sexta-feira, 28 de dezembro de 2012
domingo, 23 de dezembro de 2012
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
Silvio Tendler - Carta Aberta a um Delegado de Polícia ou Respondendo à Intimidação por parte do clube militar
Delegado,
Dois policiais vieram ontem à minha residência entregar intimação para prestar declarações a fim de apurar atos de "Constrangimento ilegal qualificado – Tentativa – Autor", informa o ofício recebido. Meu advogado apurou tratar-se de denúncia ou queixa ou sei lá o quê, por par
Dois policiais vieram ontem à minha residência entregar intimação para prestar declarações a fim de apurar atos de "Constrangimento ilegal qualificado – Tentativa – Autor", informa o ofício recebido. Meu advogado apurou tratar-se de denúncia ou queixa ou sei lá o quê, por par
te do "presidente do clube militar" (em letra minúscula mesmo, de propósito).
Informo que na data da manifestação, 29 de março de 2012, estava recém-operado, infelizmente impedido de participar de ato público contra uma reunião de sediciosos, os quais, contrariando à determinação da Exma. Sra. Presidenta da República, comemoravam o aniversário da tenebrosa ditadura, que torturou, matou, roubou e desapareceu com opositores do regime.
Entre os presentes estava o matador do Grande Herói da Pátria, Capitão Carlos Lamarca, e seu companheiro Zequinha – doentes, esquálidos, sem força, encostados numa árvore. Zéquinha e Lamarca foram fuzilados sem dó, nem piedade, quando a lei e a honra determinam colocá-los numa maca e levá-los para um hospital para prestar os primeiros socorros. Essa gente estava lá, não eu. Eles é que devem ser investigados. Eu farei um filme enaltecendo o Capitão Lamarca e seu bravo companheiro Zequinha.
Tenha certeza, Delegado, de que, enquanto eu tiver forças, me manifestarei contra o arbítrio e a violência das ditaduras e, já que o Sr. está conduzindo o inquérito, procure apurar se o canalha que prendeu, torturou e humilhou minha mãe nas dependências do Doi-Codi participou do "festim diabólico". Isso sim é Constrangimento Ilegal. E já que se trata de assunto de polícia, aproveite para pedir ao "constrangedor ilegal" que ficou com o relógio da minha mãe – ela entrou com o relógio no Doi-Codi e saiu sem ele – que o devolva. Processe-o por "apropriação indébita, seguida de roubo qualificado (foi à mão bem armada)”. É fácil encontrar o meliante. Comece pelo Comandante do quartel da Barão de Mesquita em janeiro de 1971. Já que eles reabriram o assunto, o senhor pode desenterrar o processo. É, Delegado, o que eles fizeram durante a ditadura é mais assunto de polícia do que de política!
Pergunte ao queixoso presidente do clube militar se ele tem alguma pista do paradeiro do Deputado Rubens Paiva. Terá sido crime cometido por algum participante da festa macabra, onde, comenta-se, havia vampiros fantasiados de pijama?
Tudo o que fiz foi um chamamento pelo you tube convidando as pessoas a se manifestarem contra as comemorações do golpe de 64. Se este general entendesse ou respeitasse a lei, não teria promovido a festa e, tendo algo contra mim, deveria tentar me enquadrar por "delito de opinião" mas aí, na fotografia, ele ficaria mais feio do que é, não é mesmo?
Por fim, quero manifestar minha solidariedade aos que protestaram contra o "festim diabólico" e foram tratados de forma truculenta, à base de gás de efeito moral, spray de pimenta e choque elétrico – como nos velhos tempos. Bastaria umas poucas grades para separar os manifestantes do povo, que estavam na rua, aos sediciosos que ingressavam no clube. Há muitos poderia causar a impressão de estar visitando um zoológico e assistindo a um desfile de símios.
Não perca tempo comigo e com a ranhetice de um bando de aposentados cri-cri, aporrinhando a paciência de quem tem mais o que fazer. Pura nostalgia da ditadura, eles se portam como se ainda estivessem em posição de mando.
Informo que na data da manifestação, 29 de março de 2012, estava recém-operado, infelizmente impedido de participar de ato público contra uma reunião de sediciosos, os quais, contrariando à determinação da Exma. Sra. Presidenta da República, comemoravam o aniversário da tenebrosa ditadura, que torturou, matou, roubou e desapareceu com opositores do regime.
Entre os presentes estava o matador do Grande Herói da Pátria, Capitão Carlos Lamarca, e seu companheiro Zequinha – doentes, esquálidos, sem força, encostados numa árvore. Zéquinha e Lamarca foram fuzilados sem dó, nem piedade, quando a lei e a honra determinam colocá-los numa maca e levá-los para um hospital para prestar os primeiros socorros. Essa gente estava lá, não eu. Eles é que devem ser investigados. Eu farei um filme enaltecendo o Capitão Lamarca e seu bravo companheiro Zequinha.
Tenha certeza, Delegado, de que, enquanto eu tiver forças, me manifestarei contra o arbítrio e a violência das ditaduras e, já que o Sr. está conduzindo o inquérito, procure apurar se o canalha que prendeu, torturou e humilhou minha mãe nas dependências do Doi-Codi participou do "festim diabólico". Isso sim é Constrangimento Ilegal. E já que se trata de assunto de polícia, aproveite para pedir ao "constrangedor ilegal" que ficou com o relógio da minha mãe – ela entrou com o relógio no Doi-Codi e saiu sem ele – que o devolva. Processe-o por "apropriação indébita, seguida de roubo qualificado (foi à mão bem armada)”. É fácil encontrar o meliante. Comece pelo Comandante do quartel da Barão de Mesquita em janeiro de 1971. Já que eles reabriram o assunto, o senhor pode desenterrar o processo. É, Delegado, o que eles fizeram durante a ditadura é mais assunto de polícia do que de política!
Pergunte ao queixoso presidente do clube militar se ele tem alguma pista do paradeiro do Deputado Rubens Paiva. Terá sido crime cometido por algum participante da festa macabra, onde, comenta-se, havia vampiros fantasiados de pijama?
Tudo o que fiz foi um chamamento pelo you tube convidando as pessoas a se manifestarem contra as comemorações do golpe de 64. Se este general entendesse ou respeitasse a lei, não teria promovido a festa e, tendo algo contra mim, deveria tentar me enquadrar por "delito de opinião" mas aí, na fotografia, ele ficaria mais feio do que é, não é mesmo?
Por fim, quero manifestar minha solidariedade aos que protestaram contra o "festim diabólico" e foram tratados de forma truculenta, à base de gás de efeito moral, spray de pimenta e choque elétrico – como nos velhos tempos. Bastaria umas poucas grades para separar os manifestantes do povo, que estavam na rua, aos sediciosos que ingressavam no clube. Há muitos poderia causar a impressão de estar visitando um zoológico e assistindo a um desfile de símios.
Não perca tempo comigo e com a ranhetice de um bando de aposentados cri-cri, aporrinhando a paciência de quem tem mais o que fazer. Pura nostalgia da ditadura, eles se portam como se ainda estivessem em posição de mando.
Atenciosamente,
Silvio Tendler
quinta-feira, 6 de dezembro de 2012
quarta-feira, 5 de dezembro de 2012
6 de dezembro: 24 anos do assassinato do deputado João Batista
“Um tempo de enfrentamentos,
o sangue jorrou,
deixando braços e brados que não vacilarão
em seguir os exemplos deixados.
Combater em defesa da vida.
Sempre!!!”
o sangue jorrou,
deixando braços e brados que não vacilarão
em seguir os exemplos deixados.
Combater em defesa da vida.
Sempre!!!”
Por: Pedro César Batista
No momento que o Congresso Nacional, em um ato simbólico, reempossa
os parlamentares cassados pela ditadura, é oportuno e justo resgatar a
memória de um jovem parlamentar que não foi cassado, mas foi morto, aos
36 anos, por atuar ao lado dos trabalhadores na defesa da reforma
agrária faz parte da defesa da democracia e do resgate da verdade
histórica.
Batista, como era conhecido João Carlos Batista, foi o único deputado
assassinado no Brasil após o fim do governo militar. Atuou junto aos
camponeses do Pará na luta pela reforma agrária. Ele foi morto em 06 de
dezembro de 1988, depois de ter sofrido três atentados a bala (1985, 86 e
87), mesmo tendo solicitado, inúmeras vezes, formalmente, segurança ao
poder público – que manteve-se omisso, acabou assassinado.
O crime organizado pelo latifúndio não vacilou. Assassinou um deputado no pleno exercício de seu mandato parlamentar, matando-o na frente da família, quando chegava em sua casa, localizada no centro de Belém (PA), após sair de uma sessão da Assembleia Legislativa do Pará.
Os mortos pelo latifúndio, entre 1964 e 2011, passam de dois mil, com
escassos casos de assassinos e mandantes julgados e condenados.
