domingo, 29 de abril de 2012
quinta-feira, 26 de abril de 2012
Grandes Momentos Do Jornalismo: O que um jornalista no Banheiro mandou dizer ao dono do jornal
Paulo Nogueira
Lorde
Beaverbrook foi o maior barão da imprensa da Inglaterra na primeira
metade do século 20. Foi a era de ouro dos jornais – que não enfrentavam
ainda a concorrência da televisão e do rádio. Nascido no Canadá, ele se
mudou para Londres em 1904. Era jovem, mas já fizera fortuna no ramo
dos seguros por conta de sua extraordinária capacidade de gerar
dinheiro.
Depois
da Primeira Guerra Mundial, Beaverbrook começou a construir uma rede
de jornais que se mostraria extraordinariamente influente entre os
britânicos. Fortuna ele já tinha antes de investir em imprensa. Mas ele
queria mais: reputação. Os jornais lhe dariam exatamente isso:
prestígio. Títulos de Beaverbrooks como Evening Standard e Daily Express
comandavam a agenda política e econômica inglesa. Em 1950, o Daily
Express era o jornal mais vendido do mundo, com uma circulação de quase 4
milhões de exemplares.
Excepcional
alpinista político, Beaverbrooks acabaria sendo uma das pessoas mais
próximas do primeiro ministro Winston Churchill. Acompanhou Churchill
aos Estados Unidos em algumas visitas ao presidente americano Franklin
Roosevelt, de quem acabaria também se tornando amigo pessoal. Como quase
todo barão da imprensa, Beaverbrook tinha sua lista negra – desafetos
que não deveriam receber nenhuma cobertura de seus jornais. Um dos
listados era o escritor e cineasta Noel Coward. Numa cena de um filme em
que um um destróier inglês afundava, Coward colocou um exemplar do
Daily Express flutuando nas águas do mar.
Beaverbrook,
nos anos 1930, quase derrubou com seus jornais o líder do Partido
Conservador Stephen Baldwin. Baldwin defendia o protecionismo econômico,
e Beaverbrook queria para a Inglaterra um regime de livre comércio na
plenitude.No fragor do conflito, Baldwin pronunciaria um discurso que se
tornaria célebre. Segundo alguns, o texto era de autoria do escritor
Rudyard Kipling, primo de Baldwin. “Alguns jornais não são jornais no
sentido estrito da palavra, mas motores de divulgação de mutantes
idéias, caprichos, gostos, simpatias e antipatias de seus
proprietários”, disse Baldwin. “O que esses donos estão buscando não é o
poder, mas o poder sem responsabilidade, algo que ao longo da história
foi prerrogativa das prostitutas.” Com este discurso épico, Baldwin
calou Beaverbrooks, e se manteve na liderança dos conservadores.
Beaverbrooks,
que se fazia chamar de “Senhor”, era um chefe absolutamente
controlador. Num único dia, ele enviou 147 ordens a seus editores. Seus
assistentes recebiam ordens de passar instruções aos editores mesmo
quando estes estavam no banheiro.
Numa
ocasião, um assistente de Beaverbrooks bateu na porta do banheiro que
um editor estava usando para avisar que tinha um recado do dono. Veio
uma resposta que entraria na história do jornalismo inglês como um dos
grandes momentos vividos nas redações: “Diga ao Senhor que estou
cagando, e só consigo lidar com uma merda por vez.”
Clap, clap, clap. Aplausos. De pé.
No Diário do Centro do Mundo
terça-feira, 24 de abril de 2012
O cinema mais antigo ainda em funciona no país
Olympia
de Belém é considerado o cinema mais antigo em funcionamento no País
desde que se considere que sempre esteve no mesmo lugar e não parou as
suas atividades por muito tempo. Mesmo assim, a sala foi fechada no dia
16 de fevereiro de 2006 pelo seu atual proprietário, Luis Severiano
Ribeiro Neto. A alegação foi de que dava prejuízo. Mas a queda de
freqüência a cinema nos dois últimos anos não é um fenômeno isolado e
sim internacional. E não é inédito nem se pode dizer irreversível. São
muitas as crises que atingiram as salas exibidoras ao longo dos anos,
como a do inicio da década de 50 quando a televisão ameaçou a exibição
cinematográfica de tal forma que foi preciso apelar para recursos
técnicos como o cinemascope, o vista-vision, o cinerama, uma série de
processos que aumentaram o tamanho da imagem e com isso passaram a
concorrer com o novo meio de expressão.
O
Olímpia foi fundado no dia 24 de abril de 1912 pelos empresários Carlos
Teixeira e Antonio Martins, donos do Grande Hotel (onde hoje está o
Hilton Hotel) e do Palace Theatre (na mesma quadra). Eles queriam fazer
do cinema um ponto “chique” para atrair os freqüentadores do Theatro da
Paz e, obviamente, os hóspedes de seu hotel.
Sala de espera do Olympia em 1912
Uma das atrações foi a colocação da tela logo na entrada, com os espectadores passando pelas laterais.
No fim dos anos 30 a empresa Teixeira & Martins não suportou os encargos financeiros e vendeu o cinema, e outros que controlava, ao banqueiro Adalberto Marques. Criou-se a “Cia. Cinematográfica Paraense Ltda”. Uma firma de vida curta. Em 1946 Marques vendeu todos esses cinemas ao exibidor cearense Luís Severiano Ribeiro, já dono de salas em diversos Estados.
Em
1953 os estudantes de Belém encabeçaram piquete para a reforma do
Olimpia, bastante deteriorado na época. Severiano Ribeiro respondeu
comprando um terreno na Av, Nazaré e anunciando que ali construiria o
Cinema S. Luís “o maior do norte do Brasil”. Mas não só o novo cinema
ficou nisso como o Olimpia permaneceu maltratado. Só em 1960, depois de
inaugurado nove meses antes o cinema Palácio, é que recebeu os
requisitos de conforto como poltronas estofadas e ar condicionado.
No
correr dos anos pouco se fez pelo prédio e suas instalações. Durante o
tempo em que gerenciou a empresa Ribeiro, o sr. Adalberto Augusto
Affonso foi incansável pedindo recursos para mantê-lo digno de uma
tradição. Hoje o cinema atravessava uma fase sem brilho, embora ainda
atraísse os fãs. Depois da medida extrema de Ribeiro Neto, o prefeito
Duciomar Costa resolveu atender aos apelos da sociedade que compareceu
em massa à sessão de despedida, assinando um contrato com o proprietário
da casa para mantê-la, por três anos, como espaço cultural.
sexta-feira, 20 de abril de 2012
Tiradentes – a rebelião contra a opressão e a espoliação estrangeira do Brasil
É
um sábado, 21 de abril de 1792. Cidade de São Sebastião do Rio de
Janeiro. Faz sol, o céu está limpo. Uma multidão acompanha ansiosa a
cena trágica: uma forca, um homem com uma corda em volta do pescoço.
Muitos soldados cercam o patíbulo para que ninguém se aproxime. Um padre
lembra que não se deve trair a rainha, nem em pensamento. O homem olha
para o povo e ergue os olhos para o céu azul, reiteradas vezes, enquanto
aguarda o momento fatal. De repente, o povo silencia. O homem é
empurrado para o espaço. Os tambores rufam. A platéia solta um grito
terrível. Tudo está consumado. Um corpo sem vida balança no ar.
Tudo começara três anos antes, quando um
grupo de homens de Vila Rica, Minas Gerais, resolveu rebelar- se contra
a opressão da Coroa Portuguesa. Nessa época, o principal produto que os
invasores levavam do Brasil era o ouro, abundante nas terras mineiras.
Em torno do ouro formou-se uma sociedade composta por mineradores,
latifundiários, escravos negros, brancos pobres e um setor médio
integrado por pequenos comerciantes, pequenos mineradores e funcionários
do governo.
Os mineradores tinham de pagar um quinto
do ouro extraído, à Coroa. A partir de 1750, com a queda da produção,
foi estabelecida uma quota fixa de imposto, de cem arrobas de ouro,
aproximadamente 1.500 kg. Quando a quota não era atingida, o governo da
Província mandava arrecadar o que faltasse, de toda a população. Todos
pagavam, fossem ou não mineradores, ricos ou pobres. A insatisfação era
grande e generalizada.
Na Capitania das Minas Gerais, enquanto
poucos enriqueciam, os escravos trabalhavam em condições subumanas para
extrair o ouro e “milhares de homens viviam na miséria, passando fome,
vagando sem destino pelos arraiais” (Laura de Mello e Souza, em Os
Desclassificados do Ouro). Até os grandes mineradores viviam revoltados
porque, além do imposto sobre o ouro, tinham de comprar a Portugal, que
por sua vez importava da Inglaterra, tudo de que precisavam. Em 1785, a
rainha de Portugal proibiu o funcionamento das indústrias brasileiras
que, embora engatinhando, já forneciam tecidos, produtos de couro,
ferramentas, moendas e armas brancas, a preço muito menor do que os
ingleses. Com o acordo imposto pela Inglaterra a Portugal, os colonos
passaram a gastar muito mais para adquirir tais produtos.
