablada Perez – Ernesto Che Guevara, hombre y pensamiento: el pensamiento econômico del Che. Buenos Aires, Antarca: 1987, p. 45.)
Para nós esta concepção é que fundamenta o poema de Silvio Rodriguez que utilizamos como epígrafe e que diz que “Martí nos hablo de la amistad e creo nel en cada dia, aunque la crud economia ha parido otra verdad”. O próprio Che é que conclui que:
Não se trata de quantas gramas de carne se come ou quantas vezes por ano alguém pode ir à praia, nem de quantas belezas que vem do exterior possam ser compradas com os salários atuais. Trata-se, precisamente, que o indivíduo se sinta mais pleno, com muito mais riqueza interior e com muito mais responsabilidade.
Talvez isso explique, talvez não, este elemento de humanidade que encontramos na revolução cubana, esta firme e digna decisão de resistir. Não sabemos o que virá – “Yo no sé lo que és el destino”- , mas saudamos o aniversário do assalto ao quartel Moncada, abraçamos aos nossos camaradas cubanos e lhes agradecemos por ter mantido vivo nosso sonho por todo este tempo.
Nós somos como aqueles estudantes entorno de uma lamparina. Lá fora muitos são os que estão aceitando o convite para o baile em que a corte nos espera para derramar nosso sangue no altar do capital e depois festejar os índices de crescimento econômico. Eu, por meu lado, trocaria de bom grado a pujança do crescimento capitalista brasileiro pela dignidade de apenas um daqueles jovens cubanos.
Por isso cantamos com Silvio:
Que tiemble la injusticia cuando lloran
los que no tienen nada que perder.
Que tiemble la injusticia cuando llora
el aguerrido pueblo de Fidel
que tiemble la injusticia cuando llora
el aguerrido pueblo de Fidel.
Mauro Iasi é professor adjunto da Escola de Serviço Social da UFRJ, presidente da ADUFRJ, pesquisador do NEPEM (Núcleo de Estudos e Pesquisas Marxistas), do NEP 13 de Maio e membro do Comitê Central do PCB. É autor do livro O dilema de Hamlet: o ser e o não ser da consciência (Boitempo, 2002).
segunda-feira, 23 de julho de 2012
Do poeta Aziel Lima
sou da terra do óxente
do prumode do pruque
sou taxado de matuto
com orgulho pode crer
mais não troco meu nordeste
por sudeste de ninguem
isso afirmo pra voçe
eu falo aqui acula
adonde vice quinem
aqui como rapadura
com angu bata docé
alimento que faz
e não troco meu nordeste
por sudeste de ninguem
voçe julga o meu sutaque
o meu jeito de falar
eu falo paraibanez
e jamais irei deixar
onde vou sou copiado
meu óxente é arretado
já vi sulista imitar
seja do sul do nordeste
nos é duma raca só
baino paraibano carioca ou paulista
somos todos brasileiros
nosso deus é só um só
sei que teu sul é muito bom
mais meu nordeste é o melhor
do prumode do pruque
sou taxado de matuto
com orgulho pode crer
mais não troco meu nordeste
por sudeste de ninguem
isso afirmo pra voçe
eu falo aqui acula
adonde vice quinem
aqui como rapadura
com angu bata docé
alimento que faz
e não troco meu nordeste
por sudeste de ninguem
voçe julga o meu sutaque
o meu jeito de falar
eu falo paraibanez
e jamais irei deixar
onde vou sou copiado
meu óxente é arretado
já vi sulista imitar
seja do sul do nordeste
nos é duma raca só
baino paraibano carioca ou paulista
somos todos brasileiros
nosso deus é só um só
sei que teu sul é muito bom
mais meu nordeste é o melhor
domingo, 22 de julho de 2012
Um homem Inteligente Falando das Mulheres
O desrespeito à natureza tem afetado a sobrevivência de vários seres e entre os mais ameaçados está a fêmea da espécie humana.
Tenho
apenas um exemplar em casa,que mantenho com muito zelo e dedicação, mas
na verdade acredito que é ela quem me mantém. Portanto, por uma questão
de auto-sobrevivência, lanço a campanha 'Salvem as Mulheres!'
Tomem
aqui os meus poucos conhecimentos em fisiologia da feminilidade a fim
de que preservemos os raros e preciosos exemplares que ainda restam:
Habitat
Habitat
Mulher
não pode ser mantida em cativeiro. Se for engaiolada, fugirá ou morrerá
por dentro. Não há corrente que as prenda e as que se submetem à jaula
perdem o seu DNA. Você jamais terá a posse de uma mulher, o que vai
prendê-la a você é uma linha frágil que precisa ser reforçada
diariamente.
Alimentação correta
Ninguém vive de vento. Mulher
vive de carinho. Dê-lhe em abundância. É coisa de homem, sim, e se ela
não receber de você vai pegar de outro. Beijos matinais e um 'eu te amo?
no café da manhã as mantém viçosas e perfumadas durante todo o dia. Um
abraço diário é como a água para as samambaias. Não a deixe desidratar.
Pelo menos uma vez por mês é necessário, senão obrigatório, servir um
prato especial.
Flores
Também fazem parte de seu cardápio ?
mulher que não recebe flores murcha rapidamente e adquire traços
masculinos como rispidez e brutalidade.
Respeite a natureza
Você
não suporta TPM? Case-se com um homem. Mulheres menstruam, choram por
nada, gostam de falar do próprio dia, discutir a relação? Se quiser
viver com uma mulher, prepare-se para isso.
Não tolha a sua vaidade
É
da mulher hidratar as mechas, pintar as unhas, passar batom, gastar o
dia inteiro no salão de beleza, colecionar brincos, comprar muitos
sapatos, ficar horas escolhendo roupas no shopping. Entenda tudo isso e
apoie.
Cérebro feminino não é um mito
Por insegurança, a maioria
dos homens prefere não acreditar na existência do cérebro feminino. Por
isso, procuram aquelas que fingem não possuí-lo (e algumas realmente o
aposentaram!). Então, aguente mais essa: mulher sem cérebro não é
mulher, mas um mero objeto de decoração. Se você se cansou de colecionar
bibelôs, tente se relacionar com uma mulher. Algumas vão lhe mostrar
que têm mais massa cinzenta do que você. Não fuja dessas, aprenda com
elas e cresça. E não se preocupe, ao contrário do que ocorre com os
homens, a inteligência não funciona como repelente para as mulheres.
Não faça sombra sobre ela
Se
você quiser ser um grande homem tenha uma mulher ao seu lado, nunca
atrás. Assim, quando ela brilhar, você vai pegar um bronzeado. Porém, se
ela estiver atrás, você vai levar um pé-na-bunda.
Aceite: mulheres
também têm luz própria e não dependem de nós para brilhar. O homem sábio
alimenta os potenciais da parceira e os utiliza para motivar os
próprios. Ele sabe que, preservando e cultivando a mulher, ele estará
salvando a si mesmo.
