AOS BRASILEIROS
Na condição de Oficiais Reformados,
sócios dos Clubes Militares, somos forçados a discordar do abaixo
assinado subscrito por vários Oficiais da Reserva, em apoio ao recente
Manifesto dos Presidentes dos Clubes, que foi retirado do site do Clube
Militar, após terem recebido ordens dos Comandantes das Forças, que,
numa atitude exemplar e equilibrada, recomendaram que o fizessem. Esse
documento continha referências à Presidente Dilma Rousseff, por não
censurar seus Ministros, que fizeram críticas exacerbadas aos governos
militares”. Agora, esse abaixo assinado, subscrito por esses Oficiais (
da Reserva e Reformados) e também pelo Coronel Carlos Alberto Brilhante
Ustra, ex-chefe do DOI-Codi, aparelho de repressão da Ditadura em São
Paulo, que está sendo acusado na Justiça de torturar presos políticos (
crimes que ele nega), refere-se de modo desafiador ao Ministro da
Defesa, Celso Amorim, “ a quem não reconhecem qualquer tipo de
autoridade ou legitimidade para fazê-lo”, o que, a nosso juízo, além de
ser um comportamento desrespeitoso, inaceitável na vida militar,
configura, induvidosamente, uma insubordinação, uma “quebra da
disciplina e da hierarquia”. Só para lembrar aos signatários desse
insensato documento, o tal Manifesto cobrava da Presidente o compromisso
em que afirmava, no discurso de posse dos Ministros:
“De minha parte, não haverá
discriminação, privilégios ou compadrio. A partir da minha posse, serei
presidenta de todos os brasileiros e brasileiras, respeitando as
diferenças de opinião, de crença e de orientação política.”
E foram além em suas críticas, asseverando:
”Parece que a preocupação em governar
para uma parcela da população sobrepuja-se ao desejo de atender aos
interesses de todos os brasileiros”
Queremos, desde logo, restabelecer uma
verdade, que os Presidentes dos Clubes Militares e alguns desses
senhores teimam em não reconhecer, a de que o verdadeiro regime
democrático é o que estamos vivendo, e não aquele dos “governos
militares”, que não permitiriam, jamais, tais “diferenças de opinião, de
crença e de orientação política”. Por outro lado, faz-se necessária uma
correção, a de que a Presidente Dilma Roussef ( que não nos deu
procuração), não governa para “uma parcela da população”, e sim, para
todos os brasileiros, vitoriosa que foi nas urnas por uma indiscutível e
expressiva votação, o que deve ter desagradado todos esses senhores.
Quanto às críticas exacerbadas aos
governos militares, pelo que fizeram durante o regime de exceção, elas
continuarão sendo feitas, sim, pois estamos vivendo em pleno regime
democrático, onde todos os segmentos organizados da sociedade mostram-se
ansiosos por descerrar esse véu que encobre a verdadeira história da
repressão. “ Pois sem responsabilização as histórias ficam sem fim,
soltas no espaço como fiapos elétricos, e o passado nunca vai embora”,
como afirmou o editorialista Veríssimo, em O GLOBO de 01/03/2012. E isso
não é revanchismo, por que, afinal, aquelas críticas referem-se a um
contexto onde pessoas, que se encontravam presas e indefesas sob a
tutela do Estado ( Ditatorial), mesmo assim, foram barbaramente
torturadas, muitas até a morte, o que sempre mereceu a reprovação dos
seres humanos civilizados. O povo brasileiro traz consigo a marca da
generosidade, pois soube suportar com resignação as violências nesse
tempo praticadas, como corretos foram muitos de nossos companheiros de
caserna, que se mantiveram dignos e não sujaram as suas mãos, e nem se
envolveram nos expedientes da repressão e da tortura.
O ideário do chamado “capitalismo
selvagem”, que plasmava as ações da nova ordem mundial, sob a liderança
dos Estados Unidos, o que se acha confirmado pelo depoimento do
Embaixador americano de então, o Sr. Lincoln Gordon, exigia que fossem
contidos todos os Governos que, politicamente, demonstrassem uma posição
antagônica aos seus interesses, e mostrassem preocupações com as
questões sociais dos seus povos. Sob a chancela dessas forças,
coincidentemente, e no mesmo momento histórico, foram instaladas
Ditaduras nos países da América Latina, através de golpes de Estado.
Prevaleceu a “velha cantilena”, que deu origem à ridícula história de
que “era preciso impedir o avanço do comunismo internacional”, o que
veio sensibilizar alguns incautos e desavisados, sem nenhum estudo ou
leitura (coitados !) sobre o que se passava no mundo da guerra fria,
inobstante estivesse em vigor uma Constituição que proclamava a
liberdade de pensamento. O que se lamenta é que muitos dos nossos
colegas, que eram, à época, jovens oficiais, recém saídos das Escolas
militares, a quem ensinaram durante a Ditadura, que a ideologia da
segurança nacional se sobrepunha a qualquer outra, passaram anos sem
liberdade, impedidos que foram de conhecer, e até de professar, qualquer
outro credo político. Até hoje, tem sido assim por que, se o fizerem,
serão “demonizados” pelos demais.
Estamos exercendo o legítimo direito da
contestação, que a ordem democrática vigente assegura aos seus cidadãos.