A revolta transforma-se em movimento
No final de 1788, os homens mais ricos, desesperados com o endividamento e informados de que o governo iniciaria a derrama cobrança do imposto em ouro em meados do ano seguinte, começam a falar em revolta. A população pobre também estava preocupada, pois sabia que a cobrança também recairia sobre ela. Aproveitando esse clima, um grupo de pessoas do setor médio poetas, padres, militares e mineradores começam a dar corpo a um Movimento pela Independência. Eles eram influenciados pelas idéias procedentes da França e dos Estados Unidos da América do Norte. Este havia proclamado sua independência da Inglaterra, em 4 de julho de 1776, após obter vitória na guerra civil; na França, estava em andamento a Revolução Burguesa que espalhava pelo mundo as idéias de Liberdade, Igualdade e Fraternidade. Do grupo de conjurados mineiros, participava um homem do povo que viria a ser nosso herói.
Quem era Tiradentes
Joaquim José da Silva Xavier nasceu em 1746, próximo a Vila Rica. Aos onze anos ficou órfão de pai e mãe e foi morar com seu padrinho que lhe ensinou a profissão de dentista, origem do seu apelido. Aos 20 anos trabalhou como tropeiro, transportando mercadorias numa tropa de burros entre Minas Gerais e o Rio de Janeiro. Numa dessas viagens, defendeu um escravo que estava sendo castigado, o que lhe valeu um processo. Para pagar as multas e as custas processuais, teve de vender sua tropa de burros. Trabalhou como minerador e, aos 30 anos de idade, sentou praça na 6a Companhia de Dragões, posteriormente Regimento de Cavalaria de Vila Rica. Tornou-se alferes, posto equivalente hoje a 2o tenente.
Insatisfeito por nunca ter sido
promovido, apesar de ser dedicado e bravo, pediu licença do Regimento em
1787, aos 41 anos de idade, para tentar implantar projetos de
canalização de água no Rio de Janeiro. Ele não era engenheiro, mas tinha
vocação e muita capacidade prática, já tendo à época dirigido a
construção de estradas. Entretanto, não conseguiu apoio financeiro para
seus projetos.
Um desses contatos, em busca de apoio,
mudou o rumo da vida de Tiradentes. Foi o seu encontro com José Álvares
Maciel, filho de grande comerciante e fazendeiro de Vila Rica. Em vez de
lhe emprestar dinheiro, Álvares Maciel propôs que ele participasse do
movimento para libertar as Minas Gerais. Não era difícil medir a
disposição de Tiradentes para a tarefa, pois nas suas viagens como
tropeiro, militar e nessa última em busca de nova profissão, por onde
passava ele falava contra a dominação portuguesa. Entusiasmado,
Tiradentes volta para Vila Rica e integra-se ao grupo que está
preparando a conjuração.
Liberdade, ainda que tarde – o que queriam os revoltosos
Proclamar a Independência e constituir uma República; desenvolver a agricultura, a pecuária, a indústria e a mineração; implantar uma Universidade; anular as dívidas com a Coroa Portuguesa. Esperavam que a vitória repercutisse no Rio de Janeiro, provocando um levante popular, mas estavam preparados para defender a sua República, mesmo sem a adesão de outros lugares. Tiradentes foi o único a defender a libertação dos escravos
Um exemplo de bravura e dignidade
A conjuração mineira tinha participantes oportunistas cuja única preocupação era se livrar das dívidas. Um deles, Joaquim Silvério dos Reis, resolveu denunciar o movimento, em troca do perdão de suas dívidas. O governador suspendeu a derrama e ordenou a prisão dos conjurados. O processo durou três anos. Todos foram condenados à forca, mas tiveram suas penas reduzidas por ordem da rainha Manoel Tiradentes, de Portugal. Apenas Lisboa justamente o homem do povo, teve confirmada a sentença de morte.
É importante refletir sobre o
comportamento de Tiradentes na prisão e nos interrogatórios a que foi
submetido, para conhecer a sua têmpera revolucionária. Ele foi apontado
pelos outros como o a g i t a d o r, o r e s p o n s á v e l p e l o
movimento. Alguns zombaram dele, classificando-o de louco, de rústico.
Até o famoso poeta Tomás Antônio Gonzaga escreveu um verso na prisão, em
que dizia: “Ama a gente assisada/ a honra, a vida, o cabedal tão pouco/
que ponha uma ação destas/ nas mãos de um pobre sem respeito e louco?”.
Todos procurando agradar às autoridades, para livrarem-se da m o r t e .
Ti r a d e n t e s t e v e u m comportamento exemplar: não entregou
ninguém, assumiu toda a responsabilidade pela revolta, não devolveu as
zombarias. Uma dignidade extraordinária.
A sentença que o condenou à forca foi
cruel. Além da morte, determinou que “sua cabeça fosse cortada, levada a
Vila Rica e pregada em lugar público até que o tempo a consumisse. O
corpo, dividido em quatro partes a serem pregadas em postes pelos
caminhos onde ele pregara a Revolução. Declarou infames os seus filhos e
netos. Determinou o confisco dos seus bens; que a casa fosse destruída e
no lugar fosse jogado muito sal, para que nada mais se edificasse”. Ao
ouvir a confirmação de tal sentença, afirmou serenamente Tiradentes: “Se
dez vidas tivesse, as dez vidas eu daria”.
As classes dominantes queriam atemorizar
o povo, para que nunca se revoltasse. Pelo contrário, ficou o exemplo
de dignidade, de bravura, da capacidade de dar a vida por uma causa
justa, para que todos tenham vida e liberdade.
Tiradentes vive na luta
A burguesia apropriou-se indevidamente
do nome de Tiradentes, elegendo-o, inclusive, como patrono da Polícia
Militar, a mesma que continua sendo instrumento das classes dominantes
para reprimir os sem-terra, os sem-teto, todos aqueles que lutam por
seus direitos e se revoltam contra a opressão. É mais uma traição a
Tiradentes, um herói do povo brasileiro. A Independência, pela qual ele
deu a vida, ainda não foi conquistada. A derrama que motivou a
Conjuração Mineira hoje acontece através da cobrança da dívida externa,
que passou de US$ 148 bilhões em 1994 para US$ 235 bilhões em 1999. No
ano passado (1998), 64% do orçamento da União foram destinados ao
pagamento de amortizações, juros e serviços das dívidas externa e
interna. A proibição do funcionamento das indústrias brasileiras
acontece em nossos dias através do favorecimento aos grandes monopólios
capitalistas estrangeiros com isenção de impostos e outros benefícios;
com a entrega do patrimônio público ao grande capital estrangeiro e
nacional (privatizações), da liberação de taxas sobre produtos
importados. Tudo isso gera o fechamento das pequenas e médias indústrias
nacionais, provocando desemprego, fome e miséria. Como na época de
Tiradentes, o Brasil continua sendo espoliado pelo capital estrangeiro e
os trabalhadores vivem na miséria, desempregados e vendo seus direitos
desrespeitados. Por isso mesmo, vemos crescer em todas as partes deste
país o mesmo sentimento de revolta que animou os revolucionários de
Minas Gerais.
Vila Rica, hoje, é o Brasil inteiro. Que
todo o povo se levante num movimento de libertação e derrube as classes
dominantes e seus “Joaquim Silvério dos Reis” que governam o Brasil,
construindo uma nova sociedade onde haja terra, trabalho e vida digna
para todos. Tiradentes, nosso herói, estará iluminando esse caminho,
juntamente com tantos bravos que tombaram na luta através da nossa
História. A liberdade nunca é tardia.
“Liberdade, essa palavra
Que o sonho humano alimenta
Que não há ninguém que explique
E ninguém que não entenda”
(Cecília Meireles)
Luiz Alves
(Publicado no Jornal A Verdade, nº 6 )
(Publicado no Jornal A Verdade, nº 6 )
quinta-feira, 19 de abril de 2012
terça-feira, 17 de abril de 2012
O massacre de Eldorado dos Carajás: se calarmos, as pedras gritarão!
hare
Joana está perto de completar 15 anos de
idade e, como todas as adolescentes, pensa numa bela festa. Mas sabe
que seu olhar refletirá um misto de alegria e tristeza, porque ela sabe
da história. Pensa que seu pai poderia ter sido um dos 21 mortos naquela
fatídica data. 17 de abril de 1996. Ela nasceu no ano seguinte, quando
as lembranças ainda eram muito fortes e lhe marcaram desde a gestação.