Decorrido 24 anos do assassinato de João Batista dois pistoleiros
foram presos. Os dois já foram mortos. Um degolado, ainda antes de ser
julgado, dentro da prisão. O outro, condenado a 30 anos de prisão, foi
morto em 12 de dezembro de 2010, em Teresina (PI) quando livremente
continuava exercendo seu ofício de matador. Os mandantes continuam
livres e sem terem sido julgados. Nem mesmo foram citados no processo.
Relembrar a memória de Batista, no dia em que sua morte completa 24
anos durante o ato do Congresso Nacional de reempossar os parlamentares
cassados pela ditadura reafirma a necessidade da sociedade não permitir,
nunca mais, cassações, nem mortes de lideranças, parlamentares e de
nenhuma pessoa por lutar pela democracia e por justiça social.
O mandato de João Carlos Batista foi cassado pelas balas do
latifúndio, por isso relembra-lo é importante para animar a fé na luta e
em quem combate ao lado do povo. Ditadura nunca mais.
João Carlos Batista vive.
Brasília, 04 de dezembro de 2012
Por: Movimento de Olho na Justiça / Pedro César Batista / Izabel Suzuko Dias / Wanessa Dias Santos
sexta-feira, 30 de novembro de 2012
segunda-feira, 26 de novembro de 2012
domingo, 25 de novembro de 2012
sábado, 24 de novembro de 2012
Documentos revelam como o Exército se articulou para ocultar explosões no Riocentro
Ataques tinham como alvo o show com cerca de 20 mil pessoas no Rio de Janeiro, há 31 anos
Bomba explodiu no colo de agente do DOI-Codi
Foto:
Ricardo Chaves / Agencia RBS
José Luis Costa | Humberto Trezzi
Missão Nº 115. Esse era o nome oficial da vigilância desencadeada pelos
serviços de espionagem do Exército no centro de convenções Riocentro, no
Rio, em 30 de abril de 1981, quando 20 mil pessoas ali se reuniam para
um show musical em protesto contra o regime militar. Duas bombas
explodiram lá, e os agentes “supervisores” da ação foram as únicas
vítimas do episódio, que lançou suspeitas sobre atividades terroristas
praticadas por militares e mergulhou em agonia uma ditadura que vinha
desde 1964 e acabaria sepultada em 1985. Tudo isso a população
brasileira já intuía, por meio de depoimentos. O que até agora
permanecia oculto – e está sendo revelado por Zero Hora, em primeira mão
– são registros de militares envolvidos no episódio e manobras de
abafamento do incidente, arquitetadas por servidores da repressão.
Leia mais
Coronel tinha cartilha com orientações para serviços de espionagemVeja o cronograma e as anotações do coronel sobre o caso Riocentro
O segredo está em arquivos que eram guardados em casa pelo coronel reformado do Exército Julio Miguel Molinas Dias – assassinado aos 78 anos, em 1º de novembro, em Porto Alegre, vítima de um crime ainda nebuloso. Molinas Dias era, na época do atentado, comandante do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do Rio de Janeiro, conhecido como Aparelhão. O arquivo do coronel continha 200 páginas, várias delas encabeçadas pelo carimbo “confidencial” ou “reservado”. O calhamaço evidencia que o aparelho repressivo militar tentou maquiar o cenário do Riocentro para fazer com que as explosões parecessem obra de guerrilheiros esquerdistas.
Os registros estavam guardados pelo minucioso oficial. A unidade comandada por Molinas era reponsável por espionar e reprimir opositores ao regime militar. O DOI-Codi era localizado dentro do 1º Batalhão de Polícia do Exército, na Rua Barão de Mesquita,no bairro da Tijuca. Ao se aposentar, o coronel levou para casa documentos preciosos, contando pormenores da sigilosa rotina da caserna. O dossiê deixa transparecer que a bomba no Riocentro também fez estragos dentro da sede do DOI-Codi, distante 30 quilômetros do centro de eventos.
Em meio aos papéis, surgem evidências de que oficiais forjaram fatos. Há inclusive uma orientação para simular o furto do veículo pertencente ao sargento que morreu na explosão, no sentido de desaparecer com pistas que seriam comprometedoras.
Oficiais forjaram cenário da açãoO acervo de Molinas foi arrecadado pela Polícia Civil gaúcha após o assassinato dele e revela detalhes inéditos do lado de dentro dos portões de uma das mais temidas unidades das Forças Armadas durante os anos de chumbo.
ZH teve acesso a memorandos datilografados e também manuscritos, no qual o coronel registra a mobilização que se instalou naquele quartel-sede da espionagem política do Brasil, imediatamente após a explosão. São ordens, contraordens e telefonemas com a finalidade de evitar que fatos e versões indigestas ao Exército viessem à tona.
Os papéis contêm medidas de prevenção para segurança de militares, recomendações para não serem fotografados e relação de bombas e artefatos explosivos no paiol do quartel para destruição coletiva e individual. Mas o mais espesso lote de documentos do coronel é do tempo em que ele dava as ordens no comando do DOI-Codi.
De próprio punho, o coronel Molinas teria redigido parte desses memorandos, divididos em dias, horas e minutos. Trabalho facilitado porque era detalhista. Um verdadeiro soldado espartano. Em meio à papelada sobressaem-se relatórios sobre o desastroso atentado no centro de convenções Riocentro. Uma das duas bombas que explodiram durante um show musical acabou matando o sargento Guilherme Pereira do Rosário e ferindo com gravidade o capitão Wilson Luiz Chaves Machado, chefe da seção de Operações do DOI-Codi.
Os papéis do coronel Molinas mostram que Rosário tinha o codinome de Agente Wagner e Wilson era chamado Dr. Marcos (militares de baixa patente eram chamados de agentes e oficiais eram doutores, na gíria da espionagem).
Leia mais
Coronel tinha cartilha com orientações para serviços de espionagemVeja o cronograma e as anotações do coronel sobre o caso Riocentro
O segredo está em arquivos que eram guardados em casa pelo coronel reformado do Exército Julio Miguel Molinas Dias – assassinado aos 78 anos, em 1º de novembro, em Porto Alegre, vítima de um crime ainda nebuloso. Molinas Dias era, na época do atentado, comandante do Destacamento de Operações e Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi) do Rio de Janeiro, conhecido como Aparelhão. O arquivo do coronel continha 200 páginas, várias delas encabeçadas pelo carimbo “confidencial” ou “reservado”. O calhamaço evidencia que o aparelho repressivo militar tentou maquiar o cenário do Riocentro para fazer com que as explosões parecessem obra de guerrilheiros esquerdistas.
Os registros estavam guardados pelo minucioso oficial. A unidade comandada por Molinas era reponsável por espionar e reprimir opositores ao regime militar. O DOI-Codi era localizado dentro do 1º Batalhão de Polícia do Exército, na Rua Barão de Mesquita,no bairro da Tijuca. Ao se aposentar, o coronel levou para casa documentos preciosos, contando pormenores da sigilosa rotina da caserna. O dossiê deixa transparecer que a bomba no Riocentro também fez estragos dentro da sede do DOI-Codi, distante 30 quilômetros do centro de eventos.
Em meio aos papéis, surgem evidências de que oficiais forjaram fatos. Há inclusive uma orientação para simular o furto do veículo pertencente ao sargento que morreu na explosão, no sentido de desaparecer com pistas que seriam comprometedoras.
Oficiais forjaram cenário da açãoO acervo de Molinas foi arrecadado pela Polícia Civil gaúcha após o assassinato dele e revela detalhes inéditos do lado de dentro dos portões de uma das mais temidas unidades das Forças Armadas durante os anos de chumbo.
ZH teve acesso a memorandos datilografados e também manuscritos, no qual o coronel registra a mobilização que se instalou naquele quartel-sede da espionagem política do Brasil, imediatamente após a explosão. São ordens, contraordens e telefonemas com a finalidade de evitar que fatos e versões indigestas ao Exército viessem à tona.
Os papéis contêm medidas de prevenção para segurança de militares, recomendações para não serem fotografados e relação de bombas e artefatos explosivos no paiol do quartel para destruição coletiva e individual. Mas o mais espesso lote de documentos do coronel é do tempo em que ele dava as ordens no comando do DOI-Codi.
De próprio punho, o coronel Molinas teria redigido parte desses memorandos, divididos em dias, horas e minutos. Trabalho facilitado porque era detalhista. Um verdadeiro soldado espartano. Em meio à papelada sobressaem-se relatórios sobre o desastroso atentado no centro de convenções Riocentro. Uma das duas bombas que explodiram durante um show musical acabou matando o sargento Guilherme Pereira do Rosário e ferindo com gravidade o capitão Wilson Luiz Chaves Machado, chefe da seção de Operações do DOI-Codi.
Os papéis do coronel Molinas mostram que Rosário tinha o codinome de Agente Wagner e Wilson era chamado Dr. Marcos (militares de baixa patente eram chamados de agentes e oficiais eram doutores, na gíria da espionagem).