Não estamos mais em Ditadura, que serviu a interesses escusos de alguns
, onde a suspensão das garantias constitucionais, a censura à imprensa,
as prisões ilegais e arbitrárias (até mesmo, por simples delação), a
prática da tortura ( o que levou o Presidente Geisel a punir chefes
militares em São Paulo), tudo isso, deixou marcas profundas para ser
esquecido, por que faz parte da historia contemporânea do nosso Brasil.
Tais fatos nos enchem de vergonha perante o mundo, pelas indesculpáveis
violações aos direitos humanos praticadas sob o manto protetor do
aparelho de Estado. Estão alegando que o STF, em recente decisão,
concluiu pela anistia dos agentes que praticaram tais “crimes políticos
ou conexos”. Apenas para esclarecer, seria correto examinar, e, para
tanto, chamamos a atenção do Conselho Federal da OAB, os textos da Lei
6683/79 e da Emenda Constitucional nº 26/85, que, respectivamente, nos
seus arts. 1º, e 4º, parágrafo 1º e 2º, assim expressam:
LEI 6683, DE 28 DE AGOSTO DE 1979
“Art. 1º É concedida anistia a todos
quantos, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de
agosto de 1979, ( o grifo é nosso) cometeram crimes políticos ou conexos
com estes…”
Emenda Constitucional nº 26/85
“§ 1º – É concedida, igualmente, anistia aos autores de crimes políticos ou conexos,…”
“§ 2º – “A anistia abrange os que foram
punidos ou processados pelos atos imputáveis previstos no “caput” deste
artigo, PRATICADOS NO PERÍODO compreendido entre 2 de setembro de 1961 e
15 de agosto de 1979.” ( o grifo é nosso)
Como ficam os crimes e os criminosos das
três bombas colocadas, no dia 27 de AGOSTO DE 1980, em três
instituições, no Rio de Janeiro, como descreve um jornal da época:
“Duas bombas de alto teor explosivo
provocaram a morte de uma senhora e ferimentos em outras seis pessoas,
ontem, no Rio, em dois atentados ocorridos no início da tarde: um, na
sede da Ordem dos Advogados do Brasil e outro na Câmara dos Vereadores.
Num terceiro atentado, de madrugada, uma bomba de pouca potência
destruiu parcialmente a sala do jornal
“Tribuna da Luta Operária”, não
fazendo vítimas.
A bomba colocada na sede da OAB atingiu a secretária da entidade, Lida
Monteiro da Silva, que teve o braço decepado, vindo a morrer minutos
após ter dado entrada no hospital. No atentado na Câmara dos Vereadores,
o sr. José Ribamar de Freitas, tio e assessor do vereador Antônio
Carlos de Carvalho, do PMDB, perdeu um braço e uma vista, encontrando-se
até a noite de ontem em estado grave. Outras cinco pessoas que estavam
no local foram feridas. ( Folha de S.Paulo – quinta-feira, 28 de agosto
de 1980)
E a bomba do Riocentro, cuja explosão se deu em 30 de abril de 1981!!!, que a imprensa assim noticiou:
“A explosão ocorreu dentro de um
automóvel puma, na noite de 30 de abril de 1981, com a bomba no colo do
Sargento do Exército Guilherme Pereira do Rosário, cuja morte foi
instantânea. Ao lado do sargento, no volante, estava o Capitão Wilson
Luiz Chaves Machado, o qual, ato contínuo, sai do Puma segurando
vísceras à altura do estômago.” (Fonte: CMI Brasil)
Que ninguém duvide, que o que queremos é
“um regime de ampla democracia, irrestrita para qualquer cidadão, com
direitos iguais para todos”.
Os “torturadores ( militares e civís),
que não responderam a nenhum processo, encontram-se “anistiados” (?),
permaneceram em suas carreiras, e nunca precisaram requerer,
administrativa ou judicialmente, o reconhecimento dessa condição,
diferentemente daqueles, suas vítimas, que até hoje, estão demandando
junto aos Tribunais, para terem os seus direitos reconhecidos.
ONDE ESTÃO OS CORPOS DOS QUE FORAM
MORTOS PELAS AGRESSÕES SOFRIDAS? OS SEUS FAMILIARES QUEREM SABER, POIS
TÊM DIREITO A ESSA INFORMAÇÃO!
Assim sendo, também queremos a mesma
ANISTIA AMPLA, GERAL E IRRESTRITA, assegurada a esses insanos agentes da
ditadura. E, temos certeza, de que isso não é nenhum absurdo, pois tem a
aprovação das pessoas sensatas, daqueles diletos companheiros de
caserna (dos quais, de muitos, somos amigos), que não se envolveram em
práticas criminosas, e que têm no rol dos seus deveres éticos, o que se
acha inscrito nos estatutos militares: “exercer, com autoridade,
eficiência e probidade, as funções que lhes couberem em decorrência do
cargo; RESPEITAR A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA; ser justo e imparcial no
julgamento dos atos e na apreciação do mérito dos subordinados.”
Finalmente, como afirmava o mestre Darcy Ribeiro:
“Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar.
E eu não vou me resignar nunca.”
Rio de Janeiro, 29 de fevereiro de 2012
Luiz Carlos de Souza Moreira Capitão de Mar e Guerra
Fernando de Santa Rosa Capitão de Mar e Guerra
Nenhum comentário:
Postar um comentário