É, meu amigo, se você acha que mulher é caro demais, vire gay.
Só tem mulher quem pode!
Luiz Fernando Veríssimo
O nada, por Luis Fernando Veríssimo
A frase não é de nenhum físico ou filósofo. É do musical “A noviça rebelde” e seu autor é Richard Rodgers, que no caso, além da música, fez a letra, em vez do seu parceiro Oscar Hammerstein (se pode-se confiar no Google).
Rodgers, sem querer, tocou num ponto muito discutido
entre as pessoas que se interessam pelo Universo e como ele ficou deste
jeito.
Em todas as teorias sobre a criação e a expansão do
Universo sempre se chega a um ponto em que ou você aceita que algo se
criou do nada ou você abandona qualquer especulação cientifica e vai
criar galinhas.
Hoje a própria hipótese de tudo ter começado com
um Big Bang, que você e eu pensávamos que não era mais hipótese e sim
uma verdade indiscutível, está sendo discutida. E o problema é o que
fazer com o nada. O que havia antes do Grande Pum era o nada ou antes —
só para complicar — não havia nem o nada?
Os físicos dizem que o
próprio tempo começou com o estouro inaugural que formou o Universo em
segundos e portanto não faz sentido falar-se em “antes”. Mas se antes
não havia nem antes havia um nada absoluto, do qual, desmentindo o
Richard Rodgers, criou-se o Universo. Houve um tempo em que pensar muito
sobre tudo isso chamava-se “puxar angústia”.
A descoberta do tal
bóson de Higgs foi um feito extraordinário da física. Intuíram a sua
existência, concluíram que ele precisava existir mesmo que nunca o
tivessem visto, foram atrás e o encontraram. Chegou-se mais perto da
chamada teoria unificada do Universo que já era o sonho do Einstein —
agora só restam umas duzentas perguntas para serem respondidas. E o nada
continuará incomodando.
A mãe do Woody Allen, num dos seus filmes
semiautobiograficos, impacienta-se com a preocupação excessiva do
menino com o Universo e pergunta: “O que você tem a ver com o Universo?”
Muita
gente prefere fazer como aquele inglês que passa por um campo de
batalha sem se abaixar ou tomar qualquer outra precaução com as balas
que voam ao seu redor, pois é um estrangeiro e a guerra não lhe diz
respeito.
Não temos como nos precaver contra o que o Universo nos
reserva, mas ele decididamente diz respeito a todos. Até criadores de
galinhas...
sábado, 21 de julho de 2012
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Grupo Tortura Nunca Mais sofre ameaças e tem documentos furtados no Rio
Da Carta Maior:
O grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro teve a sua sede invadida
e documentos relacionados ao projeto clínico de apoio a vítimas e
familiares de vítimas de violações aos direitos humanos, que atende uma
média de 70 pessoas, furtados na quinta-feira (19). Cerca de R$ 1 mil
também foram levados. Na semana passada, o grupo foi vítima de uma
ameaça telefônica, quando uma voz masculina declarou: “estou ligando
para dizer que nós vamos voltar e que isso aí vai acabar”.
Para a presidenta do grupo, Vitória Grabois, há ligação entre as duas
ações. “Eu acho que deve ter ligação com aquelas ameaças que recebemos
na quarta-feira passada (11), vamos esperar o resultado das
investigações da polícia”, disse ela à Carta Maior. Setores da sociedade
civil creditam as ameaças ao protagonismo do grupo na defesa dos
direitos humanos e aos avanços da Comissão da Verdade, instalada pelo
governo federal.
A sede do Grupo Tortura Nunca Mais fica na rua General Polidoro, na
sobreloja do Botafogo Mercado de Flores, em frente ao cemitério São João
Batista, em Botafogo. Segundo Grabois, funcionários do escritório
perceberam o problema por volta das 13 horas, quando chegavam para
trabalhar. “Eles viram as gavetas abertas e que sumiu uma quantia de
dinheiro e documentos do grupo”, afirmou.
Ela disse que, segundo os funcionários, a porta do escritório estava
fechada, mas as chaves reservas guardadas em uma das gavetas haviam
sumido. Grabois também acha pouco provável que os invasores tenham
entrado pela janela. “Se tivessem entrado pela janela, teriam que ter
quebrado um vidro para tirar uma tranca pela parte de dentro. E o vidro
está intacto, o alumínio está intacto, e não tem marcas na janela”,
afirmou ela.
De acordo com o perito Leandro Pinto, que esteve no local na noite de
quinta-feira, não havia indícios de arrombamento no local. “Parece que
foi algo direcionado. Alguém que sabia a rotina do pessoal daqui. Pode
ter acontecido de alguém ter entrado com a chave, é o que está mais
cogitado. A fechadura não tem nenhum indício de rompimento, não tem nada
forçado. Acho que alguém tinha meios como acessar (o local)”, disse o
técnico do Instituto de Criminalística Carlos Éboli. O laudo da perícia
será encaminhado para a 10ᵅ Delegacia Policial, em Botafogo, onde a
ocorrência foi registrada.
Além da loja de flores, o Tortura Nunca Mais divide o prédio de três
andares com um depósito da fundação Santa Cabrini, que é da secretaria
de administração penitenciária do estado. Ainda segundo a presidenta do
grupo, “nenhum outro local foi atingido. Toda vez que acontece algo lá é
sempre com a gente. A floricultura fica aberta noite e dia”, disse,
completando que essa é a terceira vez que o grupo sofre ocorrências
deste tipo.
Campanha
O Grupo Tortura Nunca Mais está em sérias dificuldades financeiras desde
que seus principais parceiros, entidades de direitos humanos europeias,
escassearam as doações devido à crise econômica no velho continente.
Para manter-se ativo o grupo lançou uma campanha de solidariedade para
arrecadar contribuições através de cotas fixas ou esporádicas. Os
depósitos podem ser efetuados na conta 77791-3, na agência 0389 do banco
Itaú, em nome do Tortura Nunca Mais/RJ. Mais informações no sitewww.torturanuncamais-rj.org.br
quarta-feira, 18 de julho de 2012
“Tenho a certeza que a presidência é espionada”
‘É ingenuidade pensar que tudo acabou’, diz Frei Betto sobre espiões da ditadura
Um dos principais nomes da Igreja Católica na luta contra o regime militar e ex-assessor da Presidência diz que tem certeza que o MST está entre os alvos dos militares hoje
Ricardo Galhardo - iG São Paulo |
“É muita ingenuidade nossa pensar que tudo acabou”. A frase é do
escritor Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, um dos principais
nomes da Igreja Católica brasileira na resistência à ditadura militar
(1964-1985). Preso entre 1969 e 1974, acusado de integrar a Ação Popular
ao lado do guerrilheiro Carlos Marighella, Frei Betto está convencido
de que os militares ainda agem nos bastidores do Planalto espionando as
mais altas autoridades do país, inclusive a Presidência da República.