Foi no começo de março de 1996 que 1.500
famílias ocuparam a fazenda Macaxeira, situada em Eldorado dos Carajás,
Pará. O camponês não pode viver sem terra para trabalhar, para produzir
o alimento necessário ao sustento da família. A fazenda ocupada era
utilizada para pasto, 40 mil hectares destinados ao lucro de um só
proprietário, o Paulo Pinheiro. Mas o Incra considerava a terra como
produtiva, portanto não poderia desapropriá-la. Diante disso, o MST
programou uma caminhada até Belém para as famílias convencerem o Incra
de que elas tinham razão. Mil e cem camponeses puseram o pé na estrada, a
rodovia PA-50, no dia 16 de abril.
Governava o Estado do Pará o Sr. Almir
Gabriel (PSDB). Seu Secretário de Segurança, Paulo Sette Câmara, mandou a
Polícia Militar desobstruir a estrada, em nome do direito de ir e vir.
Direito de quem? Dos veículos, conduzindo mercadorias, madeiras e
minérios roubados da Amazônia? E as pessoas não têm esse direito
constitucional?
Não houve diálogo. Os policiais já
chegaram lançando bombas de gás lacrimogêneo. Não houve confronto. O que
poderiam ferramentas de trabalho contra armas de fogo? Houve, sim,
resistência pacífica. Os sem-terra não aceitaram parar a caminhada. O
coronel Mário Pantoja de Oliveira deu a ordem de fogo! As balas choveram
sobre os trabalhadores. Dezenove morreram no local, mais de 70 ficaram
feridos, dos quais dois faleceram posteriormente. Mas não foram apenas
as balas. A Perícia Judicial atestou que dez camponeses foram executados
e sete deles apresentavam ferimentos de foices e facas. Além de matar,
os policiais tentaram lançar a culpa nos próprios sem-terra.
Um Processo Inglório
A repercussão do massacre foi enorme,
tanto no país como no exterior. O então Presidente da República,
Fernando Henrique Cardoso, do mesmo partido do governador do Pará, pediu
a prisão imediata dos responsáveis. Mas ninguém foi preso. Para não ser
injusto, registremos que o coronel Pantoja passou 30 dias em prisão
domiciliar.
Só isso, apesar de José Gregori, chefe
de gabinete do Ministro da Justiça, Nélson Jobim, ter dito em alto e bom
som: “ O réu desse crime é a polícia, que teve um comandante que agiu
de forma inadequada”. Ele falou após assistir ao vídeo do massacre, pois
foi tudo filmado. O coronel Mário Pantoja disse que cumpriu ordem do
Secretário de Segurança e este confirmou que havia autorizado a polícia a
“usar os meios necessários, inclusive a atirar”. Ricardo Marcondes de
Oliveira, outro fazendeiro da região informou que dias antes contribuíra
com uma coleta organizada pelo dono da fazenda Macaxeira e sabia que se
destinava ao dito coronel da PM. Propina. Mesmo assim nenhum fazendeiro
foi indiciado. Nem o governador e seu secretário, que assumiu ter
autorizado o massacre. Sintomático!
Indiciados foram os 155 PMs que
participaram da operação. O Ministério Público denunciou-os por
homicídio, mas o inquérito foi mal feito. Não existe no direito penal
brasileiro punição coletiva. Precisaria que as armas tivessem sido
periciadas para identificar de onde partiram os tiros que ocasionaram as
mortes. O próprio Procurador Geral da República, Geraldo Brindeiro,
considerou o inquérito repleto de imperfeições técnicas e determinou que
a Polícia Federal o refizesse, mas não adiantou muito.
O juiz de Primeira instância convocou
júri popular, mas só dois policiais foram condenados: o coronel Mário
Pantoja, a 228 anos de prisão, e o major José Mário Pereira, a 158 anos.
Mas não cumpriram nem um. Tiveram o direito de recorrer em liberdade e
vêm recorrendo indefinidamente. Quinze anos depois, o processo está
parado, aguardando julgamento de Agravo de Instrumento no Supremo
Tribunal Federal (STF). O promotor Marco Aurélio Nascimento, que atuou
no caso, comenta: “As decisões de primeira instância não são cumpridas, e
as pessoas ficam recorrendo. No Brasil, há uma infinidade de recursos.
Os processos nunca se encerram”.
Vitoriosos, sim!
Se no processo judicial só houve
decepção (mas qual é mesmo o papel do Poder Judiciário em nossa
sociedade? Sobre o assunto, leia A Verdade nº137), os camponeses foram
vitoriosos, sim. 18 mil hectares da Fazenda Macaxeira foram
desapropriados, e assentadas 690 famílias. Hoje, vivem na área em torno
de 6 mil pessoas, praticando a agricultura de subsistência, criando
vacas de leite e pequenos animais. Avaliando toda a história, afirma o
assentado Iedimar Rodrigues (depoimento ao jornal Brasil de Fato): “…Foi
uma coisa difícil até conseguirmos. Mas depois foi só alegria e muito
trabalho porque fomos capazes de transformar nossas vidas”. “Hoje,
consegui arrumar minha família, tenho casa. O que temos, devemos aos
companheiros que foram mortos”, acrescenta o assentado Miguel Pontes.
O renomado arquiteto Oscar Niemeyer
projetou uma homenagem aos Sem-Terra mortos. O Monumento Eldorado
Memória, inaugurado no dia 7 de setembro de 1996 em Marabá (PA) foi
destruído dias depois. Quem teria sido responsável pelo ato terrorista?
Alguém ousa responder? Niemeyer não se surpreendeu: “Já esperava.
Aconteceu o mesmo quando levantamos o monumento em homenagem aos
operários mortos pelo Exército na ocupação da Companhia Siderúrgica
Nacional em Volta Redonda”, disse o arquiteto.
17 de abril tornou-se Dia Nacional de
Luta pela Terra. E nesse mês, o Movimento dos Sem-Terra (MST) promove
ocupações e manifestações em todo o país. É o Abril Vermelho! Então, uma
vida, muitas vidas valem um sonho!
“…Canudos, Contestado, Caldeirão,
Candelária, Carandiru, Corumbiara, Eldorado dos Carajás… Se calarmos, as
pedras gritarão” (Pedro Tierra)
José Levino
Retirado do Jornal A Verdade
segunda-feira, 16 de abril de 2012
A cúpula das "Guayaberas"
Obama, o
primeiro Presidente negro dos Estados Unidos ―sem dúvida inteligente,
bem instruído e bom comunicador―, fez pensar a não poucas pessoas que
era um êmulo de Abraham Lincoln e Martin Luther King.
Há cinco séculos uma Bula Papal, aplicando conceitos da época, destinou por volta de 40 milhões de quilômetros quadrados de terra, águas interiores e costas a dois pequenos e belicosos reinos da península Ibérica.
Ingleses, franceses, holandeses e outros importantes Estados feudais foram excluídos da partilha. Intermináveis guerras não tardaram em se desatar, milhões de africanos foram convertidos em escravos ao longo de quatro séculos e as culturas autóctones, algumas delas mais avançadas do que as da própria Europa, foram desfeitas.
Há 64 anos foi criada a repudiável OEA. Não é possível passar por alto o grotesco papel dessa instituição. Um elevado número de pessoas, que talvez somem centenas de milhares, foram sequestradas, torturadas e desaparecidas como consequência de seus acordos para justificar o golpe contra as reformas de Jacobo Árbenz, em Guatemala, organizado pela Agência Central de Inteligência ianque. América Central e o Caribe, incluída a pequena ilha de Granada, foram vítimas da fúria intervencionista dos Estados Unidos através da OEA.
Mais grave ainda foi seu nefasto papel no âmbito da América do Sul.
O neoliberalismo, como doutrina oficial do imperialismo, cobrou uma inusitada força na década de 70 quando o Governo de Richard Nixon decidiu frustrar o triunfo eleitoral de Salvador Allende no Chile. Começava uma etapa verdadeiramente sinistra na história da América Latina. Dois altos chefes das Forças Armadas chilenas, leais à Constituição, foram assassinados e Augusto Pinochet imposto na chefia do Estado, após uma repressão sem precedentes em que numerosas pessoas selecionadas foram torturadas, assassinadas e desaparecidas.
A Constituição do Uruguai, um país que se mantivera durante muitos anos no marco da institucionalidade, foi varrida.
Os golpes militares e a repressão se espalharam a quase todos os países vizinhos. A linha de transporte aéreo cubana foi alvo de brutais sabotagens. Um avião foi destruído em pleno voo com todos seus passageiros. Reagan pôs em liberdade o autor mais importante do monstruoso crime de uma cadeia na Venezuela, e o enviou para El Salvador a organizar o intercâmbio de drogas por dinheiro para a guerra suja contra a Nicarágua, que custou dezenas de milhares de mortos e mutilados.
Bush pai e Bush filho, protegeram e exoneraram de culpa aos implicados nesses crimes. Seria interminável a lista de desmandos e atos terroristas cometidos contra as atividades econômicas de Cuba ao longo de meio século.