ZERO HORA
Ditadura: Pequeno subversivo, foi classificado como revolucionário aos 2 anos de idade
Minha História - Ernesto Carlos Dias - 44
Pequeno subversivo
Preso com a mãe pela ditadura, ele foi classificado como revolucionário aos 2 anos de idade
Patrícia Britto
RESUMO Filho de militantes que atuaram contra a ditadura militar, Ernesto Carlos Dias do Nascimento, 44, se tornou vítima do regime ainda criança. Em 1970, aos dois anos de idade, foi preso com a mãe por agentes do Dops. No mês seguinte, foi libertado junto com os 40 presos políticos resgatados em troca do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben. No mesmo ano, seguiu para o exílio, em Cuba, onde viveu por 16 anos.
Nasci em fevereiro de 1968, no bairro da Liberdade, em São Paulo. Minha mãe, Jovelina Tonello, trabalhava na prefeitura de Osasco e foi demitida durante a licença maternidade por causa da militância do meu pai.
Pequeno subversivo
Preso com a mãe pela ditadura, ele foi classificado como revolucionário aos 2 anos de idade
Patrícia Britto
RESUMO Filho de militantes que atuaram contra a ditadura militar, Ernesto Carlos Dias do Nascimento, 44, se tornou vítima do regime ainda criança. Em 1970, aos dois anos de idade, foi preso com a mãe por agentes do Dops. No mês seguinte, foi libertado junto com os 40 presos políticos resgatados em troca do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben. No mesmo ano, seguiu para o exílio, em Cuba, onde viveu por 16 anos.
Nasci em fevereiro de 1968, no bairro da Liberdade, em São Paulo. Minha mãe, Jovelina Tonello, trabalhava na prefeitura de Osasco e foi demitida durante a licença maternidade por causa da militância do meu pai.
Ele, Manoel Dias do Nascimento, era líder sindical. Em 1968, teve a prisão decretada e entrou na clandestinidade.
Meu pai já
era do Partido Comunista Brasileiro, e virou um dos fundadores da VPR
(Vanguarda Popular Revolucionária), liderada pelo Carlos Lamarca.
Quando meu
pai decide ir para a luta armada, minha avó resolve ir também. Ela fica
com o Lamarca no vale do Ribeira, no sul do Estado, com três filhos
adotivos para simular uma família normal na casa, que chamavam de
"aparelho". Ela também ajudava o movimento costurando roupas para os
militantes.
Meu pai fica
organizando a guerrilha na capital. No dia 19 de maio de 1970, ele foi
preso, quando estava no "ponto" para passar informações aos
companheiros. Eu fui preso com minha mãe mais tarde, no mesmo dia, em
nossa casa na Vila Formosa.
A gente vai
para a Operação Bandeirantes, depois para o Dops (Departamento de Ordem
Política e Social) e para a ala feminina do presídio Tiradentes. Eu só
tinha dois anos de idade, mas já tinha carteirinha de subversivo.
Eu vi meus
pais serem torturados e sei que também apanhei. Fui usado para ameaçarem
meu pai. Isso está registrado em depoimentos.
Não tenho lembranças, só traumas. Meus pais não conversam sobre isso. Só soube dos detalhes quando voltei ao Brasil, em 1986.
Minha mãe foi várias vezes na Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo buscar documentos.
Nesse vai e
volta, apareceu minha ficha num álbum do Dops de "terroristas e
subversivos". Tem uma foto minha, aos dois anos, e está escrito que sou
"subversivo".
Minha avó
também tinha sido presa. Meus irmãos de criação, que estavam com ela,
foram para o juizado de menores. Não sei por que eu não fiquei com eles.
É isso que eu quero saber, o que se passou nesses 28 dias de escuridão
na minha vida.
RESGATE
Saí da prisão
com a minha vó. Ela estava na lista dos 40 presos políticos libertados
em troca do embaixador alemão Ehrenfried von Holleben, que tinha sido
sequestrado.
Nós saímos no
mesmo resgate em que foram libertados o Fernando Gabeira, o Carlos Minc
e outros companheiros, em 16 de junho de 1970.
Tiramos uma
fotografia antes de embarcar para o exílio na Argélia. Eu e meus irmãos
somos essas crianças que estão na foto. Não tenho nenhuma lembrança
desse dia.
Ficamos um
mês na Argélia e no dia 27 de julho de 1970 chegamos em Cuba. O objetivo
era chegar no dia anterior, em comemoração ao aniversário da revolução
cubana, mas por causa do mal tempo, partimos no dia seguinte.
Meus pais
ainda ficaram presos aqui. Eles só foram resgatados no sequestro do
embaixador suíço Giovanni Bücher, e foram para o exílio no Chile, junto
com o frei Betto e o frei Tito.
Minha
primeira lembrança é aos quatro anos de idade, quando eu morava em Cuba.
Eu tinha muito medo de policiais, e minha tia Damaris, que morou com a
gente no exílio, deu um brinquedo para um policial me entregar. Ele me
deu um carrinho de corrida, brincou comigo, me botou em cima de uma
motocicleta, e eu adorei. Quando ele foi embora, eu vi que era um
policial. Essa é a minha primeira memória.
Só voltei
para o Brasil definitivamente em janeiro de 1986. "Yo soy cubano, yo no
soy brasileño" [eu sou cubano, eu não sou brasileiro]. A mim foi negada
toda minha cultura, meus direitos civis.
Hoje os meus
quatro filhos estudam essa história e veem a minha foto nos livros. Só
que não fui só eu. Foram centenas de crianças que passaram coisas
parecidas, dentro e fora dos cárceres.
Eu quero que
levantem todas essas questões. Nós temos muitas crianças -que nem são
mais crianças, alguns já estão na idade de se aposentar- que viveram
essa escuridão.
quinta-feira, 15 de novembro de 2012
quarta-feira, 14 de novembro de 2012
O amante da minha mulher
De Paulo Nogueira
O tragicômico escândalo sexual que derrubou o chefão da CIA, o bajulado general David Petraues
O tragicômico escândalo sexual que derrubou o chefão da CIA, o bajulado general David Petraues
O furo mais sensacional do New York Times nos últimos dias apareceu
não nas páginas de política ou de economia. Surgiu numa coluna que é um
consultório sentimental. Um leitor mandou uma carta anônima cujo título
era: “O Amante de Minha Mulher”.
Nele, o homem enganado pedia conselho. Descobrira que sua mulher
estava tendo um caso com um homem que estava fazendo um trabalho vital
para o futuro do país – “e não existe exagero aí”. Nas vezes em que se
viram, disse o anônimo, o homem com quem sua mulher saía sempre o tratou
muito bem, um sinal de que não sabia que ele sabia.
Que fazer? Repudiar a mulher? Esperar, como um estoicismo patriótico, o final da missão do grande homem?
Para encurtar: o autor da carta estava se referindo ao general David
Petraues, diretor da CIA e a figura mais admirada, em muitos anos, das
Forças Armadas americanas. Petraues, nos anos 1990, quando parecia que a
hegemonia dos Estados Unidos era para sempre, chegou a ser cotado para
concorrer a presidente.
Aos 60 anos, casado, dois filhos adultos, a carreira de Petraues
chegou ao fim espetacularmente. Ele renunciou tão logo sua infidelidade
se tornou pública, pouco depois da carta publicada no New York Times.
Petraues tinha um caso com a escritora que escreveu um livro sobre
ele, a jornalista e escritora Paula Broadwell, 40 anos, dois filhos
pequenos com o homem que recorreu ao consultório sentimental do jornal.
Manter um caso secreto já é duro. O problema é que Petraues tinha
dois, e foi aí que ele se enrolou. Ele se envolveu romanticamente também
com uma militar lotada no Departamento de Estado, Jill Kelley, de 37
anos, igualmente casada.
Jill avisou ao FBI que estava recebendo emails ameaçadores de Paula. O
FBI invadiu a caixa postal de Paula, e encontrou Petraues. A maior
preocupação era com a possibilidade de Paula ter tido acesso a
informações confidenciais.
Petraues foi absurdamente incensado pela mídia americana em duas
guerras nas quais os Estados Unidos acabaram fracassando
espetacularmente, a do Vietnã e a do Iraque. No Iraque, os jornalistas
americanos, pela primeira vez, trabalharam acoplados – embedded – às tropas. Foi um caso antológico de promiscuidade.
A queda de Petraues vem se prestando a piadas de toda natureza. “Se o
diretor da CIA não consegue manter um caso secreto, quem conseguirá?”,
zombou um comediante.
Foi também amplamente citado o título do livro escrito por Paula
Broadwell: “All in”. Era uma alusão ao tudo ou nada do pôquer. Mas
passou a ser entendido literalmente, dada a situação. Tudo dentro. De
Paula, e de Jill.