Anivaldo Padilha: Pai de ministro narra como abdicou do filho durante a ditadura militar
Em entrevista ao iG, Frei Betto, que foi assessor
especial da Presidência no primeiro governo Lula, disse ter alertado o
então chefe de gabinete Gilberto Carvalho sobre a possibilidade de
escutas telefônicas no Palácio do Planalto. “Estou convencido de que
isso existe até hoje. Não que eles (militares) estejam me seguindo ou
espionando. Mas tenho certeza que o MST e até a Presidência da
República, sim”, afirmou.
Frei Betto – A minha pergunta é por que o d. Eugênio (morto no último dia 9, aos 91 anos) fez isso para estrangeiros e não fez para brasileiros? Essa é a minha pergunta.
Entenda: O que é Comissão da Verdade?
iG – Existia uma rede de solidariedade na Igreja, uma rota de fuga com conexões no exterior?
FB – Meu trabalho principal foi organizar essa rota
de fuga. Mandei umas 10 pessoas. Em geral, sequestradores do embaixador
americano (Charles Elbrick). Ninguém acredita, a repressão muito menos,
mas a verdade é que eu nunca fui na fronteira. No entanto, eu dominava o
esquema da fronteira porque o (Carlos) Marighella tinha me passado como
funcionava. Só tinha que receber as pessoas em Porto Alegre e dar a
dica. Tinha duas passagens. Uma em Santana do Livramento com Rivera, no
Uruguai, e outra em Passo de Los Libres, na Argentina. Então eu tinha
que dar as coordenadas e passar um telegrama em código para a pessoa que
ia ficar lá esperando e já sabia que alguém ia chegar lá com uma
revista na mão, aquelas coisas. E passava. Alguns voltaram. Outros foram
presos no Uruguai, Mas havia muita solidariedade em igrejas, conventos
etc.
iG – Protestantes e outros grupos religiosos participavam dessa rede de solidariedade?
FB – Muito. O pastor Jamie Wright, por exemplo. O
irmão dele foi assassinado, Paulo Wright, líder da AP (Ação Popular).
Geralmente em Igrejas históricas como a Batista, Luterana,
Presbiteriana, Metodista, judeus. Naquela época quase não existiam as
neopentecostais. E todos eles divididos a exemplo da Igreja Católica.
iG – Como era lidar com os infiltrados?
FB – Era muito difícil. Quando estávamos presos no
Dops, em 1969, havia lá o delegado Alcides Cintra Bueno que era chamado
“delegado do culto” por ser especializado em religiões. Era um homem de
formação católica meio carola, mas torturador. Como ele conhecia muito a
mecânica das Igrejas era o que mais interrogava religiosos. Nós vimos
frades de hábito que eram agentes dele e iam lá dar informação sobre
subversão na Igreja. Além do Lenildo Tabosa que era do Jornal da Tarde,
assistiu ao interrogatório do Frei Fernando e a vida inteira carregou
esta cruz fazendo de tudo para negar. Mas nunca conseguiu convencer,
Fernando viu.
iG – Até descobrirem a existência de infiltrados muitas pessoas caíram?
FB – Sim. Era muito difícil descobrir infiltrados.
Muitos a gente detectou, mas tem gente que colaborou com a ditadura e
vai morrer incólume. A não ser que tenha dado uma mancada. Tem um
seminarista dominicano que a gente não sabe se ele já era colaborador
quando entrou. Depois, na USP, descobriram que ele era agente da
repressão. Ele sumiu do mapa durante uns cinco anos e então recebemos
informação de que ele tinha sido levado para um treinamento na escola da
CIA no Panamá. Quando eu saí da prisão ele reapareceu todo amiguinho
dizendo que estava com saudade e falei para ele, cara a cara, “não sei
se você é ou não é, mas não tenho a menor confiança em você e por favor
não me apareça mais”.
iG – Essa paranoia durou até depois do fim da ditadura, não?
FB – Quando saí da prisão fui morar numa favela em
Vitória e fiquei lá de 1974 a 1979. Já em 1977 comecei a voltar a São
Paulo para trabalhar com educação popular. Quando Fernando Henrique,
Almino Afonso e Plínio de Arruda Sampaio voltaram para o Brasil eles
vieram com a ideia de fundar um partido socialista. Eu, naquele momento,
estava no auge da mobilização pelas CEBs (Comunidades Eclesiais de
Base) e eles me convocaram para uma reunião na casa de um jornalista,
cujo nome não vou citar pois estou subjetivamente convencido que esta
pessoa era da repressão mas não tenho prova. Sei que me estranhou o fato
de ele ser um repórter e ter um padrão de vida tão alto. E tome vinho,
tome vinho, conversamos, eles tentavam me convencer que tinham a forma,
um partido socialista, e eu entrava com a massa, as CEBs. Eu respondi
que ia surgir um partido de baixo para cima, isso em 1978, por intuição,
e depois surgiu o PT em 1980. Marcamos outra conversa, o jornalista
insistiu para que fosse novamente na casa dele e isso acabou num
impasse. Até que um frade daqui, depois de muitos anos, me perguntou se
eu havia participado de uma reunião na casa de fulano, com Fernando
Henrique (Cardoso, ex-presidente) e Plínio (de Arruda Sampaio) etc.
Perguntei como ele sabia daquilo e o frade respondeu que um general
amigo dele ligado ao SNI foi quem contou. Aí caiu a ficha. Tinha muito
esse tipo de coisa. Recentemente peguei no arquivo público nacional todo
meu dossiê. Ele vai até 1992. E tem coisas absolutamente inverossímeis.
iG – O senhor ainda toma algum cuidado especial?
FB - Estou convencido de que isso existe até hoje.
Não que eles (militares) estejam me seguindo ou espionando. Mas tenho
certeza que o MST e até a Presidência da República, sim. Seria muita
ingenuidade nossa achar que o Planalto não é espionado. É o centro, o
coração do poder. Quando trabalhei no Planalto (no primeiro governo
Lula) duas coisas me chamaram atenção. Primeiro que todos os garçons
eram das Forças Armadas. E o garçom é a pessoa que entra no meio da
reunião, que enquanto está servindo o cafezinho fica escutando tudo,
fica amigo das secretárias, tem trânsito livre até na sala do
presidente. Não entra o ministro, mas entra o garçom. E outra coisa foi
num dia em que o Lula estava viajando, subi na sala do Gilberto Carvalho
(então chefe de gabinete da Presidência) e vi um pessoal na sala do
Lula cheio de equipamentos. Perguntei o que era aquilo e o Gilberto
disse que era o pessoal da varredura do Exército. Eu perguntei para o
Gilberto qual a garantia de que eles não tiram um equipamento de
gravação e colocam outro. Gilberto disse que nunca tinha pensado nisso.
iG – Mas seriam os militares?