Hoje, sexta 13, escutei valentes palavras pronunciadas por vários dos oradores que interviram na reunião de chanceleres da chamada Cúpula de Cartagena. O tema dos direitos soberanos da Argentina sobre Las Malvinas ―cuja economia é brutalmente golpeada ao ser privada dos valiosos recursos energéticos e marítimos dessas ilhas―, foi abordado com firmeza. O chanceler venezuelano Nicolás Maduro, ao concluir a reunião de hoje, declarou com profunda ironia que: “do Consenso de Washington se passou para o Consenso sem Washington”.
Agora temos a Cúpula das guayaberas*. O rio Yayabo e seu nome indígena, totalmente reivindicado, passarão à história.
Fidel Castro Ruz
13 de Abril de 2012
21h40
*Guayabera: Camisa tradicional cubana.
Há cinco séculos uma Bula Papal, aplicando conceitos da época, destinou por volta de 40 milhões de quilômetros quadrados de terra, águas interiores e costas a dois pequenos e belicosos reinos da península Ibérica.
Ingleses, franceses, holandeses e outros importantes Estados feudais foram excluídos da partilha. Intermináveis guerras não tardaram em se desatar, milhões de africanos foram convertidos em escravos ao longo de quatro séculos e as culturas autóctones, algumas delas mais avançadas do que as da própria Europa, foram desfeitas.
Há 64 anos foi criada a repudiável OEA. Não é possível passar por alto o grotesco papel dessa instituição. Um elevado número de pessoas, que talvez somem centenas de milhares, foram sequestradas, torturadas e desaparecidas como consequência de seus acordos para justificar o golpe contra as reformas de Jacobo Árbenz, em Guatemala, organizado pela Agência Central de Inteligência ianque. América Central e o Caribe, incluída a pequena ilha de Granada, foram vítimas da fúria intervencionista dos Estados Unidos através da OEA.
Mais grave ainda foi seu nefasto papel no âmbito da América do Sul.
O neoliberalismo, como doutrina oficial do imperialismo, cobrou uma inusitada força na década de 70 quando o Governo de Richard Nixon decidiu frustrar o triunfo eleitoral de Salvador Allende no Chile. Começava uma etapa verdadeiramente sinistra na história da América Latina. Dois altos chefes das Forças Armadas chilenas, leais à Constituição, foram assassinados e Augusto Pinochet imposto na chefia do Estado, após uma repressão sem precedentes em que numerosas pessoas selecionadas foram torturadas, assassinadas e desaparecidas.
A Constituição do Uruguai, um país que se mantivera durante muitos anos no marco da institucionalidade, foi varrida.
Os golpes militares e a repressão se espalharam a quase todos os países vizinhos. A linha de transporte aéreo cubana foi alvo de brutais sabotagens. Um avião foi destruído em pleno voo com todos seus passageiros. Reagan pôs em liberdade o autor mais importante do monstruoso crime de uma cadeia na Venezuela, e o enviou para El Salvador a organizar o intercâmbio de drogas por dinheiro para a guerra suja contra a Nicarágua, que custou dezenas de milhares de mortos e mutilados.
Bush pai e Bush filho, protegeram e exoneraram de culpa aos implicados nesses crimes. Seria interminável a lista de desmandos e atos terroristas cometidos contra as atividades econômicas de Cuba ao longo de meio século.
Hoje, sexta 13, escutei valentes palavras pronunciadas por vários dos oradores que interviram na reunião de chanceleres da chamada Cúpula de Cartagena. O tema dos direitos soberanos da Argentina sobre Las Malvinas ―cuja economia é brutalmente golpeada ao ser privada dos valiosos recursos energéticos e marítimos dessas ilhas―, foi abordado com firmeza. O chanceler venezuelano Nicolás Maduro, ao concluir a reunião de hoje, declarou com profunda ironia que: “do Consenso de Washington se passou para o Consenso sem Washington”.
Agora temos a Cúpula das guayaberas*. O rio Yayabo e seu nome indígena, totalmente reivindicado, passarão à história.
Fidel Castro Ruz
13 de Abril de 2012
21h40
*Guayabera: Camisa tradicional cubana.
Estado Futebolístico de Exceção
Da Folha de São Paulo
O
país vira instrumento para nutrir o caixa da Fifa, entidade privada
suíça; desafiar a zona de exclusão comercial perto de estádios pode dar
até prisão
O
manifesto dos tenentes rebelados em São Paulo, em 1924, denunciava: "O
Brasil está reduzido a verdadeiras satrapias, desconhecendo-se
completamente o merecimento dos homens e estabelecendo-se como condição
primordial, para o acesso às posições de evidência, o servilismo
contumaz".
Passados
88 anos, um anacrônico servilismo emoldura as iniciativas nas 12
cidades-sede da Copa de 2014 e nas alterações legais que o Congresso
Nacional está votando para receber o megaevento.
Sobra
subserviência, falta transparência: os compromissos do governo com a
Fifa, assinados em 2007, seguem cercados de mistério. As informações
sobre gastos e etapas das obras, nos portais oficiais, são
contraditórias e incompletas.
O
processo de remoção de moradias, que pode afetar 170 mil pessoas,
desrespeita o princípio do "chave por chave", que diz que ninguém pode
ser despejado de sua casa sem receber outra, próxima e melhor.
O
projeto da Lei Geral da Copa -bem mais do que uma "lei do copo de
cerveja" nas partidas- transforma o Brasil em protetorado de interesses
mercantis.
Ele
"expulsa de campo" a legislação nacional que regula concorrência,
patentes, direitos do consumidor, transmissões esportivas, gastos
orçamentários, publicidade, punição a delitos e até calendário escolar. A
lei das licitações já fora "escanteada" pelo Regime Diferenciado de
Contratações. Uma entidade privada internacional impõe legislação
excepcional, garantindo isenções fiscais a mais de mil produtos!
O
projeto aprovado na Câmara assegura megaprivilégios à Fifa. O Inpi vira
um "cartório particular", com regime especial para pedidos de registro
de "marcas de alto renome" apresentadas pela entidade.
Libera-se
uma associação suíça de direito privado do pagamento de custos e
emolumentos exigidos a todos que requerem registro de marca no Brasil.
Trata-se de uma renúncia fiscal longa e onerosa!
O projeto afronta até um preceito defendido pelos liberais de todos os matizes: o da livre iniciativa.
Isto
é evidenciado ao se "assegurar à Fifa e às pessoas por ela indicadas a
autorização para, com exclusividade, divulgar suas marcas, distribuir,
vender, dar publicidade ou realizar propaganda de produtos e serviços,
bem como outras atividades promocionais ou de comércio de rua, nos
locais oficiais de competição, nas suas imediações e principais vias de
acesso".
Prevê-se
também que será objeto de sanções -como prisão de três meses a um ano- a
"oferta de provas de comida ou bebida, distribuição de panfletos ou
outros materiais promocionais (...), inclusive em automóveis, nos locais
oficiais de competição, em suas principais vias de acesso ou em lugares
que sejam claramente visíveis a partir daqueles".
O "Estado Futebolístico de Exceção" cria suas "zonas de exclusão".
A
União fica também obrigada a disponibilizar, sem quaisquer custos para a
Fifa, "a segurança, serviços de saúde, vigilância sanitária e alfândega
e imigração".
Além
de disponibilizar gratuitamente todos esses serviços para um evento
privado, o Brasil também se responsabiliza por quaisquer acidentes que
venham a ocorrer.
A
Fifa, que ganhou na África do Sul mais de R$ 7,2 bilhões só com
radiodifusão e marketing, "marca sob pressão" as nossas autoridades. Em
2011, já faturou R$ 1,67 bilhão com vendas vinculadas à Copa de 2014.
Medidas provisórias poderão ser editadas "na prorrogação" para garantir
os resultados esperados.
No
lugar de caixinha de surpresas, o futebol se transforma em um
instrumento para nutrir a caixa-registradora da Fifa e dos seus sócios.
CHICO ALENCAR, 62, historiador, é deputado federal pelo PSOL-RJ
domingo, 15 de abril de 2012
Curió: piloto viu pessoas caindo de avião da FAB
A possibilidade de que corpos de
ex-guerrilheiros ainda possam ser encontrados é considerada quase nula
numa casa situada na avenida Almirante Barroso, em Belém. Em uma pequena
vila, o aposentado I.V., de 92 anos, se deixa levar por lembranças que
julgava enterradas, sepultadas em uma memória que tentou apagar imagens
de uma manhã perdida nos anos 70. O aposentado foi testemunha de uma das
possíveis atrocidades cometidas por Sebastião Curió no combate à
guerrilha do Araguaia. I.V. lembra ter visto seis pessoas sendo jogadas
de um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) nas matas do Araguaia.
Seriam lembranças que não viriam à tona não fosse a série de reportagens
do Diário do Pará a respeito da trajetória de Sebastião Curió. Ao ler
as reportagens, I.V. decidiu contar o que viu. “Ele passou a semana
agitado”, diz a filha do aposentado. “Dizia que precisava falar a
respeito do tal major Curió”.