Todo império em seu declínio alterna momentos de drama com momentos
cômicos, agonia e risos, crispação e gargalhadas. A maior contribuição
que Petraues deu a seu país, e ao mundo, talvez tenha sido a comédia
amorosa com a qual ele forneceu risos em escala mundial.
domingo, 11 de novembro de 2012
Será que os policiais assassinados nas últimas semanas e também os trabalhadores reagiram, governador Alckmin?
Protesto
em muro de Osasco – SP contra a morte de um morador baleado por soldados
das Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar (ROTA). Fonte: Perfil no Facebook do Jornal a Nova Democracia
No meu
bairro as pessoas estão assustadas, às 22 horas desde domingo é silêncio
total. Se desobedecer o toque de recolher corre-se sérios riscos. As
pessoas vão falando com medo sobre um corpo na Eiras Garcia, outro na
Francisco Mourato, de um corpo aqui outro acolá.
A rotina
tem mudado bastante, não fui à universidade porque saio geralmente às 23
horas, minha casa já foi assaltada três vezes nos últimos quatro meses,
cheguei atrasada na escola porque a Rota está na São Remo e está uma
muvuca danada. Para voltar pra casa demorei mais de uma hora num trajeto
que no meio da tarde eu faço em 20 minutos no máximo.
Enquanto
escrevo este texto helicópteros rondam ruidosamente a região. Falo com
amigos da Cidade Tiradentes e a revolta é a mesma, o nível de violência
policial chegou à barbárie. O grupo de Defesa de Direitos Humanos e das
Mães de maio estão apavorados e revoltadíssimos, novamente a Baixada
Santista é cenário de muitas mortes de jovens negros nas periferias,
como em maio de 2006.
Qual é a alternativa?
Um
governador que aposta tudo na Rota? Como é que tucanos tem a ousadia de
falar de Maluf? Está na hora de Caco Barcellos escrever um Rota 66 parte 2.
Muita gente vai ficar surpresa de como o período democrático anda
matando de fazer inveja aos ditadores, aliás, segundo Cabo Anselmo no Roda Viva todo o aparelho repressor do Dops está no governo do estado, na ativa.
Desde 2003
quando Luiz Eduardo Soares foi um dos primeiros secretários do governo
Lula a ser destruído pela mídia venal que temos no Brasil o que tem sido
feito para que de fato tenhamos uma verdadeira segurança pública e não
um bando de manés despreparados que saem atirando a esmo matando
inocentes quando vêem uma furadeira ou quando um pneu do carro estoura?
A Direita
só conhece a linguagem da Rota, como aqui em SP, ou o de parcela de
policiais civis e militares se confundirem com milícias e com o crime
organizado ou do Bope subindo morros como no Rio ou simplesmente fazer o
que sempre fez desde os grupos de extermínio da ditadura militar: ir
uniformizados ou não pra as favelas e matar um monte de jovens negros.
Enquanto
não desmilitarizarmos esta polícia, prepará-la de fato para que entenda
que as pessoas são sujeitos de direitos e dois deles são o direito à
proteção e à vida, direitos humanos básicos, enquanto os governos
eleitos democraticamente não afastarem aqueles que estiveram na linha de
frente da tortura durante a ditadura militar a meu ver a barbárie
uniformizada de um lado e desdentada com cordão de ouro do outro vão
continuar a se digladiar. E nessa guerra não há vencedores.
sábado, 10 de novembro de 2012
EUA: colégio eleitoral e escravidão
de Renato Pompeu
Foi
corrente na mídia a versão de que o Colégio Eleitoral, ou seja, a
eleição indireta do presidente americano, feita por delegados estaduais,
é uma decorrência do que seria um autêntico "federalismo" americano.
Cada Estado dos Estados Unidos seria um Estado plenamente soberano que
se uniria a outros Estados plenamente soberanos para eleger um
presidente comum. Não seria, assim, uma federação de meia tigela,
digamos assim, como a brasileira.
Isso pode ser muito bonito, mas na
verdade o Colégio Eleitoral foi em grande parte a solução encontrada
para a convivência entre Estados não-escravistas e Estados escravistas.
Se a eleição presidencial nos Estados Unidos recém-independentes fosse
direta, os Estados não-escravistas, de população inteiramente livre,
teriam muito mais eleitores do que os Estados escravistas, em que grande
parte da população não era livre e não poderia votar. Assim, se
resolveu criar um Colégio Eleitoral em que cada Estado seria
representado por um número de delegados proporcional à sua população.
Para assegurar o equilíbrio, foi adotado o notável estratagema de, para
efeito de contagem da população, se incluírem os escravos, que assim
foram incluídos como simples números, já que não podiam ser incluídos
como eleitores.
sexta-feira, 9 de novembro de 2012
Violência explode nos protestos “mais do mesmo” na Argentina
Violência explode nos protestos “mais do mesmo” na Argentina
Aí no Brasil – escrevo em viagem de trabalho ao exterior –, os
protestos contra o governo de Cristina Kirchner que eclodiram na
Argentina na quinta-feira (8.9) foram apresentados sem que fossem
informados detalhes que desautorizam o tom de “revolta popular”
apocalíptica adotado pela imprensa corporativa brasileira, pelo que este
Blog trata de oferecê-los.
Explico que a iniciativa de escrever este post se deveu a que estou
no Peru, no âmbito de uma incursão comercial que já chega ao 11º dia
após passar por Bolívia e Equador e que, neste sábado, retornará à
Bolívia e lá permanecerá até meados da semana que entra, quando retorno
ao Brasil.
O fato é que, na noite de quinta-feira, assistindo tevê a cabo no
quarto de hotel, sintonizei a televisão argentina Telefé e deparei com
uma cena impressionante que, inclusive, é o que dá título a este post – e
sobre a qual discorrerei mais adiante.
Antes, porém, devo contextualizar o que aconteceu na Argentina, o que
farei graças a ligações que fiz para fontes que tenho naquele país.
Em primeiro lugar, é bom que saibam que o tão propalado “8 N” (8 de
novembro, dia do protesto) ocorreu pouco menos de dois meses após o “13
S” (13 de setembro), o protesto anterior que levou argentinos à rua com a
mesma finalidade de atacar o governo pelos mais distintos motivos, que
não se resumem só à tal “re-re”, a suposta intenção da presidente do
país vizinho de se candidatar à re-reeleição, o que a lei argentina
proíbe.
Muito menos, tais protestos ocorreram em favor do grupo de mídia
Clarín, em razão de fato que ocorrerá em breve e que se representa por
outra sigla oriunda do calendário, o “7 D” (7 de dezembro), data em que
vence a liminar que permitiu à “Globo” argentina descumprir a lei que
proíbe oligopólios na comunicação, apesar de que certa mídia brasileira
tenta fazer crer o contrário.
Outra conversa fiada é a de que não havia políticos nas
manifestações. Havia, sim, e muitos. Só que estavam disfarçados. Ou
seja: os partidos de oposição que ajudaram a insuflar as marchas em todo
país apenas deixaram as suas bandeiras em casa, de forma a ajudarem a
conferir “espontaneidade” a elas.
Nos arredores do Obelisco da Avenida 9 de julho, onde a manifestação
foi mais massiva, havia uma variedade de políticos insuflando a massa,
quase todos pertencentes ao “macrismo” e ao grupo Gapu, movimentos de
direita que se opõem a Cristina Kirchner e que se inspiram no prefeito
de Buenos Aires, Mauricio Macri.
Foram vistos nos protestos vários integrantes da coalizão PRO
(Proposta Repúblicana), integrada pelo CPC (Compromisso Pela Mudança),
partido de Macri.
Alguns políticos identificados foram Federico Pinedo, Paula Bertol,
Sergio Bergman, Patricia Bullrich, Eduardo Amadeo. Havia, também, vários
funcionários do PRO como Néstor Grindetti e Daniel Chain, ruralistas
como Mario Llambías e Luciano Miguens, o ativista de oposição Raúl
Castells e o ultradireitista Alejandro Biondini.
Outro fato que a mídia brasileira sonega é que a manifestação foi
maciçamente composta pelas classes alta e média alta. Prova disso é que
os manifestantes marcharam desde bairros como Santa Fé rumo à avenida
Corrientes, que desemboca na 9 de Julho, onde fica o Obelisco. No Sul da
cidade, região mais pobre, as manifestações foram escassas ou
inexistentes.
Mais uma informação sonegada: durante as marchas, registraram-se
simultâneos “apagões” em várias regiões, coisa que não costuma
acontecer. Há relatos continuados de sabotagem das redes elétricas. Ou
terá sido coincidência que esses apagões ocorreram justo no dia das
manifestações?
Ainda que pareça espantosa a massa humana que foi às ruas – e para
oferecer essa informação não precisei de fontes porque conheço muito bem
a Argentina e, sobretudo, Buenos Aires, por conta de meu trabalho –, na
Argentina e em vários outros países latino-americanos as manifestações
de rua são comuns e para todos os gostos.