FB – Sim. Os militares.
iG – Com qual objetivo?
FB – O objetivo é simples. Informação é poder.
iG – O que se sabe é que existe uma grande rede de espionagem em Brasília mas por razões econômicas, chantagem etc.
FB – Os militares neste ponto são mais… é como nos
EUA. A CIA não prende ninguém. Ela só trabalha com informação. Quem
prende é o FBI. É muita ingenuidade nossa pensar que tudo acabou.
iG – Os militares teriam um projeto de retomar o poder?
FB – Não. Eles têm o projeto de não serem surpreendidos e eventualmente até de manipular.
iG – Eles são movidos pelo medo?
FB – Não. É uma questão de inteligência militar mesmo.
Colaborou Gisele Silva, iG São Paulo
terça-feira, 17 de julho de 2012
Cúpula dos Povos denuncia Rio+20
Entre
os dias 13 e 22 de junho, delegações de 186 países reuniram-se na
Cúpula da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento
Sustentável, a Rio+20, com o objetivo de buscar soluções para os
problemas ambientais do mundo. A conclusão de um texto consensual entre
os países acerca de temas como a sustentabilidade foi o principal
trabalho das delegações diplomáticas que durante meses trabalharam no
que foi chamado de Rascunho Zero, a ser entregue aos chefes de Estado.
Oficialmente, a Rio+20 ocorreu entre os
dias 20 e 22 de junho, com a chegada dos chefes de Estado, que se
revezaram em discursos sobre o texto elaborado anteriormente por suas
delegações negociadoras. Digno de nota foi o discurso do presidente de
Cuba, Raúl Castro, que afirmou que “há 20 anos, nesta sala, o líder da
revolução cubana disse que uma espécie muito importante corria o risco
de desaparecer: o homem. O que poderia ser considerado algo alarmista,
hoje é uma realidade irrefutável”.
A grande discussão da Rio+20 girou em
torno do conceito de “Economia Verde” defendido pelos países
imperialistas como novo paradigma para o desenvolvimento sustentável.
Conceito novo de velhas ideias que se resume na privatização e
mercantilização dos recursos naturais.
Da Rio+20 pouca coisa se produziu de
concreto. Os interesses econômicos das grandes potências novamente foram
entrave para a produção de propostas que solucionem os grandes
problemas e males ambientais que assolam o mundo. As metas e o conceito
de Economia Verde não foram definidos, e apenas recomendações gerais
foram aprovadas. Uma verdadeira farsa foi montada nos dez dias de
encontro no luxuoso centro de convenções da Barra da Tijuca.
Fracasso, decepção, desilusão,
frustração, entre outros termos, são usados pelos movimentos sociais que
participaram da Rio+20 ou acompanharam na Cúpula dos Povos o desenrolar
dessa conferência, que teve um gasto de R$ 122 milhões somente com
segurança. Na verdade, na semana do evento o Rio de Janeiro foi tomado
por tropas do Exército que, com fuzis, tanques e todo o seu aparato,
sitiaram a cidade para impedir qualquer tipo de manifestação contrária
aos rumos tomados pela Rio+20.
Um momento importante da Cúpula dos
Povos foi a presença do diretor-executivo do Programa das Nações Unidas
para o Meio Ambiente (Pnuma), Achim Steiner, no debate “Diálogo sobre
Economia Verde”. Ao usar da palavra, foi vaiado por cerca de 300 pessoas
ao defender ideias favoráveis à especulação financeira. O papel do
Pnuma foi inclusive um dos principais temas debatidos na Rio+20. Para as
potências imperialistas interessava transformar o Pnuma num organismo
autônomo com poderes similares aos da Organização Mundial do Comércio
(OMC), tornando-se assim um instrumento de “governança global” acima da
soberania das nações.
O momento marcante da Cúpula ocorreu no
dia 20 de junho, quando mais de 80 mil pessoas se concentraram entre as
avenidas Presidente Vargas e Rio Branco em uma passeata que partiu rumo à
Cinelândia, reunindo movimentos de todos os tipos: de trabalhadores
sem-terra, feministas, estudantes, indígenas, sindicalistas e militantes
de partidos de esquerda.
A Cúpula dos Povos encerrou suas
atividades reafirmando a necessidade de se lutar contras as propostas
capitalistas e convocando a todos para que “voltemos aos nossos
territórios, regiões e países animados para construir as convergências
necessárias e para continuar em luta, resistindo e avançando contra o
sistema capitalista e suas velhas e renovadas formas de reprodução. Em
pé, continuamos em luta!”.
Emerson Lira, Rio de Janeiro
Publicada no Jornal A Verdade de Julho
segunda-feira, 16 de julho de 2012
Frei Tito de Alencar: “Nem tortura nem perseguições evitarão o socialismo”
“Agora
você vai conhecer a sucursal do inferno”. Foi o que ouviu o frei Tito
no dia 17 de fevereiro de 1970, ao ser retirado do Presídio Tiradentes
pelo Capitão Maurício Lopes Lima.
Tito de Alencar Lima, caçula entre 11
irmãos, nasceu em Fortaleza no dia 14 de setembro de 1945. Estudou no
Colégio dos Jesuítas, onde começou a participar da Juventude Estudantil
Católica (JEC). Tornou-se dirigente regional da JEC em 1963, quando se
transferiu para o Recife, residindo num velho casarão da Rua do Leite
juntamente com outros dirigentes dos movimentos da Ação Católica. Em
fevereiro de 1967, ingressou no noviciado dominicano, mudando para São
Paulo – Convento de Perdizes. Cursando Filosofia na USP, Tito atuou no
movimento estudantil. Foi ele quem conseguiu o sítio de Ibiúna, que
pertencia a um amigo, para a realização do 30º Congresso da UNE na
clandestinidade. Todos os 700 participantes foram presos.
O cerco da repressão
Com o fechamento cada vez maior do
regime, parte da esquerda rompeu com o pacifismo do PCB e definiu a
estratégia de enfrentamento armado. O Convento das Perdizes se
transformou em base de apoio à esquerda revolucionária. Abrigava
perseguidos, transportava-os para outros locais, ajudava-os a sairpara o
exterior, transmitia recados para seus familiares. Um grupo de
dominicanos aproximou-se da Ação Libertadora Nacional (ALN) e mantinha
contato direto com seu comandante, Carlos Marighella. Neste grupo,
estavam, entre outros, frei Betto (Carlos Alberto Libânio Christo), frei
Ivo (Yves Lebauspin), frei Giorgio Callegari e frei Tito.