Na década de 70, I.V. trabalhava como
copiloto de um avião Catalina que transportava carne de gado do
município de Conceição do Araguaia a Belém. Num desses transportes,
testemunhou, sem saber exatamente o que ocorria, a maneira como os
inimigos de Curió eram tratados. “Nós decolamos de Conceição do Araguaia
às 6h. Recebemos, logo depois da subida, uma mensagem da torre de
controle de Marabá informando que não deveríamos voar usando os
instrumentos. Tínhamos de usar o sistema manual e na orientação visual”.
A justificativa era que um avião da FAB
fazia operações na área. O comandante Macedo, que pilotava o avião,
começou a voar abaixo das nuvens para facilitar a visualização. Quando
sobrevoavam as matas do Araguaia, viram o avião da FAB. “Começamos a ver
uma coisa estranha. Estavam jogando coisas do avião”. A cena era
macabra. “Primeiro foi um, depois mais dois, em seguida mais dois e no
final mais um”, enumera o aposentado. O comandante Macedo ainda embicou a
aeronave para que os dois pudessem observar melhor o que se passava.
Aos poucos, ficou claro que eram pessoas que estavam sendo arremessadas
do interior do avião. Seis pessoas no total.
Em Marabá, enquanto faziam a manutenção
da aeronave, piloto e copiloto foram abordados por um sargento, chefe do
Destacamento de Marabá que, passando por problemas de saúde, pedia
carona a Belém. “Damos a carona se o senhor nos explicar o que foi que
vimos”, condicionou o comandante Macedo. O sargento concordou em contar
os fatos, desde que nada do que fosse conversado fosse revelado,
dissecando, a seguir, o plano executado por Curió.
Às 5h, ele ordenou que seis mulheres
integrantes da guerrilha fossem acordadas porque participariam de um
passeio. “A cozinha não está funcionando ainda”, lhe respondeu o
soldado. “Não tem problema, assim elas não enjoam”, retrucou Curió. As
seis guerrilheiras teriam sido atiradas vivas do avião. Uma imagem que
ficou compartilhada em segredo por I.V. e o comandante Macedo. Anos
depois, Macedo morreria num acidente de avião. I.V. esqueceria aos
poucos aquela manhã dos anos 70. “Quando li o primeiro artigo que fala
da negativa do juiz de Marabá, pensei que só o Supremo Tribunal Federal
pode resolver essa questão, mas sei que não vai ser possível encontrar
nada dessas moças. Nunca mais”, diz o aposentado.
I.V. não quer ser identificado. Recusa que se façam fotos. Viu algo que sempre foi uma suspeita dos que buscam resgatar a história do fim da guerrilha. “É um novo olhar sobre esse episódio”, diz Paulo Fonteles Filho, que integra a comissão que busca encontrar as ossadas dos guerrilheiros mortos na região. “Quando li as reportagens, tudo veio de novo, todas as imagens”, diz o aposentado. “Eu precisava falar”. É o exemplo a ser seguido. (Ismael Machado/Diário do Pará)
quinta-feira, 12 de abril de 2012
ZUZU ANGEL: “OBRA DOS MESMOS ASSASSINOS DO MEU AMADO FILHO”
Zuleika Angel Jones (1923 – 1976)
Número do processo: 237/96
Data e local de nascimento: 05/06/1923, Curvelo (MG)
Filiação: Francisca Gomes Netto e Pedro Netto
Organização política ou atividade: denúncia da morte do filho como resultado de torturas.
Data e local da morte: 14/04/1976, Rio de Janeiro (RJ)
Relator: Luís Francisco Carvalho Filho
Deferido em: 25/03/1998 por 4×3 (votos contra do general Oswaldo Pereira Gomes, Paulo Gonet Branco e João Grandino Rodas)
“Se algo vier a acontecer comigo, se eu
aparecer morta, por acidente, assalto ou qualquer outro meio, terá sido
obra dos mesmos assassinos do meu amado filho”. O trecho da carta
escrita em 23/04/1975 pela estilista Zuleika Angel Jones, conhecida como
Zuzu Angel, entregue ao compositor Chico Buarque e outros amigos,
representou uma verdadeira premonição a respeito de sua morte um ano
depois.
Zuzu Angel morreu em 14/04/1976, num
acidente automobilístico à saída do túnel Dois Irmãos, no Rio de
Janeiro. A suspeita de que esse acidente tivesse sido provocado envolveu
imediatamente todas as pessoas bem informadas sobre o que era o
aparelho de repressão política do regime militar. Mas foi somente
através da CEMDP que se tornou possível elucidar os fatos. Restou
provado que sua morte foi desdobramentoe conseqüência da morte de seu
filho Stuart Edgard Angel Jones, em 1971, caso já apresentado neste
livro-relatório.
Profissional de sucesso – vestia atrizes
como Liza Minnelli e Joan Crawford –, Zuzu conseguiu transformar o
desaparecimento de seu filho Stuart num acontecimento que provocou forte
desgaste internacional para o regime militar brasileiro. Com isso,
despertou a ira dos porões da ditadura, que passaram a vê-la como
ameaça. Buscando incansavelmente o paradeiro do filho, esteve nos
Estados Unidos com o senador Edward Kennedy; furou o cerco da segurança
norte-americana e conversou com Henry Kissinger, em visita ao Brasil;
prestou detalhado depoimento ao historiador Hélio Silva; escreveu ao
presidente Ernesto Geisel, ao ministro do Exército Sylvio Frota, ao
cardeal Dom Paulo Evaristo Arns e à Anistia Internacional. Em um de seus
desfiles, estampou os figurinos com tanques de guerra e anjos tristes.
Quando começou a receber ameaças de morte, alertou os amigos.
Zuzu estava absolutamente sóbria na noite
do acidente e uma semana antes tinha feito revisão completa em seu
carro que, sem aparente motivo, desviou-se da estrada, capotando
diversas vezes em um barranco. A análise das fotos e dos laudos
periciais, as inúmeras contradições e omissões encontradas no inquérito e
depoimentos de testemunhas oculares compuseram uma base robusta para a
decisão da CEMDP reconhecendo a responsabilidade do regime militar por
mais essa morte de opositor político.
De início, o relator do caso na Comissão
Especial recomendou o indeferimento, que só recebeu dois votos
contrários. Mas a família de Zuzu decidiu exumar o corpo e entrou com
recurso, levando o relator a mergulhar na investigação dos novos dados. A
exumação foi realizada por Luís Fondebrider, da Equipe Argentina de
Antropologia Forense. Foram também apresentadas novas testemunhas, entre
elas o advogado Carlos Machado Medeiros – filho de um ex-ministro da
Justiça de Castello Branco – que trafegava pela estrada Lagoa-Barra da
Tijuca e forneceu uma declaração escrita afirmando que : “(…) dois
veículos abalroaram o Karmann Ghia azul de uma pessoa que, logo depois,
na manhã seguinte, constatei ser Zuzu Angel”.
Com medo de represálias, contou apenas
aos amigos. Três deles confirmaram integralmente essa declaração perante
o relator, Luís Francisco Carvalho Filho, que não conseguiu falar
pessoalmente com o advogado Carlos Medeiros, que também sofreu um
acidente automobilístico causador de graves seqüelas e problemas de
memória.
Outros depoimentos, recolhidos na segunda
fase do processo, foram o da psiquiatra Germana Lamare – a quem Zuzu
contou estar sendo ameaçada de morte – e de Marcos Pires, estudante
residente na Barra da Tijuca que escutou o ruído do acidente e, ao
chegar ao local, já encontrou uma dúzia de carros oficiais, a maioria da
polícia, ao redor do automóvel destruído de Zuzu. As informações foram
relatadas em uma carta enviada a Hildegard, filha de Zuzu e colunista do
jornal O Globo. Mais tarde, em depoimento prestado a Nilmário Miranda em 12/02/1996, ele admitiu ter presenciado o acidente:
“Eu só vi um carro saindo (do túnel) e
logo em seguida um outro carro que emparelha com esse carro. (…) Eu vi
quando o carro que ultrapassa o carro da direita (…) abalroa este carro
(…) e faz com que ele caia a uma distância que estimei na hora em cinco
metros (…)”. A versão de Marcos Pires contrariava frontalmente o laudo
oficial do acidente e praticamente dirimiu todas as dúvidas.
Em seu voto final pela aprovação do
requerimento, Luís Francisco recuperou as inúmeras contradições do caso,
que o levaram a contratar Valdir Florenzo e Ventura Raphael Martello
Filho, especialistas em perícias de trânsito em São Paulo, para analisar
os documentos policiais.