Este ano mesmo, durante viagem que fiz a Buenos Aires, a mesma
avenida 9 de Julho fervilhava de apoiadores do governo – sindicatos,
movimentos sociais etc. A Argentina é muito parecida com a Venezuela,
nesse aspecto. Portanto, não se surpreendam se, em poucos dias, eclodir
uma marcha de apoiadores do governo para se contrapor à de opositores.
Só haverá uma diferença: a mídia brasileira não irá cobrir como fez com a marcha antigovernista.
Por conta disso, as manifestações que se pretenderam apocalípticas
para o governo de Cristina Kirchner – e que assim foram apresentadas
pela mídia brasileira – não passam de mais do mesmo, de protestos que
ocorrem naquele país contra o governo há bastante tempo, inclusive antes
da última eleição presidencial, que a presidente venceu com folga. Eis
porque ela não está nem dando bola.
O que surpreendeu, em alguma medida, foram atos de violência um tanto
incomuns nessas manifestações. Atos que ocorreram sobretudo contra a
imprensa.
Então você deve estar se perguntando como é possível que uma marcha
contra o governo ataque a imprensa, pois deve estar supondo que, como no
Brasil, ela também é contra o governo. Não é bem assim. Com a
democratização das comunicações em curso na Argentina já há um bom
tempo, o país tem hoje imprensa para todos os gostos.
As imagens que você verá abaixo, em matéria da rede argentina C5N,
portanto, mostram o viés truculento desses setores elitistas que saíram
às ruas para protestar contra o governo. E note que, em nenhum momento, a
matéria acusa kirchneristas pelos ataques. Os que agrediram o repórter
dessa rede e de outras julgaram-nos como sendo da “imprensa governista”.
Retirado do Blog da Cidadania
segunda-feira, 29 de outubro de 2012
A valorização da virgindade
Segundo o psicologista Paul Bloom, nascido em 1963, e autor do livro How Pleasure Works,
o termo virgindade aparece, nada menos, do que setecentas vezes, no
Antigo Testamento, e ocupa lugar ainda mais central no Cristianismo, com
o suposto nascimento virginal de Jesus.
Não cabendo ao cronista discutir assuntos ligados ao transcendente,
ressalto um fato que a mídia destaca hoje: o leilão terminou e o lance
vencedor atingiu 780 mil dólares, pelo direito à primeira noite com a
catarinense Catarina Migliorin (foto)i. Como se trata de
psicoginecologia, eu tenho todo o direito de dar a minha opinião. A
fêmea humana deixou de anunciar o seu período fértil, como o faz a maior
parte das primatas, ficando muito mais difícil, para o macho, ter a
certeza de que o filho que ele criará é, mesmo, seu.
Uma maneira utilizada para aumentar as chances de as crianças serem
legítimas era copular, preferencialmente, com mulheres virgens. Antes,
porém, de maldizer o processo que levou a fêmea humana a esconder a
ovulação, gerando milênios de opressão, é bom lembrar que a ocultação do
estro resultou no sexo recreacional, e na formação de relações
duradouras, entre homens e mulheres.
Se esconder o cio era válido no Pleistoceno (época geológica que
começou há cerca de um milhão e setecentos e cinquenta mil anos, e
terminou, aproximadamente, há dez mil anos), não faz mais nenhum
sentido, no mundo moderno, em que a mulher pode controlar sua
fertilidade, e existem exames de DNA à disposição dos homens mais
desconfiados, dar tanto valor àquela pequena membrana.
Antes de prosseguir seria bom relembrar o que dizem sobre o cio (o
período de fertilidade). Ele é um estado de receptividade sexual
extrema, pelo qual passam as fêmeas de muitos mamíferos, tais como
alguns primatas e morcegos, com exceção das mulheres. O período varia de
sete a quinze dias, porém, em alguns casos, pode se estender um pouco
mais, ou um pouco menos. No caso das primatas, por exemplo, o cio ocorre
duas vezes por ano, ou seja, de seis em seis meses, estando elas ativas
para o ato sexual, apenas, naquele período. Em relação às mulheres, por
sua vez, a atividade sexual pode ocorrer em qualquer ocasião do ciclo.
Confesso que me afligem várias perquirições, tais como esta, ensinada
por minha avó. Por que nós comemos mais ovos de galinhas do que de
patas? Justamente, pelo fato de que as primeiras sabem fazer propaganda
(um grande estardalhaço), do seu produto, enquanto que as segundas põem
seus ovos sem barulho.
Em pleno século XXI, algumas culturas continuam valorizando a
virgindade como um objeto precioso, sagrado, sendo preciso ser guardado a
“sete chaves”. E os machões, face à camuflagem do cio escondido,
oculto, sem cheiro, da qual as mulheres são dotadas, pagam um alto preço
para passarem, com elas, a primeira noite. Neste sentido, acredito que a
jovem catarinense está certíssima! Ela vai ganhar um bom dinheiro, para
entregar uma simples abstração, que a maioria das adolescentes oferece,
gratuitamente, aos seus namorados, e, as demais mulheres, aos seus
amados.
Se há algo chocante nessa estória é o valor que nós, homens, ainda
atribuímos à virgindade, como se estivéssemos no período Pleistoceno.
Não há dúvida alguma: hoje, o conceito de virgindade oscila entre uma
relíquia mental da pré-história e, em sociedades conservadoras, uma
forma desumana de manipular e tiranizar a mulher.
quarta-feira, 24 de outubro de 2012
Sobre as quengas
(...)João Pessoa está em 2º lugar no ranking nacional de Assassinatos de mulheres. A violência contra a mulher em João Pessoa é uma dura realidade a ser encarada, para assim talvez ser minimamente resolvida. Lembrem-se, que seremos guardas municipais desta cidade onde, repito, 2ª onde mais se matam mulheres em nosso país.
Agora sobre o termo quenga, que hoje é usado como sinônimo de mulher vil, prostituta, vadia, e que não merecem respeito. “as casas primitivas do interior de Alagoas em particular e de vasto território do Brasil eram feitas de taipa, onde se usa madeira nas paredes e barro. Pois bem. O barro era amassado com os pés e muito comumente em mutirão. Para dar ritmo ao trabalho e torná-lo mais agradável, o pessoal passou a usar a cuia do coco cortada ao meio para bater uma parte contra a outra, fazendo aquele barulhinho no ritmo. Essa cuia se chama quenga no Nordeste.
...escolas colocaram no currículo o estudo do folclore regional e em certo tempo os alunos levavam duas quengas para dançar o coco nas aulas de folclore. Como já diz a letra do Rei do Baião: "Toda menina quando enjoa da boneca é sinal que o amor..." Pois de vez em quando, alguma menina zarpava da aula e saia pelas ruas atrás dos seus namoricos mais ou menos apimentados. Vai daí que a vizinhança botava reparo e dizia: Lá vai a outra com suas quengas ladeira abaixo. Assim as quengas (cuias) do coco emprestaram o nome às que gostavam de gazetar aulas e dar seus pulinhos por ai.”¹
Substituo agora, quenga por vadia, visto que na atualidade e o tom pejorativo cabem a mesma “sujeita”. Após diversos casos de estupro, quando um policial convidado para orientar a comunidade sobre segurança disse que as mulheres poderiam evitar o estupro se “não se vestissem como vadias”, Infeliz comentário. Pois se ser vadia é escolher uma roupa, ou exercer a sexualidade livremente, frequentar esse ou aquele local, é motivar a violência contra a mulher, então todas são vadias e deixam de ser vítimas. Lembro, do caso de Queimadas-PB, onde cinco mulheres foram estupradas em uma festa, todas vadias, duas foram mortas. Fico pensando de forma geral, aqui no nordeste, um calor arretado, nós mulheres andando somente a luz do Sol e com burcas, para não ofender a moral e não incitar a violência.
O sistema, esse estado de coisas, já é tão cruel, nos educa com diversos preconceitos e intolerâncias. Talvez caiba a nós, estarmos atentos para não reproduzir essa mesma intolerância. Podemos também impedir, questionar e até nos negar a aceitar conceitos. Ter sensibilidade e respeito pelo ser humano, lutar por uma sociedade melhor e de pessoas melhores.
"Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, governam minha vida: o desejo imenso de amar, a procura do conhecimento e a insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade." (Bertrand Russel)
Alexandra Camilo
João Pessoa – PB, 10 de outubro de 2012
*Texto publicado em um grupo do Facebook de concursados da Guarda Municipal de João Pessoa
segunda-feira, 22 de outubro de 2012
Fidel Castro está agonizando
Bastou uma mensagem aos formandos do primeiro curso do Instituto de
Ciências Médicas “Victoria de Girón”, para que o galinheiro da
propaganda imperialista se alvoroçasse e as agências informativas se
lançassem com infâmia voraz para as mentiras. Não só isso, mas em suas
notícias adicionaram ao paciente as mais absurdas estupidezes.