O cerco à ALN começou em outubro de
1969, com uma série de prisões, seguidas, como sempre, de violentas
torturas com o objetivo de encontrar Marighella. Na manhã de 2 de
novembro, um domingo, os freis Fernando e Ivo foram presos no Rio de
Janeiro pela equipe do famigerado Sérgio Paranhos Fleury, logo após
desembarcarem para visitar familiares. Em seguida, conduzidos para o
Centro de Informações da Marinha (Cenimar) e depois para São Paulo (Dops
e DOI-Codi).
Torturados continuamente até a
segunda-feira com pancadas, choques elétricos e pau-de-arara, os frades
não suportaram as sevícias. Confirmaram a existência da base de apoio do
Convento das Perdizes e a forma como mantinham contato com Marighella.
Isto possibilitou a armação da cilada que atraiu o comandante para a
morte (ver A Verdade, nº 12).
Frei Betto explica que não se pode
atribuir unicamente aos seus confrades o êxito da operação repressiva.
Que foi uma sucessão de quedas, informações de elementos infiltrados e
outros fatores que levaram ao lamentável desfecho. Os freis Fernando e
Ivo assumiram sua parcela de responsabilidade, nunca negaram as
informações dadas sob tortura. Acreditavam que a notícia de sua prisão
teria se espalhado e Marighella não telefonaria marcando encontro.
Antônio Flávio Médici de Camargo,
corretor, abrigava Marighella em seu apartamento e, muitas vezes,
transportava-o para os pontos onde tinha tarefas a cumprir. Ele diz que
realmente Marighella tomou conhecimento vagamente da prisão de
dominicanos no Rio, mas não sabia os nomes nem as circunstâncias.
Quando, a seu pedido, Antônio Flávio ligou para a Livraria Duas Cidades,
e frei Fernando confirmou que ele podia comparecer ao encontro no dia 4
de novembro, às 20 horas, Marighella avaliou que estava tudo bem.
Na madrugada de 4 de novembro, a equipe
de Fleury invadiu o Convento das Perdizes e levou para o Dops o prior,
frei Edson Braga; o vice-prior, frei Sérgio Lobo; e os frades Tito de
Alencar e Giorgio Callegari. Os dois primeiros foram ouvidos e liberados
horas depois. Tito e Giorgio ficaram presos e conheceram o sadismo de
Fleury.
Frei Betto encontrava-se no Sul. Foi preso em Porto Alegre na manhã do
dia 9 de novembro. Levado para o Dops-SP; ao ser conduzido para cela no
fundo do prédio, viu nos corredores Fernando, Ivo, Tito e Georgio.
“Apertamo-nos as mãos, emocionados” .
Depois, todos foram transferidos para o
Presídio Tiradentes. Na cela 7, tudo corria muito calmo. Rezas, estudos,
trabalhos artesanais. Mas, define frei Betto, “na prisão, os próximos
minutos assustam mais do que o feixe de anos da sentença de condenação.
(…) o próximo minuto pode ser o início de uma fuga, a lâmina de uma faca
retalhando a carne, a visita inesperada”.
O Calvário de frei Tito
De repente, dois anos depois, é preso o
dono do sítio de Ibiúna, onde se realizara o Congresso da UNE. Tito,
amigo do proprietário, é retirado da cela para a “sucursal do inferno”. É
dele o relato: “Fui levado do Presídio Tiradentes para a Operação
Bandeirantes (Oban – Polícia do Exército) no dia 17 de fevereiro de
1970. Algemaram minhas mãos, jogaram-me no porta-malas da perua. No
caminho, as torturas tiveram início: cutiladas na cabeça e no pescoço, e
apontavam-me seus revólveres”.
As primeiras perguntas foram sobre o
Congresso de Ibiúna. Frei Tito disse que nada tinha a declarar. Os
demônios entraram em ação. A primeira sessão foi só de pancadaria.
Deram-lhe um descanso e mandaram que se preparasse para a “equipe da
pesada”.
Não era mentira. No dia seguinte, em
jejum, veio a sessão infernal com cadeira-do-dragão, choques elétricos
nas mãos, nas orelhas, pau-de-arara, pauladas nos peitos, nas pernas.
Repetição das perguntas, a mesma resposta: não ou silêncio!
Chamaram o chefe do inferno, Capitão
Albernaz (major Benone de Arruda Albernaz, que seria preso por
estelionato em 1984). “Tenho verdadeiro pavor a padre, e para matar
terrorista nada me impede. (…) choques o dia todo, e, a cada ‘não’ que
disser, maior será a descarga elétrica”.
Não era blefe. As perguntas não eram
mais sobre Ibiúna. Nomes de padres metidos com a subversão, onde estava
frei Ratton (autoexilado na Europa), aparelhos. “Não sei”, dizia frei
Tito, e a cada negativa, de fato, uma descarga maior seguida de pontapés
e pauladas nas costas. Partiram para a blasfêmia. Fizeram-no vestir os
paramentos sacerdotais e lhe deram a “hóstia consagrada”, isto é,
choques elétricos na boca.
Breve intervalo e nova sessão. Disseram
que tanta resistência era característica de guerrilheiro. Então ele
estava realmente mentindo e iria sofrer mais. Pontapés nos órgãos
genitais, socos no estômago, cigarros queimando o corpo, “corredor
polonês”. Nada conseguiram. O capitão Albernaz augurou: “…se não falar,
será quebrado por dentro, pois sabemos fazer as coisas sem deixar marcas
visíveis. Se sobreviver, jamais esquecerá o preço da valentia”.
De volta para a cela, frei Tito
raciocinou que não queria mais continuar sofrendo. Os demônios tinham
dito que todos os dominicanos presos iam passar pelo mesmo que ele, pois
o primeiro interrogatório tinha sido muito fraco. Pensou que sua morte
evitaria tudo isso e teria repercussão que talvez fizesse parar as
torturas no Brasil. Conseguiu uma lâmina e cortou a artéria. Mas,
avisados, os repressores socorreram e levaram-no prontamente ao Hospital
Militar. Chamaram a atenção do médico: “doutor, este padre não pode
morrer de jeito nenhum, senão estamos perdidos”.
Enquanto era tratado, os dominicanos
conseguiram enviar mensagem aos seus superiores sobre o que estava
acontecendo com Tito. Estes recorreram às autoridades eclesiásticas. Dom
Paulo Evaristo Arns procurou a Oban, que negou estar com frei Tito
Alencar. Dom Agnelo Rossi falou com o governador Abreu Sodré e
encarregou dom Lucas Moreira Neves de procurar o juiz-auditor militar
Nélson Guimarães, amigo de muitos anos de dom Lucas. O juiz concordou em
visitar Tito no Hospital juntamente com dom Lucas com o compromisso
deste nada divulgar do que visse ou ouvisse. A vida de frei Tito estava
salva.