Em relatório minucioso eles argumentam:
“Ao reexaminar o laudo original, duas circunstâncias chamaram minha
atenção. Em primeiro lugar, o documento é instruído com 16 fotografias
mas, aparentemente, nenhuma delas se destinava a mostrar,
especificamente, as marcas da derrapagem (28 metros) na pista e as
marcas da atritagem nos pneus dianteiros. Em algum lugar, na perspectiva
de um observador leigo, surgiram as seguintes indagações: o meio-fio da
direita seria um obstáculo capaz de provocar uma mudança de trajetória
tão drástica como a que foi descrita? Levando-se em consideração que,
segundo os próprios peritos, o meio-fio é de altura normal e que,
segundo as fotos que instruem o laudo da época estava visivelmente
coberto por vegetação rasteira, o veículo, naquela trajetória, não iria
simplesmente transpor o obstáculo? (…)”.
Os peritos também descartaram a
possibilidade de Zuzu ter dormido ao volante: “a dinâmica pretendida
pelo laudo correspondente ao exame do local é absolutamente
inverossímil. Primeiro porque um veículo jamais mudaria de direção
abruptamente única e tão somente por conta do impacto de qualquer de
suas rodagens contra o meio-fio, qual seria galgado facilmente,
projetando-se o veículo pelo talude antes de chegar ao guarda-corpo do
viaduto.
Segundo porque, sendo o meio-fio direito
da auto-estrada perfeita e justamente alinhado com o guarda-corpo do
viaduto, mesmo que o veículo se desviasse à esquerda, tal como o
sugerido pelo laudo, desviar-se-ia do guarda-corpo, podendo, se muito,
chocar o extremo direito da dianteira. Terceiro porque, mesmo que se
admitisse a trajetória retilínea final, nos nove metros consignados pelo
laudo, tendo-se em conta que o veículo chocou a dianteira esquerda e
que não havia mais nada à direita, a não ser a rampa inclinada da
superfície do talude, teríamos que aceitar que as rodas do lado direito
ficariam no ar e o veículo perfeitamente em nível até que batesse no
guarda-corpo, o que, evidentemente seria impossível”.
Em 1987, Virgínia Valli, publicou o livro
“Eu, Zuzu Angel, procuro meu filho – a verdadeira história de um
assassinato político”.
Em 2006, o diretor Sérgio Rezende levou
às telas a cine-biografia da estilista Zuzu Angel, interpretada pela
atriz Patrícia Pilar. A música que Chico Buarque e Miltinho compuseram,
em 1977, em sua homenagem, evoca a dor de Zuzu e uma das versões
existentes para o desaparecimento do corpo do filho Stuart – jogado de
helicóptero no Atlântico –, mencionando também os figurinos que ela
apresentou no desfile com o motivo de anjos:
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse estribilho
Só queria embalar meu filho
Que mora na escuridão do mar
Quem é essa mulher
Que canta sempre esse lamento
Só queria lembrar o tormento
Que fez o meu filho suspirar
Quem é essa mulher
Que canta sempre o mesmo arranjo
Só queria agasalhar meu anjo
E deixar seu corpo descansar
Quem é essa mulher
Que canta como dobra um sino
Queria cantar por meu menino
Que ele já não pode mais cantar
>>Retirado do livro Direito à Memória e à Verdade<<
Para que nunca mais se esqueça, para que nunca mais aconteça!
Tacacá
(Luiz Gonzaga)
Quem vai a Belém do Pará,
desde a hora em que sai
não se esquece de lá,
quer voltar.
Lembrar o açaí, o tacacá,
que saudade que dá
de Belém do Pará!
Orar na Matriz de Belém,
conversar com alguém,
como é bom recordar!
Jesus em Belém foi nascer,
eu quisera morrer
em Belém do Pará.
Tá aqui tucupi,
tem mais o jambu,
também camarão.
Quem quer tacacá?
Quem vai a Belém do Pará,
desde a hora em que sai
não se esquece de lá,
quer voltar.
Lembrar o açaí, o tacacá,
que saudade que dá
de Belém do Pará!
Orar na Matriz de Belém,
conversar com alguém,
como é bom recordar!
Jesus em Belém foi nascer,
eu quisera morrer
em Belém do Pará.
Tá aqui tucupi,
tem mais o jambu,
também camarão.
Quem quer tacacá?
>>pra ouvir é só acessar o link: http://www.youtube.com/watch?v=-hSCzDedkXQ&feature=youtu.be <<
quarta-feira, 11 de abril de 2012
via Twitter
Se a imprensa chama Cachoeira de "empresário do ramo de jogos" deveria chamar Beira mar de "empresário do ramo de entorpecentes" @CarlosLatuff
domingo, 8 de abril de 2012
Dois mil índios waimiri-atroari contrários à rodovia desapareceram durante regime militar no Brasil
O indigenista e ex-missionário Egydio Schwade, 76, revela os
episódios que envolveram a violenta ocupação das terras dos
waimiri-atroari.
(CLOVIS MIRANDA / ACRITICA)
Eles
não estão na lista oficial de desaparecidos políticos, nem de vítimas
de violação de direitos humanos durante o regime militar no Brasil, mas
foram considerados empecilhos para o desenvolvimento e guerrilheiros e
inimigos do regime militar. Por resistirem à construção de uma estrada
(a BR-174, que liga Manaus a Boa Vista) que atravessaria seu território,
sofreram um massacre.
Entre
1972 e 1975, no Estado do Amazonas, dois mil indígenas da etnia
waimiri-atroari sumiram sem vestígios. Um número infinitamente superior
aos desaparecidos da Guerrilha do Araguaia, no Pará. Esta população cuja
história permanece obscura ainda povoa a memória dos sobreviventes
waimiri-atroari (ou Kiña, como se autodenominam).
“O
massacre aconteceu por etapas e envolveu diferentes órgãos do regime
militar”, diz o indigenista e ex-missionário Egydio Schwade, 76, um dos
principais agentes da mobilização que tenta tornar público este episódio
e provocar a inclusão dos waimiri-atroari nas investigações da Comissão
Nacional da Verdade, criada em novembro de 2011 pela Presidência da
República.
Desde o início de 2011, Schwade passou a divulgar uma série de artigos em seu blog http://urubui.blogspot.com.br sobre os episódios que envolveram a violenta ocupação das terras dos waimiri-atroari.
Panfleto
O
recrudescimento contra os waimiri-atroari nunca foi negado pelo regime
militar. Registros sobre os métodos dos militares para dissuadir (ou
pacificar, como foi batizada a estratégia de convencimento) os indígenas
a aceitar a construção da estrada estão em vários documentos e podem
ser encontrados em declarações dadas a jornais na época tanto por
militares quanto por funcionários da Fundação Nacional do Índio (Funai).
Panfleto
denominado “Operação Atroaris” que circulava na época, chegou a
qualificá-los de “guerrilheiros”. Um trecho do panfleto, escrito em
versos, dizia: “Estais cercado, teus momentos estão contados; vê na
operação esboçada que o teu fim está próximo”.
Alfabetização
Egydio
Schwade teve acesso às informações sobre o desaparecimento dos
waimiri-atroari à medida que se tornava mais próximo e ganhava a
confiança dos indígenas no período em que viveu com sua família na
aldeia Yawará, onde chegou em 1985 e iniciou o processo de alfabetização
em Kiñayara, língua da etnia.
O
indigenista, que reside no município de Presidente Figueiredo e
sobrevive como apicultor, conta que, após dois anos vivendo entre os
waimiri-atroari, foi expulso pela Funai. Ele acredita que isto ocorreu
justamente porque os indígenas começaram a revelar os acontecimentos da
época da construção da rodovia. Para ele, a Funai, tanto na época quanto
atualmente, foi omissa e até mesmo contribuiu com a opressão e a
violência contra os indígenas.
Silêncio
“Queremos
que as populações indígenas não sejam esquecidas pela Comissão da
Verdade. Os waimiri-atroari, assim como os Parakanã, no Pará, e os Suruí
e os Cinta Larga, em Rondônia, foram perseguidos pelo regime militar,
que tinha como estratégia ocupar suas terras. Os índios resistiram e
foram mortos. Que seja neutralizado o silêncio que domina estes casos”,
alerta Egydio Schwade.
Ele
diz que o que o incomoda é o silêncio da Funai em relação a este
assunto, atualmente escondido por detrás das ações mitigadoras que foram
implementadas nos anos 80, com a criação do Programa Waimiri-Atroari,
uma parceria com a Eletronorte, como forma de compensar os impactos
ambientais e sociais causados pela construção da Hidrelétrica de
Balbina. A usina alagou grande parte do território dos waimiri-atroari.
Funai
O
Coordenador do Programa Waimiri-Atroari, José Porfírio Carvalho, que é
citado nos artigos de Egydio Schwade e acusado de participação, como
indigenista, nas ações contra os waimiri-atroari, foi procurado por
email (que consta no site do Programa Waimiri-Atroari) três dias antes
do fechamento desta matéria, mas não retornou o contato. No telefone da
sede do programa, 3632-1007, ninguém atendeu.