Por Fidel Castro, no CubaDebate
Foto: Alex Castro
O jornal ABC da Espanha publicou que um médico venezuelano
radicado em ninguém sabe onde, revelou que Castro sofreu um derrame na
artéria cerebral direita, “posso dizer que não voltaremos a vê-lo
publicamente”. O suposto médico, que se é abandonaria primeiro seus
próprios compatriotas, qualificou o estado de saúde de Castro como
“muito perto do estado neurovegetal”.
Apesar de muitas pessoas no mundo serem enganados pelos meios de
comunicação de massa — quase todos em mãos dos privilegiados e ricos,
que publicam estupidezes — os povos acreditam cada vez menos neles.
Ninguém gosta de ser enganado; até o mais incorrigível mentiroso espera
que lhe digam a verdade. Todo mundo acreditou em abril de 1961, nas
informações publicadas pelas agências de notícias, que os invasores
mercenários de Girón e ou Baía dos Porcos, como quiserem chamar, estavam
chegando a Habana, quando na realidade alguns deles tentavam chegar
infrutiferamente em botes até os navios de guerra ianques que os
escoltavam.
Os povos aprendem e a resistência cresce diante da crise capitalista
que se repete cada vez com maior frequência; nenhuma mentira, repressão
ou armas novas, poderão impedir a queda de um sistema de produção
crescentemente desigual e injusto.
Há alguns dias, perto do 50º aniversario da “Crise de outubro”, as
agências indicaram três culpáveis; Kennedy, um recém-chegado à liderança
do império, Khrushchev y Castro. Cuba não tinha nada a ver com armas
nucleares, nem com a matança desnecessária de Hiroshima e Nagasaki,
perpetrada pelo presidente dos Estados Unidos, Harry S. Truman, que
institui a tirania das armas nucleares. Cuba defendia seu direito à
independência e à justiça social.
Quando aceitamos a ajuda soviética de armas, petróleo, alimentos e
outros recursos, foi para nos defender dos planos ianques de invadir a
nossa Pátria, submetida a uma suja e sangrenta guerra que este país
capitalista nos impôs desde os primeiros meses, a custo de milhares de
vidas e mutilados cubanos.
Quando Khrushchev propôs instalar mísseis de médio alcance semelhante
aos que os Estados Unidos tinham na Turquia — ainda mais perto da URSS
que Cuba dos Estados Unidos — como uma necessidade solidária, Cuba não
vacilou em aceitar tal risco. Nossa conduta foi eticamente
irrepreensível. Nunca pediremos desculpa a ninguém pelo que fizemos. O
certo é que transcorreu meio século e ainda continuamos de cabeça
erguida.
Gosto de escrever e escrevo; gosto de estudar e estudo. Há muitas
tarefas na área dos conhecimentos. Nunca as ciências, por exemplo,
avançaram em tão surpreendente velocidade.
Deixei de publicar Reflexões porque certamente não é meu papel ocupar
as páginas da nossa imprensa, consagrada em outras tarefas em que o
país precisa.
Aves de mau agouro! Não lembro sequer o que é uma dor de cabeça. Como
evidência de quão mentirosos são, os presenteio com as fotos que
acompanham este artigo.
Fidel Castro Ruz
domingo, 21 de outubro de 2012
PRESTE ATENÇÃO
Preste atenção nos danos
que são irreversíveis
Voce tem que viver com eles
que são irreversíveis
Voce tem que viver com eles
e suas consequencias!
Preste atenção nos planos
que são concebíveis
Voce tem que lutar por eles
e suas abrangências!
Preste atenção nos anos
que correram, impassíveis
Voce tem que viver sem eles
Mas preserve suas essências!
Da poeta Arlete Guimarães
sábado, 20 de outubro de 2012
O povo brasileiro quer justiça (ou Carminha, Nina e a justiça na telinha)
Por josehlucas
Novela
é um gênero literário. Nem tão extenso como um romance e nem tão curto
quanto um conto. Porém pode ser mais densa e complexa que qualquer um
dos dois outros gêneros. Há novelas de conteúdo com qualidade artística
inestimável como Noites Brancas (Dostoiévski), O Alienista (Machado de
Assis), A Metamorfose (Kafka) e talvez a primeira novela escrita,
Decameron (Boccaccio). Quase sempre as novelas estão entre as obras mais
vendidas dentre as obras dos autores, talvez por uma empatia com o
público popular causada pela trama envolvente e em ritmo acelerado que
aguça o pensamento em perspectiva das pessoas.
Com o advento do rádio, esse gênero se reciclou e assumiu a forma da
radionovela (não que as novelas escritas tenham desaparecido, ainda
existem muitas). Com a narração e entonação de voz diferente das
personagens, além do fato da organização em capítulos diários (com a
estratégia de deixar sempre suspense de um dia para o outro) esse gênero
rapidamente atingiu as massas populares e consagrou autores como
Oduvaldo Vianna (pai do Vianinha) e Gilberto Martins; além de atores e
atrizes como Silvia Cardoso, Maria Ieda, Luiz Carlos e Magalhães e José
Lucas (um xará bem mais famoso em seu tempo). Isso foi nas décadas de
30, 40 e 50 do século passado.
Nas décadas de 70 e 80 do século passado se consolidou no Brasil,
servindo inclusive como artigo de exportação, uma nova flexão deste
mesmo gênero: a telenovela. Com a popularização dos aparelhos
televisivos, a natural migração, que já havia ocorrido quando da
popularização dos rádios, aconteceu de forma rápida e rapidamente
transformou-se em fenômeno nacional. Títulos como Pecado Capital e Selva
de Pedra (Janete Clair), Roque Santeiro, O Bem Amado e Irmãos Coragem
(Dias Gomes) e as mais recentes Vale Tudo, Anos Rebeldes e Insensato
Coração (Gilberto Braga), foram sucessos nacionais atingindo níveis
altíssimos de audiência e tendo seus capítulos finais discutidos na boca
do povo.
Portanto, podemos concluir que a novela sempre foi um gênero popular,
que contava fantasticamente ou realisticamente a vida da população e,
muitas vezes com um nível de complexidade psicológica e qualidade
artística acima da média. A qualidade artística e a complexidade
psicológica são questionáveis, mas a popularidade da novela Avenida
Brasil (João Emanuel Carneiro) é pública e notória. E por isso, hoje, no
último capítulo dessa novela, os índices de audiência também foram
enormes. E neste mesmo instante, nas redes sociais, uma parcela da
juventude universitária, sobretudo, comenta pejorativamente o fato de
milhões assistirem a novela e julgam todos como alienados, idiotas e
estúpidos. Parece mais fácil do que tentar entender profundamente.
O tema central da novela é o fato de que a personagem da excelente atriz
Adriana Esteves (Carminha) realizar e planejar diversas maldades e
trambiques e ter em sua antagonista a boa atriz Débora Falabella (Nina)
uma mocinha não menos maliciosa e cruel. Do meio para o fim da trama, a
vilã vai se enredando cada vez mais no emaranhado de fatos que não se
concatenam e é exatamente a expectativa de vê-la ser derrotada e pega
com a “boca na butija” que fez com que a novela fosse crescendo em
público até o final.
Portanto, num país onde poderosos e grandes
especuladores vivem impunemente do espólio de suas falcatruas, o
sentimento de justiça da população passa a ser espelhado num final onde
Carminha será condenada por assassinato e suas mentiras e traições
acabam sendo condenadas juntamente. Junte-se a isso futebol, enredos
amorosos e um povo trabalhador e feliz de um bairro do subúrbio e temos
um imenso sucesso televisivo.
Até aí tudo bem. O problema é que, sendo um veículo de transmissão dos
pensamentos da classe dominante de nosso país, a televisão através da
telenovela passa exatamente essas mesmas ideias. Num momento onde a
grande imprensa tenta criar um sentimento de euforia popular com o
julgamento do mensalão e a condenação de corruptos e corruptores que
culpados dos crimes que são acusados, não o são mais do que os mesmos
corruptos que privatizaram o país na década de 90 do século passado e
não são sequer investigados ou apontados como vilões pelos jornais
nacionais, veículos que são dessa mesma classe dominante. Neste mesmo
momento histórico, vem a fala da mãe do Tufão no capítulo final, ao
saber da prisão da Carminha: “ainda dizem que não existe justiça nesse
país!”. Será por acaso?
Outra ideia difícil de engolir, é o argumento implícito nos tapas que
Carminha leva ao ser descoberta como vilã. Apanha do marido e de outras
pessoas num clima de “justiça” satisfeita, ou seja, quando a mulher é
culpada não tem problema apanhar. Esse argumento levado ao absurdo, pode
ser aplicado a mulher que serve a comida fria, que não satisfaz o
parceiro na cama, que não ‘cuida bem’ dos filhos e por aí vai.