Voltou ao convívio dos companheiros e
não se acomodou. Fez um relato de tudo o que passou e conseguiu mandar
para fora da prisão. Ainda em 1970, foi publicado em jornais e revistas
da Europa e dos Estados Unidos. Festejado como membro do grupo de heróis
que suporta os horrores do inferno, mas não satisfaz ao diabo, fala
disso com modéstia no citado informe: “…É preciso dizer que o que
ocorreu comigo não é exceção, é regra. Raros os presos políticos
brasileiros que não sofreram tortura. Muitos como Schael Schreiber e
Virgílio Gomes da Silva morreram na sala de torturas. Outros ficaram
surdos, estéreis ou com outros defeitos físicos. (…) Faço esta denúncia e
este apelo a fim de que se evite, amanhã, a triste notícia de mais um
morto sob torturas”.
Em dezembro de 1970, a Vanguarda Popular
Revolucionária (VPR) sequestrou o embaixador da Suíça, Giovanni Enrico
Bucher. Em troca de sua vida, conseguiu a libertação de 70 presos
políticos, incluindo na lista frei Tito Alencar. Na despedida, deixou um
bilhete para o advogado e companheiro de prisão Wanderley Caixe: “…Foi
motivo de grande satisfação ter convivido com você durante 12 meses no
Presídio Tiradentes. Sob o signo deste herói que, infelizmente, virou
nome de cárcere, reuniremos os grandes ideais que o futuro do povo
brasileiro tanto anseia: a construção do socialismo. (…) Contra isso,
nada vence: nem tortura nem perseguições”.
Do Chile, em 20 de fevereiro de 1971,
escreveu ao seu provincial frei Domingos Maia Leite, animado e
esperançoso, embora preocupado. “…Tive uma vida muito movimentada aqui
no Chile, fui eleito para a Comissão de Imprensa, participei do 2º
Encontro Latino-Americano em comemoração à morte de Camilo Torres.
Encontro-me bem do ponto de vista físico e psicológico. (…) A
“infiltração” na Colônia está crescendo. O Fleury esteve há poucos dias
no Chile. Está montando seu esquema por aqui…”. Decidiu ir para a
Europa.
Apesar de não ter sido aceito no Colégio
Pio Brasileiro, sendo acolhido no Convento de Saint Jacques, em Paris,
estava razoavelmente bem na Europa. Em 7 de dezembro de 1973, três meses
após o golpe militar que derrubou Salvador Allende, no Chile, escreveu a
seu colega cearense frei Daniel Ulhôa: “…Aos poucos, vou me acostumando
à solidão europeia… Ainda verei a chama do espírito latino-americano
brilhar bem alto… Apesar de ainda angustiado, estou cheio de esperança…
Nem um só momento de minha vida, lamentei o que fiz… Estou asilado,
banido e longe de minha pátria, mas estou firme e disposto a continuar a
lutar, embora minha resistência psicológica tenha se reduzido bastante
após os 14 meses de prisão. Iniciarei uma psicoterapia para ver se a
recupero o mais breve possível”.
Infelizmente, não recuperou. A maldição
de Albernaz prevaleceu. No Natal de 1973, sua irmã, Nildes, o encontrou
muito deprimido. Tinha visões de Fleury lhe dando ordens, ameaçando
torturar seus parentes. Mudou-se para o campo, procurou trabalhar, mas
não conseguia se concentrar. Perdia os empregos. Evitava conversar com
os companheiros de convento. Isolava-se. Escreveu no marcador de um
livro: “É melhor morrer do que perder a vida”. Descreveu num poema que
vivia “Noites de silêncio”.
No dia 10 de agosto de 1974, seu corpo foi encontrado “balançando entre o
céu e a terra, sob o céu azul do verão francês”. Frei Tito se suicidou
sob a copa de uma árvore. Seu corpo foi sepultado num cemitério
dominicano na França e trazido para o Brasil em março de 1983. Recebido
em São Paulo, após celebração solene na Catedral da Sé, conduzida por
dom Paulo Evaristo Arns, seguiu para sua terra natal, Fortaleza, onde
repousa e recebe muitas visitas e homenagens.
No ano de 2004, fundou-se em Fortaleza o
Instituto de Educação para os Direitos Humanos Frei Tito de Alencar.
Outras entidades têm honrado sua memória. Poetas têm cantado em seu
louvor, entre os quais Zé Vicente, cearense, poeta, cantor e compositor
das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs): “…Ao saber disto não calo/Pois
garanto com certeza/Que se calar este canto/Todos verão com espanto/Que
as pedras clamarão/Tito recebe mensagens/Muitos lhe prestam homenagem/É
o abraço da nação/Viva o mártir brasileiro/Vivam todos os irmãos/Que
passaram no braseiro/De qualquer perseguição…”.
José Levino é historiador e colaborador de A Verdade
Fontes
Batismo de Sangue, frei Betto, 13ª edição, Editora Casa Amarela, São
Paulo, 2004, do qual foram extraídas todas as citações e que serviu de
roteiro para o filme de mesmo nome.
domingo, 15 de julho de 2012
Dom Eugenio Salles: ótima relação com os jornais antes da morte e depois dela
Muito impressionantes os obituários publicados hoje sobre dom Eugenio Salles. Li,
reli e fui conferir de novo o nome do retratado, pois achei que devia
haver algum equívoco. Pensei que se tratasse de algum obituário tardio
do saudoso dom Helder Câmara, este sim um santinho, que deixou suas pegadas missionárias,
como exemplo de caridade cristã. Ele pregava uma igreja voltada para os
pobres, era um exemplo de desprendimento, humildade, absoluta ausência
de qualquer tipo de vaidade ou arrogância, um sacerdote de "pés
descalços", totalmente solidário aos jovens perseguidos pela ditadura e,
por isso mesmo, ele próprio um perseguido e removido, devido às
políticas do clero, do Rio de Janeiro, então centro dos acontecimentos nacionais, para Olinda...
Dom Helder foi chamado de "Arcebispo Vermelho", teve seu acesso à mídia vetado pelo AI-5, foi pessoalmente perseguido pelo ditador Médici e, como contraponto a tantas maldades, dom Helder só havia plantado coisas boas: construiu a Cruzada São Sebastião no Jardim de Alah, fundou a Comissão de Justiça e Paz, fundou o Banco da Providência, que multiplicou e até hoje multiplica bondades aos pobres neste estado. Faz pensar que, não fosse por dom Helder, a posição da Igreja Católica no Rio de Janeiro, onde não tem mais a liderança que tinha, estaria bem pior...
Curiosamente, foi justamente durante o "período dom Eugenio" que a Igreja Católica no Rio de Janeiro e, por consequência, no Brasil - já que o Rio, sabemos, era, pois era mesmo, no tempo passado,
o tambor de ressonância nacional, formava opinião, dava o exemplo - viu
acontecer o início e a precipitação de seu declínio. Pois não vamos
atribuir apenas à competência das igrejas evangélicas, das seitas
pentecostais ou, como querem alguns, à "ingenuidade dos fiéis", a queda
da Igreja Católica nesse ranking...