A
assessoria de imprensa da Funai também foi procurada e enviou a
seguinte resposta: “A Funai está acompanhando as discussões sobre o
assunto e vai trabalhar pela defesa dos direitos dos povos indígenas
também nesse caso”.
O decreto (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2011/Lei/L12528.htm)
que criou a Comissão Nacional da Verdade é de dezembro de 2011. A
assessoria de imprensa da Casa Civil da PR disse ao jornal A CRÍTICA que
“quando a comissão começar a investigar, serão analisados todos os
casos de desaparecidos, independente da etnia”.
Neste
mês, a Câmara dos Deputados criou uma Comissão da Verdade paralela,
como resposta à demora da Presidência da República em demorar em
instalar a Comissão Nacional da Verdade.
Pacificação
O
projeto de construção da BR-174 (Manaus-Boa Vista), que era defendido
pelo governador do Amazonas, Danilo Areosa, começou em 1968. A obra
passaria por dentro do território dos indígenas, que não foram
consultados e se opuseram ao empreendimento. Paralelamente, foram
iniciadas medidas de “pacificação” dos indígenas, envolvendo padres (o
mais conhecido foi o P. Calleri, morto pelos índios) e indigenistas da
Funai.
A
estratégia envolvia tentativas de diálogos, mas foi a presença de
soldados e funcionários da Funai e o uso de armas (metralhadoras,
revólveres, dinamite e até gás letal) os principais meios de
“convencimento” dos indígenas.
Estimativa
de população de waimiri-atroari feita pelo P. Calleri era de 3 mil
pessoas no final dos anos 60. Nos anos seguintes, este número baixou
para mil pessoas, sem que um registro de morte fosse feito, segundo
Schwade.
A
partir de 1974 as estatísticas da Funai começaram a referir números
entre 600 e mil pessoas e, em 1981, restavam apenas 354, conforme
pesquisa feita por Egydio.
Pelo
menos uma das várias aldeias desaparecidas foi bombardeada por gás
letal. Um sobrevivente waimiri-atroari que foi aluno de Egydio se
recordou “do barulho do avião passando por cima da aldeia e do pó que
caia”.
Nos
anos 80, após a repercussão internacional das mobilizações contra os
impactos causados pela Hidrelétrica de Balbina, o Banco Mundial
condicionou o financiamento da obra, que alagou terras dos
waimiri-atroari, à criação de um programa de mitigação da sua população.
O
programa começou a ser implementado em 1988, com duração de 25 anos sob
a gestão da Eletronorte. O prazo expira em 2013. Após o programa, a
população de waimiri-atroari voltou a crescer.
O
acesso aos waimiri-atroari é difícil. A reportagem tenta desde o ano
passado ir ao local, mas a resposta recorrente da coordenação do
Programa é que os indígenas “estão em festa ou caçando”.
Desaparecido
O
único amazonense integrante da lista oficial de desaparecidos durante a
ditadura é o Thomaz Meirelles, nascido em Parintins em 1937. Militante
de esquerda, a última notícia que se soube de Meirelles data de 1974.
A
reportagem entrou em contato com a viúva de Meirelles, a jornalista
Miriam Malina, que vive atualmente no Rio de Janeiro, mas ela não quis
dar declarações sobre o assunto nem sobre a Comissão da Verdade. Miriam
afirmou que “enquanto não souber a composição da Comissão” prefere não
se manifestar.
Amigo
e companheiro na época do Centro Popular de Cultural, Euclides Coelho
de Souza, 76, defende a urgência em dar visibilidade ao desaparecimento
de Meirelles, sobretudo entre os mais jovens. “Ele foi um importante
líder do movimento estudantil nos anos 60. Foi para a luta e o mataram.
Os estudantes do Amazonas precisam conhecer sua história. Pressionar o
poder público. Este assunto não pode ficar em brancas nuvens”, disse
Souza, por telefone, do Paraná, onde mora.
Thomaz
Meirelles morou em Manaus desde 1950, mas no final daquela década se
mudou para o Rio de Janeiro, onde passou a se envolver com movimento
estudantil. Fez parte da União Brasileira de Estudantes Secundaristas
(UBES). Em 1963 ganhou uma bolsa para uma faculdade em Moscou, onde
conheceu sua esposa. Quando retornou, seu envolvimento com o movimento
se intensificou. A perseguição política ficou mais dura e Meirelles
passou a viver na clandestinidade. Há informações de que foi torturado e
então desapareceu. Seu corpo nunca foi encontrado.
sábado, 7 de abril de 2012
Como se trata uma mulher fálica
Trate uma mulher fálica com empenho
A ame de uma forma poética
Beije-a e se mostre envolvente
A conquiste e a deixe sem saída
Acorde ela de um jeito doce
Mostre que você entende sobre existencialismo e fenomenologia.
Coma bem ela.
Abraçe-a e faça com que ela nunca mais se sinta só
Fale sobre o universo, sobre o cosmos, os buracos negros
A faça sentir viva!
Lhe deixe só na vontade alguma vez.
A descreva de forma lírica
Sinta, beba, cheire, engula ela
Deixe-a em dúvida
Elogie ela sempre
Diga sua opinião sobre o conflito arabe-israelense
Instigue, surpreenda
Faça ela saber de verdade o que é o amor livre
Mostre que você é capaz de fazer ela não querer mais ninguém
Leve-a para conhecer toda a América Latina de moto
A apoie sempre e a ajude a crescer
Mostre aceitação incondicional e confie na sua tendência atualizante
Faça ela ter esperança, acreditar na mudança
A faça gozar, arrancar os cabelos, mudar todos os planos
Peça para ela ficar, faça ela querer ficar.
Diga a ela coisas lindas, a deixe sem ar
Prove que Freud estava errado
Trate-a como uma rainha
A deixe esperando algumas vezes
Xingue-a e sinta raiva dela
Mas nunca, nunca mesmo
A trate como uma mulher submissa
Porque se você fizer isso
Ela provavelmente deixará toda compostura de lado
E quebrará a sua cara!
Então nem seu pau enorme terá mais utilidade para ela
Cecília Richter
A ame de uma forma poética
Beije-a e se mostre envolvente
A conquiste e a deixe sem saída
Acorde ela de um jeito doce
Mostre que você entende sobre existencialismo e fenomenologia.
Coma bem ela.
Abraçe-a e faça com que ela nunca mais se sinta só
Fale sobre o universo, sobre o cosmos, os buracos negros
A faça sentir viva!
Lhe deixe só na vontade alguma vez.
A descreva de forma lírica
Sinta, beba, cheire, engula ela
Deixe-a em dúvida
Elogie ela sempre
Diga sua opinião sobre o conflito arabe-israelense
Instigue, surpreenda
Faça ela saber de verdade o que é o amor livre
Mostre que você é capaz de fazer ela não querer mais ninguém
Leve-a para conhecer toda a América Latina de moto
A apoie sempre e a ajude a crescer
Mostre aceitação incondicional e confie na sua tendência atualizante
Faça ela ter esperança, acreditar na mudança
A faça gozar, arrancar os cabelos, mudar todos os planos
Peça para ela ficar, faça ela querer ficar.
Diga a ela coisas lindas, a deixe sem ar
Prove que Freud estava errado
Trate-a como uma rainha
A deixe esperando algumas vezes
Xingue-a e sinta raiva dela
Mas nunca, nunca mesmo
A trate como uma mulher submissa
Porque se você fizer isso
Ela provavelmente deixará toda compostura de lado
E quebrará a sua cara!
Então nem seu pau enorme terá mais utilidade para ela
Cecília Richter
sexta-feira, 6 de abril de 2012
"O governo empurra sim Belo Monte goela abaixo", diz Erwin Kräutler, bispo do Xingu
Há dias viajando de barco pelas comunidades ribeirinhas, bispo do Xingu diz: "A promessa que Lula me fez pessoalmente no dia 22 de julho de 2009 foi pura mentira"
05/04/2012
Leonardo Boff
Dom
Erwin Kräutler trabalha há dezenas de anos na região do Xingu. Sempre
defendeu os indígenas. Sofreu até um atentado que quase o matou. Mas
nunca desistiu. Assumiu a causa dos povos da floresta ao redor de Belo
Monte. Somos velhos amigos, porque juntos demos palestras em sua terra, a
Áustria, e tomávamos rapé, a melhor coisa para não pegar gripe e dormir
bem. Ele ainda continua com o o rapé como o Papa Pio X que não passava
uma hora sem tomar rapé.
Aqui Dom Erwin elaborou um texto de
denúncia, texto veraz de quem vive a tragédia humana e ecológica que
significa Belo Monte. As autoridades não informam a população. Negam e
até distorcem os fatos.
Mas eu prefiro crer nesse homem,
austríaco, que assumiu a cidadania brasileira e indígena, que acompanha o
povo e corre sempre risco de vida.