Além do mais, os pobres da novela tem um poder aquisitivo muito maior do
que a média da população pobre do Brasil, claramente com objetivo de
alterar no inconsciente coletivo, a realidade econômica do povo. Porém, é
óbvio que a cada vez que a crise econômica se aprofunda e o poder de
compra dos trabalhadores diminui, fica mais desmascarada essa tática, e
as pessoas já comentam na rua esse fato com desdém.
Não adianta nada se achar intelectualizado o suficiente para desprezar a
grande massa que vê seus anseios respondidos por uma estória na
telinha. Quem despreza o sentimento da maioria e se julga superior pelo
simples fato de não assistir uma novela, só pode estar extremamente
alienado da realidade pela qual passa a sociedade brasileira. Se o
conjunto da sociedade faz uma determinada coisa é porque o sentimento
geral, os anseios gerais estão de certa forma representados nessa
determinada coisa. É óbvio que quem detém os meios de comunicação coloca
suas ideias e preconceitos no meio desses anseios, no intuito de
massifica-los, quase sempre com sucesso.
É necessário entender esses anseios e trabalhar por todos os meios,
principalmente artisticamente, para desmistificar e desmascarar os
argumentos mentirosos dessas estórias e chegar conjuntamente com o povo
brasileiro a conclusão de que não existe justiça no Brasil exatamente
porque essa classe dominante toma conta dos meios de comunicação, dos
tribunais de justiça, dos meios de produção e de tudo o mais. Que só
haverá justiça quando nós, o povo brasileiro, deixemos de ser
(tele)espectadores e passemos a ser atores e atrizes da vida do país.
sexta-feira, 19 de outubro de 2012
Quando a opinião pública dos Estados Unidos vai dizer basta para a matança de inocentes?
de Medea Benjamin
Medea Benjamin, 60 anos, escritora americana, é cofundadora do Codepink,
um grupo de defesa dos direitos humanos. Ela tem se batido
particularmente, nos últimos tempos, contra os drones — os aviões de
guerra que não têm tripulação.
No dia 29 de maio, o New York Times publicou uma análise
profunda sobre o papel do presidente Obama em relação à autorização dos
ataques feitos pelos drones americanos no exterior, particularmente no
Paquistão, no Iêmen e na Somália. É de arrepiar ver a fria e macabra
facilidade com a qual o presidente e seu pessoal decidem quem irá viver e
quem irá morrer. O destino de pessoas que vivem a milhares de
quilômetros de distância é decidido por um grupo de americanos, eleitos
ou não eleitos, que não falam sua linguagem, não conhecem sua cultura,
não entendem seus motivos e valores. Embora afirmem representar a maior
democracia do mundo, os líderes americanos estão colocando, em uma lista
de pessoas para serem mortas jovens que não têm a oportunidade de se
render e certamente não têm também a oportunidade de serem julgadas em
um tribunal.
Quem está fornecendo ao presidente e seus assessores uma lista de
suspeitos de terrorismo entre os quais devem escolher os que serão
mortos, aleatoriamente? O tipo de informação usado para colocar as
pessoas nas listas é o mesmo tipo de informação usado para colocar
pessoas em Guantânamo. Lembre-se de como o público americano foi
assegurado de que os prisioneiros trancafiados em Guantânamo eram “os
piores de todos”, só para descobrir depois que centenas deles eram gente
inocente que tinha sido vendida para o exército americano por caçadores
de recompensa.
Sendo assim, por que razão o público deveria acreditar no que o
governo de Obama diz sobre as pessoas que estão sendo mortas por drones?
Especialmente tendo em vista que, como vimos no New York Times, o
governo apareceu com uma solução para fazer com que a taxa de morte de
civis fosse a menor possível: simplesmente considerar homens com
determinada idade – aquela em que podem estar com guerreando — como
inimigos. A alegação é que “pessoas em uma área onde há uma atividade
terrorista recorrente, ou encontradas com um um militante de alto
escalão da Al-Qaeda, certamente possuem más intenções”. Ao menos quando
Bush atirou militantes suspeitos em Guantânamo, suas vidas foram
poupadas.
Em acréscimo às listas de morte, Obama concedeu à CIA a autoridade de
matar com ainda maior facilidade, usando ataques baseados unicamente em
comportamento suspeito. Homens dirigindo caminhões com fertilizantes
podem ser fabricantes de bombas – mas também podem ser fazendeiros.
Harold Koh, assessor jurídico de Obama, insiste em que essa matança é
legal sob a lei internacional porque os Estados Unidos têm direito à
autodefesa. É verdade que todas as nações possuem o direito de se
defender, mas a defesa deve ser contra um ataque iminente e esmagador
que se aproxima e não há tempo para um momento de deliberação.
Quando a nação não está em um conflito armado, as regras são ainda
mais rigorosas. A matança só pode acontecer quando é necessária para
proteger a vida e quando não há outros meios, tais como a captura ou a
incapacitação não-letal, para prevenir a ameaça à vida. Fora de uma zona
ativa de guerra, então, é ilegal o uso de drones, que são armas de
guerra incapazes de capturar um suspeito vivo.
Pense no precedente que os Estados Unidos estão fixando com sua
doutrina de mate-não-capture. Se a justificativa americana fosse
aplicada por outros países, a China poderia declarar que um ativista da
etnia uigur que vive em Nova York é um “combatente inimigo” e lançar um
míssil em Manhattan; a Rússia poderia afirmar que é perfeitamente legal
iniciar um ataque de drone contra alguém que vive em Londres, se
suspeitarem que a pessoa em questão tem algum tipo de ligação com
militantes chechenos.
Ou considere o caso de Luis Posada Carriles, um cubano naturalizado
venezuelano que vive em Miami, um terrorista condenado por ter
planejado, em 1976, um bombardeio em um avião cubano. Carriles matou 73
pessoas. Levando-se em conta o fracasso do sistema jurídico dos Estados
Unidos, o governo cubano poderia alegar que tem direito de mandar um
drone para o centro de Miami para matar um terrorista confesso e inimigo
jurado.
Um antigo diretor da CIA afirmou que a estratégia de usar drones é
“perigosamente sedutora”, porque o custo é pequeno, não implica em
baixas no exército e tem um aspecto de resistência. “Ela é útil para o
mercado interno”, ele disse, “e é impopular em outros países. Qualquer
dano no interesse nacional só aparece a longo prazo”.
Mas um artigo publicado no Washington Post mostra que o dano
não é a longo prazo, e sim imediato. Após entrevistar mais de vinte
líderes tribais, parentes de vítimas, ativistas de direitos humanos e
oficiais de Iêmen do sul, o jornalista Sudarsan Raghavan concluiu que os
ataques estão radicalizando a população local e aumentando a simpatia
pela al-Qaeda e por seus militantes. “Os drones estão matando os líderes
da al-Qaeda”, disse Mohammed al-Ahmadi, coordenador de um grupo local
de direito humanos, “mas também estão os transformando em heróis”.
Até mesmo o artigo do New York Times reconhece que o
Paquistão e o Iémen estão menos estáveis e mais hostis aos Estados
Unidos desde que Obama se tornou o presidente e desde que os drones se
tornaram um petulante símbolo do poder americano atropelando a soberania
nacional e assassinando inocentes.
Shahzad Akbar, um advogado paquistanês que está processando a CIA a
favor das vítimas dos drones, diz que já é hora de o povo americano se
pronunciar. “Você pode confiar em um programa que existe há oito anos,
escolhe seus alvos em segredo, não enfrenta qualquer responsabilidade e
que matou, apenas no Paquistão, quase três mil pessoas cuja identidade é
desconhecidas pelos seus assassinos?”, ele pergunta. “Quando as
mulheres e crianças do Paquistão são mortas com mísseis, os
paquistaneses acreditam que é isso que o povo americano quer. Eu
gostaria de perguntar para os americanos, ‘é isso?’”
TEXTO TRADUZIDO POR CAMILA NOGUEIRA
quinta-feira, 18 de outubro de 2012
Documentos comprovam que Jango era monitorado pela Operação Condor
de Agência Brasil
Por Ana Graziela Aguiar*
Deposto pelo golpe militar em 1964, o ex-presidente João Goulart, o Jango, exilou-se com a família no Uruguai e, depois, na Argentina. No entanto, mesmo depois de retirado da Presidência da República, continuou sendo alvo do regime militar. Fotos e documentos exclusivos do Arquivo Nacional, obtidos pela TV Brasil, mostram que João Goulart era vigiado pelos militares, inclusive em momentos privados, como durante a festa de aniversário em que comemorou 55 anos.
Para o neto de Jango, Christopher Goulart, o avô sabia que era vigiado, porém isso não o incomodava. “Ele não se importava muito, não era uma coisa que o incomodava”.