"Você é 100% responsável pelo que lhe acontece", disse-me outro dia uma adepta da Mandala olhando-me dentro dos olhos. Estava certa. Somos mesmo. Assim foi com a Igreja Católica no Brasil. Com dom Eugenio à frente, fechando os olhos às maldades cometidas durante a ditadura, fechando seus ouvidos e os portões do Sumaré aos familiares dos jovens ditos "subversivos", que lá iam levar suas súplicas, como fez com minha mãe, Zuzu Angel (e isso está documentado), e hoje, supreendentemente, os jornais querem nos fazer acreditar que ocorreu justo o contrário!...
Era público e notório e mais do que sabido naquela época que dom Eugenio
endossava que fossem chamados de "padres vermelhos" (alcunha que,
então, mesclava rejeição e pânico) aqueles religiosos que abrigavam, sob
suas batinas poídas, em suas paróquias suburbanas, os jovens que
tentavam escapar das torturas e das sentenças de morte sumária...
Mas não é isso que os obituários de hoje contam...
Como não contam da mágoa de padres jovens, brilhantes pregadores, que
conseguiam lotar as missas de suas paróquias com legiões de fiéis,
multidões de católicos, jovens padres que ganhavam visibilidade,
convites, apareciam na imprensa, somavam admirações e logo eram
removidos por dom Eugenio para paróquias bem distantes,
como se fossem ironicamente punidos, em vez de serem premiados, pelo
belo trabalho que realizavam para a Igreja Católica. Os bons pregadores eram afastados...
Alguns desses padres, que poderiam ter feito belíssimas carreiras no
clero, foram podados na origem. Uns caíram no mais completo
esquecimento. Outros entraram em depressão. Soube de alguns que
abandonaram a batina. Não era de boa política sobressair-se na "era dom
Eugenio Salles"...
Duplo castigo: para os padres e para os paroquianos, que assim iam
acumulando decepções com sua religião. Outro fator que contribuiu para o
declínio católico no Rio nesse período foi a série de
proibições tolas, que, em vez de inspirar bondade, em vez de agregar
seguidores, só motivaram afastamentos...
Nas cerimônias de casamento, foram proibidas músicas classificadas como "não sacras", e sabe-se lá por quais critérios. Então, por exemplo, uma jovem chamada Luciana não podia mais entrar na igreja ao som da singela cantiga "Luciana", de Edmundo Souto e Paulinho Tapajós, como esteve tão em moda. Caprichos, arbitrariedades, tolices, que só afastavam os católicos de sua igreja...
Batizados só podiam ser coletivos. Padres só eram autorizados a
celebrar batizados e casamentos na igreja, não mais em residências,
sítios, casas de festas. O que antes era corriqueiro passou a ser
proibido. Então, tornou-se usual acontecerem casamentos de católicos
oficiados por pastores protestantes. Logo, o oficiante mais procurado,
era o pastor Jonas Rezende, pai da atriz Lidia Brondi, lembram? Que aliás prega lindamente. A sociedade católica do Rio de Janeiro acostumou-se a escutar as belíssimas preleções do pastor Jonas, seus inspiradíssimos sermões matrimoniais...
De Hildegard Angel
Tudo passou a ser difícil na Igreja Católica no Rio de Janeiro.
Conseguir marcar uma missa de sétimo dia, só com pistolão. Uma extrema
unção em casa, só gente muito bem relacionada. Vários pátios paroquiais
laterais às igrejas, onde os fiéis antes confraternizavam, onde
aconteciam as quermesses, os bazares, as reuniões pós-missas, antigos
centros de convívio, foram entregues à especulação imobiliária. Viraram
edifícios, shopping centers. Antigas igrejas foram passadas nos cobres.
Instalaram-se em andares de prédio. Outras se tornaram construções
espremidas entre um edifício e outro, como aconteceu com a Nossa Senhora da Paz. Igrejas sem horário pra abrir nem pra fechar, "por questões de segurança"...
A Igreja Católica, no Rio, sob a égide de dom Eugenio Salles,
foi cada vez mais se distanciando dos pobres e se aproximando,
cultivando, cortejando as estruturas do poder. Isso não poderia acabar
bem. Acabou no menor percentual de católicos no país: 45,8%...
Não há, neste texto, qualquer intenção de ressentimento. Apenas o desejo jornalístico da correção histórica.
Dom Eugenio
padeceu na terra de um mal de saúde. Os pecados, já pagou por eles. Em
seus últimos tempos de vida, a lucidez e a ausência dela alternaram-se.
Atenciosos, o arcebispo dom Orani Tempesta, assim como o cardeal-arcebispo anterior, dom Eusébio, mantinham o antigo cardeal do Rio, dom Eugenio, vivendo na residência do Sumaré,
com todos os cuidados, a família, a estrutura proporcionada pela
Arquidiocese, a que não mais teria direito, por já estar afastado do
cargo...
Dom Eugenio teve, em vida, uma grande habilidade:
manter ótimas relações com os grandes jornais, para os quais contribuiu
regularmente com artigos. Ótimas relações com os jornais, os jornalistas
e os donos dos jornais antes da morte. E, como vimos pelo que foi
publicado no dia de hoje, também após ela. E são os jornais que legam os
registros que escrevem a História...
Os franceses, o sexo e o casamento segundo Montesquieu
de Paulo Nogueira
Em 1721, o célebre político, filósofo e escritor francês barão de Montesquieu publicou um romance epistolar chamado Cartas Persas.
É uma troca de cartas entre personagens persas que viajam pelo
Ocidente. Numa dessas cartas, Montesquieu traça um retrato primoroso do
amor à francesa, em contraposição aos costumes muçulmanos. Ao ler o
livro, Camila Nogueira, minha caçula, teve a idéia de selecionar frases
de Montesquieu que fazem rir e pensar, e que têm uma atualidade
extraordinária. Clap, clap, clap para Montesquieu, e para Camila.
Os franceses quase nunca falam de suas mulheres; é que receiam
tratar delas diante de homens que podem conhecê-las melhor do que eles
próprios.
Há aqui alguns homens muito infelizes, que ninguém
consola: são os maridos ciumentos. Há pessoas a quem todos detestam: os
maridos ciumentos. E, finalmente, há indivíduos que todos desprezam: os
maridos ciumentos. Por isso mesmo, não há país em que eles sejam em
números tão pequenos quanto a França.
A tranquilidade dos maridos não se funda, porém, numa
confiança que acaso tenham na virtude de suas mulheres, mas, ao
contrário, na má opinião que formam a seu respeito. Na França, os
maridos aceitam sua má sorte de bom grado, e consideram as infidelidades
como uma sina inescapável. Um marido que pretendesse ser o único a
possuir sua mulher seria tido como um perturbador da alegria pública,
como um insensato que almejasse gozar da luz do sol em detrimento dos
outros homens.