Vamos ao testemunho impressionante dele publicado pela página do IHU
Dom Erwin Kräutler
Há
doze dias vivo a bordo do barco “Teresinha”. Estou visitando as
comunidades do interior de Porto de Moz. Não há telefone e muito menos
existe acesso à Internet. Faz um bem enorme ficar de vez em quando sem
essas comodidades. Tem-se a impressão de estar em outro planeta. Mas as
pessoas queridas que encontro ao longo da viagem e que há décadas
conheço e amo são a prova de que continuo no mesmo planeta Terra e na
“minha terra” que é o Xingu.
A primeira vez que singrei as águas
dos rios, furos e lagos de Porto de Moz foi em janeiro de 1968. Lembro
os antepassados do povo que agora me abraça. Revejo em muitos rostos os
traços de seus avós. Antigamente as famílias vieram a remo. Hoje um
motor “rabeta” diminui mais o tempo da viagem. Mesmo assim têm que
enfrentar, às vezes por horas, um sol escaldante ou chuvas torrenciais.
O
encontro comigo, como o bispo, segue sempre o mesmo esquema. Começa com
abraços, cantos, poesias, salva de palmas. Um ambiente festivo e
descontraído, sem formalidades, etiquetas e protocolos. Sinto-me em
casa. “Vós todos sois irmãos” (Mt 23,8). Também o bispo é irmão! É
nestas ocasiões que mais me realizo como pastor, no meio dessa gente que
amo e que – eu sei disso – também me ama. Todo mundo se conhece. Essa é
uma das mais belas características das Comunidades Eclesiais de Base.
Não há estranhos.
Faço questão de primeiro ouvir o povo, escutar a
sua história, ser informado a respeito de suas esperanças e angústias,
avanços e derrotas. São coisas alegres, estórias pitorescas, “causos”
que partilham comigo, mas também assuntos tristes, experiências
dolorosas.
Sempre me admiro que esse povo, apesar de viver uma vida
dura e penosa, nunca perdeu a alegria. Sabe sorrir! Aliás, que sorriso
límpido, espontâneo, cativante! Nada postiço, só para agradar o bispo.
Falam do salão comunitário que conseguiram construir, da capela que
pintaram, das reuniões semanais, do culto dominical e da novena que não
deixaram de celebrar. Revelam também problemas familiares. Alguém
denuncia a invasão de geleiras para roubar o peixe, até na época da
piracema.
“Vem com malhadeiras de malha tão fina que nem alma passa” diz alguém. Outro relata com orgulho experiências que fazem com as Reservas Extrativistas comunitárias, mas reclama do IBAMA que cai em cima deles por causa de uma tartaruga que pegam, enquanto faz vistas grossas diante das geleiras, do escandaloso roubo de madeira, de desmatamentos e outras agressões ao meio-ambiente, como por exemplo Belo Monte. “Aí dá até todas as licenças para acabar com o nosso Xingu”.
Passo,
em seguida, do papel de ouvinte para entrevistado. Jovens e adultos me
bombardeiam com perguntas de todo tipo. Assuntos internos da comunidade,
do setor, da paróquia, mas também da “conjuntura” econômica e política.
Em todas as comunidades, a pergunta principal é sobre. Querem saber
detalhes, já que o bispo vem de Altamira, do centro do monstruoso
projeto.
“Bispo, será que ainda tem jeito de impedir essa
desgraça? Ouvimos falar que estão tocando Belo Monte a todo vapor. Dizem
que o governo já gastou muito dinheiro e assim certamente não dá mais
para parar a obra. Que o Sr. acha?”
O que realmente devo responder
a esse povo? Decido “abrir o verbo”, sem meias-palavras: “Verdade é que
um rolo compressor está passando por cima de todos nós. A promessa que
Lula pessoalmente me deu no dia 22 de julho de 2009, segurando-me no
braço e afirmando “Não vou empurrar este projeto goela abaixo de quem
quer que seja” foi pura mentira. Falou assim para “acalmar” o bispo e
livrar-se deste incômodo religioso que recebeu em audiência. O governo
empurra sim Belo Monte goela abaixo!
Altamira virou um caos em todos
os sentidos. Nada do prometido saneamento básico, uma das condicionantes
do IBAMA para dar licença para iniciar a obra! Não tem leito nos
hospitais, não há vaga nas escolas, homicídios na ordem do dia,
prostituição a céu aberto no centro da cidade. Os aluguéis de uma casa
simples pularam de 300 para 2.000 Reais. Os preços de alimentos
triplicaram. O transito é uma calamidade. Acidentes a toda hora”.
“O que mais vou dizer a vocês?
Fui
várias vezes “ver” o canteiro de obras, quer dizer, queria ver, porque
não me deixaram entrar, mas vi de longe os estragos já irrecuperáveis.
Rezei missa com as comunidades ameaçadas de despejo. Os grandes
fazendeiros receberam indenizações, mas o coitado do pequeno produtor e
agricultor não sabe o que vai ser dele e de sua família. Arrasaram com
uma vila inteira: Santo Antônio. O pessoal da Norte Energia é para lá de
arrogante. Se o colono não desocupa o seu sitio, a Justiça dá ordem de
despejo e manda a polícia em cima do pobre, pois a Norte Energia
considera toda a região propriedade sua e os moradores, que lá vivem
desde os tempos do bisavô, invasores.”
“E para onde vai toda essa gente?” Me perguntam.
“Pois também eu quero saber. Prometem solução, mas nunca dizem que tipo de solução, onde, quando, de que jeito.”
“E o povo de Altamira?”
“Muita
gente está com o coração despedaçado. Até comerciantes e empresários
que antes colaram em seus carros adesivos “Queremos Belo Monte” andam
hoje cabisbaixos. Quem pode contra a fúria da “Norte Energia”?
Aliás
“Norte Energia” é o próprio Governo, antes Lula, agora Dilma. Nunca
houve diálogo com o povo daqui, nem com índios, nem com ribeirinhos, nem
com o povo da cidade. O governo traiu o povo que o elegeu e ri-se de
quem defende os índios, os ribeirinhos, os pobres atingidos pela
barragem.
Fala de preço a ser pago pelo progresso. Só que esse
preço sacrifica o nosso povo e não as famílias de políticos em Brasília.
Um terço de Altamira vai para o fundo e o resto vai ficar à margem de
um lago podre, criador de carapanã e causador de dengue e malária”.
“E os índios? É verdade que estão a favor da barragem?”
“Não
digo que estão a favor da barrage. Estão a favor dos presentes que
recebem. Muitos deles que antes viviam abandonados pelo governo e
entregues à própria sorte, hoje têm todas as contas pagas no comércio,
recebem cestas básicas e combustível e outros benefícios. O governo que
negou aos índios se manifestarem em oitivas previstas em lei, agora se
esmera em entupi-los de dinheiro para fechar-lhes a boca. Antigamente
enganou-se os índios com espelhos e bugigangas, hoje milhões de reais
são injetados nas aldeias para paralisar a luta indígena e cooptar as
lideranças. O preço é muito alto. Não se mata mais índio a ferro e fogo.
O dinheiro farto é a punhalada traiçoeira no coração das culturas
indígenas e de sua organização comunitária.
E o governo afirma em
alto e bom som que nenhuma aldeia será alagada. Aldeia será alagada,
sim! O que a Norte Energia faz, é cortar a água aos índios e ribeirinhos
da Grande Volta do Xingu. E o povo da Volta Grande vive e sobrevive da
pesca. E tem mais. O que vai acontecer com uma aldeia a poucos
quilômetros do canteiro de obras onde trabalham milhares de homens? É
muito triste! Dá dó!”
“E nós? Como é que nós vamos ficar, nós que
moramos abaixo da futura barragem? Ou, como essa gente de Brasília fala,
‘à jusante’?”
“Bem, vocês sabem o que acontece se fazem uma tapagem no igarapé. Acima da tapagem, o que acontece?”
“O igarapé alaga a terra firme!”
“E abaixo da tapagem?”
“Ora, o igarapé seca!”
“Pois
é. O Xingu abaixo da barragem vai baixar de nível e os igarapés e
afluentes também. Há trechos em que o Amazonas vai entrar no leito do
Xingu e nossos peixes que não se dão com a água barrenta do Amazonas vão
morrer.”
Por um bom tempo o povo ficou apenas me olhando e não me fez mais nenhuma pergunta. E eu comecei a pensar:
Tudo
é matéria prima para fazer negócios. Tudo vira mercadoria a ser
explorada, ser comprada e vendida, exportada e consumida! Por isso os
homens derrubam e queimam a floresta, represam e sacrificam os rios,
assassinam os animais da mata, envenenam as plantas e os pássaros.
Os homens perderam o coração. Tornaram-se insensíveis, brutos, cruéis. Decidiram matar a vida.
Boca do Rio Maxipanã, São Pedro, março de 2012
Retirado do Brasil de Fato
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