Um documento do Serviço Nacional de Informação (SNI) mostra que as correspondências do ex-presidente eram constantemente lidas e analisadas pelos militares. No próprio documento, datado de 1966, um agente militar revelou que as cartas de Jango eram obtidas de forma clandestina. Em outro documento, o Centro de Informações do Exterior (Ciex) traz informações sobre uma viagem de Jango para a Argentina. A partir dos detalhes da viagem, os militares classificaram que Jango estava se preparando para retornar ao Brasil.
Para o historiador e coordenador do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Enrique Padrós, João Goulart foi vítima da Operação Condor, ação conjunta de seis países sul-americanos, inclusive o Brasil, para reprimir opositores às ditaduras militares da região. A operação foi criada oficialmente em 1975, mas começou antes, como mostra a reportagem da TV Brasil. “Ele foi sistematicamente vigiado, foi sistematicamente atingido, com essa coisa de infiltrarem pessoas ou, talvez, infiltrarem mecanismos para obter informações”, completa.
Em 6 de dezembro de 1976, Jango morreu na cidade argentina de Mercedes, onde também viveu durante o exílio. A certidão de óbito diz que o ex-presidente foi vítima de um ataque cardíaco. A família, no entanto, suspeita das circunstâncias da morte de Jango, pelo fato de que o ex-presidente estava se organizando para voltar ao Brasil com o intuito de atuar contra o regime militar. “É claro que é muito suspeita [a morte de Jango]. É óbvio que é muito suspeita e, enquanto for suspeita, tem que se investigar”, defende Christopher Goulart.
João Goulart durante parada nos Estados Unidos em 5 de abril de 1962. Foto: Dick DeMarsico / Livraria do Congresso Americano
Deposto pelo golpe militar em 1964, o ex-presidente João Goulart, o Jango, exilou-se com a família no Uruguai e, depois, na Argentina. No entanto, mesmo depois de retirado da Presidência da República, continuou sendo alvo do regime militar. Fotos e documentos exclusivos do Arquivo Nacional, obtidos pela TV Brasil, mostram que João Goulart era vigiado pelos militares, inclusive em momentos privados, como durante a festa de aniversário em que comemorou 55 anos.
Para o neto de Jango, Christopher Goulart, o avô sabia que era vigiado, porém isso não o incomodava. “Ele não se importava muito, não era uma coisa que o incomodava”.
Um documento do Serviço Nacional de Informação (SNI) mostra que as correspondências do ex-presidente eram constantemente lidas e analisadas pelos militares. No próprio documento, datado de 1966, um agente militar revelou que as cartas de Jango eram obtidas de forma clandestina. Em outro documento, o Centro de Informações do Exterior (Ciex) traz informações sobre uma viagem de Jango para a Argentina. A partir dos detalhes da viagem, os militares classificaram que Jango estava se preparando para retornar ao Brasil.
Para o historiador e coordenador do curso de História da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Enrique Padrós, João Goulart foi vítima da Operação Condor, ação conjunta de seis países sul-americanos, inclusive o Brasil, para reprimir opositores às ditaduras militares da região. A operação foi criada oficialmente em 1975, mas começou antes, como mostra a reportagem da TV Brasil. “Ele foi sistematicamente vigiado, foi sistematicamente atingido, com essa coisa de infiltrarem pessoas ou, talvez, infiltrarem mecanismos para obter informações”, completa.
Em 6 de dezembro de 1976, Jango morreu na cidade argentina de Mercedes, onde também viveu durante o exílio. A certidão de óbito diz que o ex-presidente foi vítima de um ataque cardíaco. A família, no entanto, suspeita das circunstâncias da morte de Jango, pelo fato de que o ex-presidente estava se organizando para voltar ao Brasil com o intuito de atuar contra o regime militar. “É claro que é muito suspeita [a morte de Jango]. É óbvio que é muito suspeita e, enquanto for suspeita, tem que se investigar”, defende Christopher Goulart.
Depoimentos do ex-espião do serviço de inteligência da polícia
uruguaia Mário Neira alimentam a teoria de assassinato. Preso em Porto
Alegre há mais de dez anos por crimes como contrabando de armas, Neira
disse que uma operação foi montada para envenenar Jango. A decisão,
segundo ele, foi tomada em uma reunião com representantes do governo
uruguaio, do Serviço de Inteligência Americano (CIA) e o delegado Sérgio
Fleury, então chefe do Departamento de Ordem Política e Social (Dops)
de São Paulo. “Foi uma operação muito prolongada e a gente não sabia que
teria como objetivo a morte do presidente João Goulart”, relatou.
Segundo Neira, os remédios de Goulart, que sofria de problemas do coração, foram trocados por
comprimidos com uma substância que acelerava os batimentos cardíacos e provocava uma parada cardíaca. “Os remédios vieram da França e foram recebidos na gerência do Hotel Liberty. Foi um araponga que foi colocado neste hotel, porque os remédios ficavam em uma caixa-forte, uma caixinha mesmo de segurança. Em cada frasco, foi colocado um comprimido, apenas um comprimido com o composto que tinha uma ação que provocaria uma parada cardíaca. Acho que ele tomou coincidentemente naquela noite [o veneno], porque todo o relato da dona Maria Tereza [mulher de Jango] fala dos sintomas que encaixam com o que acontece quando a pressão sobe, baixa constrição dos vasos.”
Com base no depoimento de Neira, a família de João Goulart pediu uma investigação ao Ministério Público Federal (MPF). Mas o processo foi arquivado pela Justiça sob o argumento de que o crime prescreveu.
Com a impossibilidade de investigação no Brasil, o procurador federal Ivan Marx recorreu à Justiça argentina. “Fui até Paso de Los Libres [próxima à cidade de Mercedes], na Justiça Federal argentina competente, e solicitei uma investigação sobre a morte do João Goulart. Existe a Lei de Anistia e todo esse problema que hoje estamos tentando processar no Brasil, mas, diante de todas as dificuldades, achei importante provocar a Justiça argentina, pois o fato ocorreu lá. Eles têm uma competência territorial para investigar os fatos”, explicou.
O historiador Enrique Padrós defende esclarecimentos sobre a morte de Jango. “É muito grave um país como o Brasil, até hoje, não ter certeza de como faleceu o único presidente que morreu fora, exilado.”
A TV Brasil iniciou segunda-feira 15 a exibição da série jornalística, com quatro reportagens, sobre a Operação Condor. Até o dia 19, o Repórter Brasil Noite vai exibir uma reportagem, sempre às 21h, com reprise no Repórter Brasil Manhã, às 8h. Depoimentos completos, fotos e documentos estão disponíveis no portal da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), no endereço www.ebc.com.br/operacaocondor.
*Publicado originalmente na Agência Brasil
Segundo Neira, os remédios de Goulart, que sofria de problemas do coração, foram trocados por
comprimidos com uma substância que acelerava os batimentos cardíacos e provocava uma parada cardíaca. “Os remédios vieram da França e foram recebidos na gerência do Hotel Liberty. Foi um araponga que foi colocado neste hotel, porque os remédios ficavam em uma caixa-forte, uma caixinha mesmo de segurança. Em cada frasco, foi colocado um comprimido, apenas um comprimido com o composto que tinha uma ação que provocaria uma parada cardíaca. Acho que ele tomou coincidentemente naquela noite [o veneno], porque todo o relato da dona Maria Tereza [mulher de Jango] fala dos sintomas que encaixam com o que acontece quando a pressão sobe, baixa constrição dos vasos.”
Com base no depoimento de Neira, a família de João Goulart pediu uma investigação ao Ministério Público Federal (MPF). Mas o processo foi arquivado pela Justiça sob o argumento de que o crime prescreveu.
Com a impossibilidade de investigação no Brasil, o procurador federal Ivan Marx recorreu à Justiça argentina. “Fui até Paso de Los Libres [próxima à cidade de Mercedes], na Justiça Federal argentina competente, e solicitei uma investigação sobre a morte do João Goulart. Existe a Lei de Anistia e todo esse problema que hoje estamos tentando processar no Brasil, mas, diante de todas as dificuldades, achei importante provocar a Justiça argentina, pois o fato ocorreu lá. Eles têm uma competência territorial para investigar os fatos”, explicou.
O historiador Enrique Padrós defende esclarecimentos sobre a morte de Jango. “É muito grave um país como o Brasil, até hoje, não ter certeza de como faleceu o único presidente que morreu fora, exilado.”
A TV Brasil iniciou segunda-feira 15 a exibição da série jornalística, com quatro reportagens, sobre a Operação Condor. Até o dia 19, o Repórter Brasil Noite vai exibir uma reportagem, sempre às 21h, com reprise no Repórter Brasil Manhã, às 8h. Depoimentos completos, fotos e documentos estão disponíveis no portal da Empresa Brasil de Comunicação (EBC), no endereço www.ebc.com.br/operacaocondor.
*Publicado originalmente na Agência Brasil
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