Na França, um marido que ama a esposa é alguém que não tem mérito
o suficiente para conseguir o amor de outra mulher; que abusa do
império da lei para suprir sua própria falta de encantos; que se aferra a
suas vantagens pessoais prejudicando a sociedade inteira; que efetua
uma apropriação indébita do que só lhe foi confiado em depósito, e usa
de todas as forças para destruir a convenção tácita que assegura a
felicidade dos dois sexos. O título de marido de mulher bonita, que na
Ásia ocultamos com tanto cuidado, aqui se exibe sem maior preocupação:
cada um se sente capaz de fazer as incursões que quiser em território
alheio.
Não se desaprova na Europa o homem que costuma tolerar as infidelidades de sua mulher; ao contrário, louva-se sua prudência.
Não é que não haja damas virtuosas na França. Há. Mas são, todas, tão feias que só um santo não odiaria a virtude delas.
Quando os franceses prometem a uma mulher amá-la sempre, supõem
que ela também lhes esteja prometendo sempre merecer ser amada; se ela
falta à palavra, não se sentem obrigados a respeitar a sua.
sexta-feira, 13 de julho de 2012
quinta-feira, 12 de julho de 2012
terça-feira, 10 de julho de 2012
quinta-feira, 5 de julho de 2012
RIO+20: Falência da diplomacia, fraqueza da democracia
'A
UE é a única a inventar a maneira de se unir mantendo o respeito às
diferenças e que tem aprendido a superar seus egoísmos nacionais. Cabe a
ela tomar a palavra', escreve Calame.
de Redação Carta Capital
Por Pierre Calame
Deixamos o Rio de Janeiro com o terrível mal estar de um planeta ferido.
Foram mobilizadas dezenas de milhares de pessoas e quase uma centena de
chefes de Estado para adotar um texto de 50 páginas do tipo “pegar ou
largar”, que balbucia engajamentos já assumidos há muito tempo, porém
não mantidos! Em todos os sentidos do termo, a missa foi rezada. Mas
está fora de questão assumir nossas interdependências! Não pode haver
direito de fiscalização de um Estado pelo outro! Cada um é dono de seu
próprio nariz! E a participação da sociedade civil? Depois de meses
tentando, sem sucesso, inserir propostas no texto oficial, o “stakeholder forum”, que representa diversos atores atuantes na ONU, denunciou publicamente o baile de máscaras.
A União Europeia, pressionada a aceitar o texto apresentado pelo
ministro brasileiro das Relações Exteriores, se rendeu após disparar
alguns tiros ao ar por orgulho. Rendeu-se, sim, mas atenção: permaneceu
unida! Consenso. Todos estavam de acordo.
Os especialistas em negociação internacional introduziram no texto
alguns avanços: algumas palavras suplementares sobre a governança
integrada dos oceanos, um fórum de atores que se transformará em um
fórum de alto nível, algumas promessas vagas sobre o reforço do PNUMA
(Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente), o engajamento para
elaborar objetivos relacionados ao desenvolvimento. O negociador
brasileiro compartilhou a seguinte confidência comovente: nós recuamos
menos do que temíamos recuar! Ou seja, não se trata mais de um
engajamento para a grande transição. Estamos em uma Batalha de Verdun.
A declaração multiplica os chamados às coletividades territoriais.
Excelente! Mas, neste contexto, foi mais uma constatação de falência: os
Estados, incapazes de conduzir uma mudança urgente, devolvem a chave da
cidade planetária. A Rio+20 foi a comprovação da falência de uma ordem
mundial intergovernamental reduzida à diplomacia: a presidenta
brasileira orientou seu ministro das Relações Exteriores a conduzir as
negociações com outros ministros das Relações Exteriores. Não eram
ministros de assuntos mundiais ou de assuntos comuns planetários! Somos
“nós” enfrentando o “resto do mundo”. O planeta não é uma questão a ser
discutida, mas um campo de batalha de vontades de poder.
Será, então, que os “interesses nacionais” existem de fato em
essência ou não seriam eles construídos em função desta instituição
chamada Estado nação? Seriam eles diferentes em relação a todos os
outros? Evidentemente não. A própria maneira de organizar o diálogo
internacional predetermina o resultado. Não existe, em nível mundial,
nenhum organismo encarregado de “falar do interesse geral” como é o caso
da Comissão Europeia, que fala pela Europa. O projeto de declaração foi
apenas o fruto de uma síntese de propostas nacionais. Resultado: a
produção de uma reafirmação, página após página, da soberania nacional e
um catálogo de boas intenções, cuja prática dependerá de engajamentos
voluntários.
Outro modo de negociação, por exemplo, por meio de uma assembleia
mundial de cidadãos a representar diferentes forças sociais e
encarregada de elaborar propostas sujeitas à deliberação dos Estados,
traria um resultado muito diferente. A contradição entre o nível de
nossas interdependências e o modo de gestão baseado no mercado se tornou
explosiva. Em vinte anos, os equilíbrios dos quais nossa sobrevivência
depende não pararam de se degradar. Nossa governança mundial se tornou o
mais grave de todos os riscos para a sobrevivência da humanidade.
Ocorreu no Rio de Janeiro uma Munique ecológica mundial: os chefes de
Estado retornaram às suas casas, aliviados pelo consenso encontrado. Mas
quantos ainda terão que resmungar “que imbecis”, como fez Daladier ao voltar do Acordo de Munique feito com Hitler, quando foi aclamado pelo povo, diante do resultado obtido?*
E agora? Será preciso tomar iniciativas que desagradam. Avançar com
aqueles que quiserem avançar. Abandonar a ideia de que um comércio
mundial livre e sem condicionantes sociais e ambientais vai garantir a
paz. Se alguma paz houver, será como aquela de Munique, uma paz que
prepara a futura guerra. Comecemos por admitir que todos os atores,
sejam públicos ou privados, devem prestar contas para a comunidade
mundial do impacto de seus atos, uma vez que este impacto ultrapassa as
fronteiras nacionais, e construamos, sobre esse princípio, um direito
internacional. Coloquemos em prática um comércio internacional baseado
em cadeias de produção e consumo sustentáveis e iniciemos um debate
internacional sobre o novo modelo de economia. A União Europeia,
apresentada atualmente como o corpo doente da globalização, é a única
que vem inventando a maneira de se unir mantendo o respeito às
diferenças e que tem aprendido a superar de modo pacífico seus egoísmos
nacionais. Cabe a ela tomar a palavra e, feita a reflexão, recusar uma
Munique ecológica mundial. E a França se orgulhará de desempenhar um
papel de protagonista neste processo.
Pierre Calame é presidente da Fundação Charles Mayer para o Progresso do Homem, com sede na França.
domingo, 1 de julho de 2012
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